Caderno de Sábado

O adeus ao professor Luzzatto

Um pouco sobre a história do ‘homem do Talian’

O Talian, língua que se originou da mescla dos diversos dialetos trazidos pelos imigrantes italianos com o português, é reconhecido desde 2014 pelo IPHAN e Ministério da Cultura como “Língua de Referência Cultural Brasileira”. Flores da Cunha foi o segundo município brasileiro a tornar o Talian língua co-oficial, através da Lei Municipal 3.180 de 27 de abril de 2015.

O caminho para o reconhecimento perante o Governo Brasileiro foi tortuoso. Diversos defensores do Talian e da história da Imigração Italiana no Brasil e no Rio Grande do Sul contribuíram para tal feito, dos quais podemos destacar os já falecidos Frei Rovílio Costa e Honorio Tonial. Mas outro nome que está intrinsecamente atrelado ao Talian é o do professor Darcy Luzzatto. Ele nos deixou no último dia 18 de maio, aos 85 anos de idade.

Darcy Loss Luzzatto nasceu em Pinto Bandeira (RS) no dia 27 de outubro de 1934. Aos 12 anos foi estudar em Bento Gonçalves e posteriomente em Farroupilha. Aos 18 anos mudou-se para Porto Alegre onde se formou em Matemática e Física. Trabalhou por muitos anos como professor dessas matérias, tendo, inclusive, escrito tratados de Física. O mundo da literatura o levou a tornar-se editor de livros escolares para o liceu e a universidade. Foi editor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, dirigiu a Câmara Rio-Grandense do Livro e fez parte da diretoria da Câmara Brasileira do Livro.

A vocação pelos livros derivou do avô, Cristoforo Luzzatto, que era uma pessoa culta. Cristoforo sabia falar o bellorat (o dialeto vêneto de Belluno), o italiano, o francês e até mesmo o latim. Darcy era o filho mais novo de Antonio Luzzatto e Esther Loss, tendo como irmãos Arnaldo (in memoriam) e Wilma. Trabalhou por anos ao lado da mãe e dos irmãos, no Hotel Luzzatto, um dos primeiros de Pinto Bandeira.

Darcy casou pela primeira vez muito jovem e teve quatro filhos nos poucos anos de casado: Carla, Darcy Filho (in memoriam), Vivian e Andréa. Como costumava dizer, mais tarde felizmente chegou Elisa Schein Wenzel, que deu novo sabor à sua vida. Foram parceiros inseparáveis por mais de 46 anos. Com Elisa tem dois filhos: Antônio e Caroline.

Darcy ficou conhecido mundo afora como o “Professor Luzzatto”: o homem do Talian. Era invejável sua familiaridade tão completa com as palavras e as expressões de todos os descendentes da imigração italiana e sua cultura. Utilizou estes conhecimentos para redigir dicionários, gramáticas e o Almanaque Talian. Sendo um excelente cozinheiro, também produziu livros de receita, dentre os quais está “Culinária da Imigração Italiana”.

Seu trabalho se consolida como um sataron que sustenta o trabalho de salvaguarda da, dita por ele, nostra vera léngua madre. Através do estudo de sua obra e nas poucas ocasiões que conversei pessoalmente com o Professor Luzzatto, pude aprender e tomar como exemplo este grande homem e intelectual, cuja obra e exemplo permanecerão vivos. Muitas mentes devotadas ao Talian estão nos deixando. É necessário que as “novas gerações” abracem essa causa para que se difunda e perpetue. O Talian precisa de nós!

Como repetidas vezes o próprio Luzzatto relatava: seu legado foi reconhecido na Itália, no Brasil e em diversas outras cidades, porém partiu sentindo falta de sua terra natal, Pinto Bandeira, ter dado mais valor à sua dedicação irrestrita ao Talian à própria memória do município.
Agradecimento à Solange Soccol, amiga de longa data de Darcy, e à Elisa Schein Wenzel, sua viúva, pelos textos e relatos.

*Alex Eberle é difusor da língua Talian. Em 2016, juntamente com o Departamento de Cultura e a Associação dos Amigos do Museu Municipal, realizou o projeto ‘Talian – Perspectivas e Ações’, em que ministrou oficinas quinzenais nas 17 escolas do município para os alunos dos 4º anos.

Alex Eberle juntamente com Luzzatto, durante Encontro Nacional dos Difusores do Talian.  - Arquivo pessoal
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