Caderno de Sábado

Histórias (quase) esquecidas: a sombra no túmulo

Na segunda parte da série de reportagens, conheça a misteriosa história sobre a morte de Matilde Scolaro

Uma santa? Um mistério? Um blefe? Ou apenas imaginação popular. Muitas histórias, contadas oralmente de geração para geração, carregam consigo a narrativa comunitária, ou seja, a memória de um povo. Por mais fabulosas que sejam, quando repetidas tornam-se extremamente significativas porque retratam as lembranças que as pessoas têm. Elas fazem parte da história de uma cidade. “É a dinâmica social que se manifesta por meio dessas narrações, que traduzem um período, uma maneira de ser e de viver. A memória é a única guardiã de algo que efetivamente ocorreu no tempo. Assegurando a continuidade temporal, a memória, fragmentada e pluralizada, se aproxima da história pela sua ambição de veracidade”, escreveu Helenice Rodrigues da Silva em As Utilizações Sociais da Memória.

Pois, a história de hoje retrata um dos fatos mais extraordinários já registrados e que leva em conta a memória daqueles que o contam. Tudo aconteceu na capela de Santa Justina, por volta da década de 1940, mais precisamente no cemitério daquela comunidade. É uma história que envolve mistério, sobrenatural e fé.

A moradora Matilde Scolaro era uma mulher muito religiosa, que morava com o esposo Luiz e uma sobrinha. Os vizinhos costumavam dizer que ela era uma alma santa, já que ajudava muita gente. Chegando próximo dos 70 anos, ela faleceu e foi enterrado no cemitério da comunidade. É aqui que começa o enigma.

Alguns dias após o seu falecimento, começou a aparecer em seu túmulo uma sombra misteriosa. O retrato, como se fosse um negativo, mostrava a posição de um corpo deitado do lado de dentro. Toda comunidade ficou surpresa e ninguém sabia do que se tratava aquilo.

Um zum zum de agitação percorreu a região e logo muitos curiosos passaram a visitar o cemitério para conhecer o túmulo. Dizem que até excursões, com ônibus de peregrinos de todo o Estado visitavam o local. A figura era tão nítida que logo chamou a atenção da mídia que repercutiu o caso. Era uma aparição divina em plena Santa Justina. Mesmo que o túmulo fosse pintado – e isso ocorreu diversas vezes para tentar compreender o fenômeno – a sombra reaparecia exatamente igual e no mesmo lado. Como isso poderia ser possível?

Em entrevista ao Jornal O Florense em 2014, as sobrinhas-netas de Luiz Scolaro (esposa de Matilde), Mercedes Scolaro Caldart e Rita Scolaro Marcante, que ouviram o pai relatar os fatos contam: “Antes de ir para o Exército, nosso pai, Caetano, e a segunda mulher dele moraram uns três anos com Matilde e Luiz. Ele conta que o tio Giggio estava enlouquecendo com essa situação e que se sentia mal, pois não sabia mais o que fazer para resolver aquilo. Chamou até o bispo da época, dom José Barea, para tentar explicar o fato, mas nada mudou”.

Elas contaram que Luiz e Matilde faziam diversas doações ao Seminário Diocesano Nossa Senhora Aparecida de Caxias do Sul. Certo dia apareceu na casa de Luiz um padre desconhecido e que teria resolvido o mistério. “O tio contava para o nosso pai que o padre perguntou para ele qual era o motivo de tanto abatimento e tristeza. Ao falar o que estava acontecendo, o padre teria revelado que Matilde ajudava muito os seminaristas sem o conhecimento dele e que precisava do seu perdão para descansar em paz. O padre disse: ‘ghevolariache a perdonasse’ (é preciso que a perdoe). ‘Si, si. Là ze perdonata’ (sim, sim, ela está perdoada), respondeu tio Giggio”, conta Mercedes. Depois dessa visita, a imagem sumiu do túmulo e nunca mais apareceu. O padre, que ninguém nunca soube quem era, também desapareceu”, relembram as sobrinhas-netas.

O marido de Matilde, Luiz Scolaro morreu em 1955, aos 85 anos. Na década de 1960 os familiares transferiram os restos mortais do casal do antigo túmulo – o qual aparecia a sombra misteriosa - para uma capela no cemitério, onde permanecem até hoje. E o antigo túmulo foi demolido.

Aos poucos as peregrinações diminuíram e a história foi sendo esquecida pelas gerações seguintes. Mas, até hoje, tudo segue sendo uma incógnita incompreensível.

 

 

 - Arquivo Danúbia Otobelli
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