Uma coleção de licores
No Arquivo OF, um pouco sobre o museu localizado no distrito de Otávio Rocha que mantém um acervo com mais de mil garrafas da bebida
Entrar no Museu Padre Alberto Lamonatto, no distrito de Otávio Rocha, em Flores da Cunha (RS), é sentir o peso da história e o aroma doce de frutas, ervas, temperos, flores e raízes. O local abriga uma grande coleção de licores e vinhos, o único do país no gênero. Além disso, seu acervo tem ainda objetos históricos da imigração italiana. Instalado dentro de um prédio datado de 1935, e que chegou a abrigar, em outros tempos, uma pequena cadeia, o museu foi inaugurado em 1998 e comemora neste ano dez anos de existência. Todo o acervo foi doado pelo padre Alberto Lamonatto – que dá nome ao local -, com destaque para a coleção de licores e vinhos. São mais de mil garrafas em diversos formatos e sabores. Há licores de manjericão, nossin, amêndoas, guabiju, agrião, pitanga, laranja, abacaxi, cereja, maçã, aniz, uva, entre outros. Todos eles dentro de garrafas que chamam a atenção pelo formato inusitado: pequenas, ovais, retangulares, quadradas...Além dos licores, há uma coleção de vinhos antigos que englobam as décadas de 1940 a 1960. Raridades como vinhos de missa, conhaques e espumantes 'gigantes' comemorativos da Cia. Mosele Piave. No local há, também, pequenas pipas e garrafões, bem como uma estátua de Nossa Senhora da Uva e um quadro com a Deusa dos Licores. "Os licores eram produzidos pelo próprio padre com ajuda de sua secretária Alvina Zarro. Era um hobby dele, que constumava presentear os que o visitavam com uma garrafa. Já os objetos que resguardava, alguns ganhou de amigos e simpatizantes, outros arrecadou, pois muitos sabiam que ele era um exímio colecionador de objetos que remoravam a imigração italiana", conta a historiadora Gissely Lovatto Vailatti. O padre também criava frases e provérbios em dialeto vêneto sobre a bebida que fabricava. Eram dizeres como: Il vino rallegra il cuore humano (O vinho alegra o coração humano) ou Il vin le il latte dei vecci (O vinho é o leite dos velhos).
Doação à comunidade
A idéia de tranformar o hobby de Lamonatto em Museu partiu do escritor e incetivador do turismo de Otávio Rocha, Floriano Molon, que era amigo do padre. "Um dia, de forma expontânea, perguntei a ele o que ia fazer com todo aquele material quando falecesse. Comentei que a comunidade poderia fazer um museu. Ele não disse nada, só sorriu. Qual não foi a surpresa quando abiu-se o testamento e vi que ele deixara tudo para a comunidade de Otávio Rocha", relembra Molon.
A partir disso, surgiu a concepção de expor permanentemente a coleção particular do padre, que com o tempo foi acrescida por doações dos moradores de Otávio Rocha. Assim, em 1998, quando Molon era secretário municipal de Cultura, Turismo e Desporto de Flores da Cunha, foi inaugurado o museu Padre Alberto Lamonatto, junto a sub-prefeitura de Otávio Rocha.
Em 2007, numa oficina promovida para preservar o Patrimônio Cultural do distrito, alunos da Escola Francisco Zilli limparam e reorganizaram todas as garrafas, catalogando e conservando o acervo. "O projeto visava despertar nas crianças e adolescentes o desejo de preservação e manutenção do Museu, já que o local resguarda a história da comunidade, e é o único acervo museológico de licores do Brasil", conta Gissely, que ministrou a oficina durante os meses de maio a setembro.
Um dos propósitos da oficina também era que, através da participação do Clube de Mães da localidade, ou de outra entidade, os licores fossem produzidos e revendidos, a fim de tornar o museu interativo. Como não foram encontradas as receitas, o projeto não foi concluído. "É uma pena não termos conhecimento sobre o destino que foi dado às receitas que o próprio padre criava e recriava", lamenta Gissely.
Como eram produzidos
Em depoimento ao Museu e Arquivo Histórico Pedro Rossi, de Flores da Cunha, a empregada que atendeu por 40 anos o padre, Alvina Zarro, contou que Lamonatto iniciou de forma caseira a produção de licores. "Inicialmente eu e o padre fazíamos licores simples, pois foi difícil descobrir o ponto certo do açúcar queimado. No começo era uma lambança, mas depois fomos pegando o jeito e aí fomos inventando novas fórmulas. Perto de morrer o padre já tinha mais de mil receitas. Ele adorava mostrar seus licores e presentear as pessoas com eles. A maioria das garrafas ele ganhava, mas os nomes dos licores que eram colocadas nelas ele mesmo criava", contou a empregada.
Visitar o museu é programa obrigatório para quem vai a Otávio Rocha. À medida que circula pelo espaço, o visitante se vê rodeado por pequenas preciosidades que emanam a vontade de apreciar e olhar cada rótulo, cada garrafa. "O museu é extremamente significativo por resguardar a história da comunidade e todo o material recolhido e produzido pelo padre Lamonatto, sem contar a infinidade de licores de diferentes sabores", finaliza Molon.
Padre Lamonatto
Natural de Guaporé, Padre Alberto Luiz Lamonatto nasceu em 13 de dezembro de 1918. Foi ordenado padre em 1947. Trabalhou na Catedral Diocesana, vindo a ocupar em seguida o cargo de primeiro vigário da paróquia Pio X, em Caxias do Sul. Em abril de 1979, foi designado para atuar como vigário substituto na paróquia São Marcos, de Otávio Rocha. Trabalhou como vigário até outubro do mesmo ano. Mesmo tendo permanecido por pouco tempo na localidade, fez grandes amizades pela simpatia e pelo idealismo. Quando faleceu, em 1997, doou todos os licores que fabricava e os objetos ao distrito. Em 1998, foi homenageado com o Museu Padre Alberto Lamonatto. Seu nome também designa uma rua do bairro Nossa Senhora da Saúde, em Caxias do Sul.
Matéria originalmente publicada em 2008.
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