Na Itália é chamado de prosciutto. Na Espanha, de jamón. O presunto cru, que nada mais é um pernil de um porco desidratado com sal, é fabricado de forma experimental no interior de Flores da Cunha, mais precisamente no Travessão Alfredo Chaves. O empreendimento do enólogo Edegar Scortegagna, 31 anos, e do advogado André Scortegagna, 34 anos, que são primos, surgiu após uma ideia de 2004. O plano tomou forma, saiu do papel e, agora, as metas são audaciosas: produzir um presunto cru que seja referência nacional, em escala industrial, e colocar cerca de 4 mil pernis/peças/ano no mercado a partir de 2016. A obra que abrigará a estrutura deve começar a ser erguida em 2014 e ser finalizada no ano seguinte. “Usamos tecnologia pioneira para tornar Flores da Cunha uma referência nacional. Não vamos copiar o jamón espanhol: nosso produto tem a cara brasileira”, conta Edegar.
O enólogo florense, que esteve na Itália em 2004 para estudar, diz que apaixonou-se pela região de Trento, principalmente por seus famosos presuntos de Parma e de San Daniele. A ideia de saborear a iguaria crua produzida em Flores da Cunha, desde então, não saiu da cabeça. “Quando voltei para o Brasil já comecei a fazer experimentos. Assim foi até 2008, de forma empírica, testando mais ou menos sal”, conta Edegar. Em 2008, em parceria com o primo André, buscaram pessoas com conhecimento técnico para saberem se podiam produzir, e qual seria a viabilidade do negócio.
Na época eles viajaram a Concórdia, no Oeste de Santa Catarina, para firmar um contrato com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa Suínos e Aves). “Constatamos que se consome muito presunto cru no Brasil, principalmente produtos italianos e espanhóis. O presunto é igual ao vinho: matéria-prima de qualidade resulta em um produto de qualidade, dependendo do tempo de maturação. Precisávamos de matéria-prima, ou seja, o suíno”, relata André. No Estado vizinho foi feito o cruzamento genético de três raças, chegando a um resultado em 2010: um porco específico para a produção de presunto cru, com certa quantidade de gordura externa para conservar a peça, e bom ‘marmoreio’, a famosa gordura entreverada.
O experimento
Para as primeiras peças que descansam na sala frigorífica especial construída na propriedade do pai de Edegar, no Travessão Alfredo, foram criados 40 suínos em uma granja alugada em Flores da Cunha, com quatro dietas diferentes, cada uma para cada 10 porcos. A base era a mesma: soja e milho, mas outros suplementos naturais, que por enquanto não são informados, inclusive matéria-prima local, sustentável, foram incluídos. “Tudo para produzir uma gordura saudável, rica em ômegas 6 e 9, uma carne com antioxidantes”, complementa Edegar.
O contrato com a Embrapa também prevê a produção do presunto. O projeto tem a parceria do doutor Rogério Manuel Renes de Campos, veterinário da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e professor na Universidade Federal de Petrolina (PE), que é o contato técnico e dá consultoria ao produto. “Escolhemos a melhor dieta e vamos criar em Flores da Cunha uma raça específica, em parceria com um granjeiro”, conta André, lembrando que a raça do suíno específico ainda não foi definida (pelo fato de o experimento não ter oficialmente se encerrado). A infraestrutura no Travessão Alfredo Chaves será erguida por meio de um projeto (em fase de desenvolvimento) contratado junto à Plena Arquitetura e Urbanismo.
Para comparação, os primos citam que um porco normal de 20 a 25 quilos chega a 120 quilos em três meses quando é criado confinado. “Nosso porco de 20 a 25 quilos iniciais chega a 140 quilos em oito meses, não confinado”, cita André. Em 2011 foi iniciada a criação e em agosto de 2012 o primeiro abate, que resultou em 80 peças (cada animal fornece dois pernis). O experimento, que tem acompanhamento da Embrapa Suínos e Aves, terá duração total de dois anos, porém, no 15º mês de câmara fria (novembro de 2013) os técnicos deram sinal positivo para o consumo após análises com laudos microbiológicos. Como tudo deu certo, agora o plano é colocar no mercado daqui a dois anos quatro tipos de presunto cru, iguaria que tem sabor característico: com cura (maturação) de 12, 18, 24 e 36 meses (premium), para tentar agradar o paladar do brasileiro. E, quem sabe, de italianos e espanhóis também.
‘Jamonera’ é o nome do artefato usado para encaixar o pernil a ser ‘abatido’ pelos primos André (E) e Edegar (D).

