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Por que a safra 2012 promete ser histórica?

Profissionais do setor vitivinícola apostam que esta será a melhor vindima já vista na Serra, em termos de qualidade. Todavia, para que a previsão se confirme, o clima deve continuar favorecendo a maturação da uva até o final da colheita

O ano de 2011 foi marcado por um inverno rigoroso, seguido por uma primavera com temperaturas amenas e, na sequência, por um período de estiagem e temperaturas elevadas, especialmente entre os meses de novembro e dezembro. Tais características climáticas foram benéficas para as parreiras e para muitos viticultores já que os baixos índices de precipitação pluviométrica e de umidade durante as fases de floração e desenvolvimento da videira garantiram bons frutos nas variedades precoces. Para alegria dos produtores, que no final de 2011 projetavam uma queda de 20% na produção de uva em relação à safra anterior, esta safra já supera as expectativas e promete ser a melhor dos últimos anos no quesito qualidade, superando, inclusive a histórica safra de 2005, que foi considerada a melhor da última década.

Conforme a previsão de alguns especialistas do setor vitivinícola, esta safra deverá se caracterizar como uma safra histórica, pelo menos para a Serra Gaúcha. Para o presidente da Associação Brasileira de Enologia (ABE) e enólogo da Wine Park, Christian Bernardi, essa perspectiva deverá se confirmar. Segundo ele, a safra 2012 se desenha como sendo uma safra de quantidades regulares de produção e com qualidade excepcional.

Safra recorde
Em Flores da Cunha, apesar do prejuízo substancial registrado por 318 famílias em decorrência do severo temporal de granizo ocorrido em 14 de dezembro do ano passado, a expectativa de uma colheita singular também vem se confirmando e o cenário que se desenha empolga os empresários do setor. Conforme o enólogo da Indústria de Bebidas Fante, Cedenir Fortunati, que já recebeu metade da quantidade programada para este ano, a previsão de uma safra histórica está se confirmando. “Observando o que já temos aqui, afirmo que até agora a qualidade das uvas está excepcional, principalmente no aspecto da sanidade e da concentração de açúcar. A Bordô, por exemplo, tem alcançado 15 graus babos. Já a Chardonnay, que utilizamos na elaboração da base para espumante, está com uma sanidade excelente. Nessa variedade nós não buscamos uma graduação muito elevada. Precisamos obter um equilíbrio entre o açúcar e a acidez, que neste ano também está fantástico”, explica Fortunati.

Para o presidente da Associação dos Produtores dos Vinhos dos Altos Montes (Apromontes) e diretor da Luiz Argenta Vinhos Finos, Deunir Argenta, ainda é cedo para afirmar que essa será uma safra histórica. Segundo ele, isso só poderá ser comprovado quando estiver concluída, a partir de dados concretos. Todavia, ele destaca que até o momento a qualidade das uvas recebidas é excepcional. “Até o momento a safra 2012 tem sido incomparável. Essa observação é unânime entre as vinícolas associadas à Apromontes. Sem dúvida nenhuma a performance da uva está sendo superior ou, no mínimo, igual a de 2005. Essa está sendo a melhor safra da vinícola, que tem 12 anos de existência”, evidencia o empresário que, até o momento, já colheu as variedades Chardonnay, Gewustraminer, Pinot Noir e Resling Itálico, restando ainda 11 variedades tardias.

Na opinião do enólogo da Vinícola Salvador, Daniel Salvador, a qualidade da safra de 2012, até o momento, está superando as demais em todos os aspectos. “Costumamos dizer que uma safra boa não se resume apenas ao período de insolação. Se a safra se comprovar como a de 2005, nós teremos chuvas brandas que não comprometerão a qualidade, mas sim horas de sol suficientes no mês de março. O índice pluviométrico neste mês pode preocupar. Nessa semana, por exemplo, tivemos chuva em dois dias. Por enquanto, a uva ainda está em um estado que irá admitir um pouco de chuva, mas o sol ainda é essencial para garantir a completa maturação da fruta. Somente assim poderemos dizer: sim, tivemos uma safra superior à de 2005”, aposta o enólogo, que já recebeu em sua vinícola grande parte da safra. Segundo ele, a partir desta semana, inicia o recebimento de uvas Merlot e, na sequência, de Cabernet Sauvignon.

Muito além do clima
Conforme os profissionais do setor, diversos fatores estão envolvidos para que esta safra tenha uma qualidade excepcional. Na opinião de Deunir Argenta, além do clima que vem colaborando, o fator humano também é determinante. O empresário observa que a conscientização do produtor de uva, que está renovando o processo de manejo em seus vinhedos, também contribui. “Diversos fatores combinados estão nos proporcionando bons frutos. Primeiramente, destacamos o empenho dos viticultores, que têm buscado melhorar, cada vez mais, a qualidade dos vinhedos. Também contamos com a ajuda do clima.”

Para o enólogo da Fante, Cedenir Fortunati, a excepcional qualidade apresentada nas uvas se deve também à ocorrência do fenômeno La Niña, que provoca um menor índice de chuvas na primavera e no verão no Rio Grande do Sul, resultando em um clima mais seco, com menos umidade. “Nesse período a baga estava em formação. Como tivemos muito pouca umidade, não registramos doenças fúngicas e a sanidade se conservou até a completa formação. Por isso digo que a safra 2012 está excelente.” Segundo ele, a previsão é que a Fante processe cerca de 6 milhões de quilos de uvas, entre variedades finas e americanas. Em 2011 o total foi de 5,5 milhões de quilos. A empresa não possui vinhedos próprios e conta com a parceria de 200 famílias.

Outro fator a ser levado em consideração, conforme o enólogo Daniel Salvador, é que o viticultor está sendo melhor remunerado pela qualidade da uva que produz. “Essa prática tem que ser parabenizada. Na verdade foi uma união de interesses dos empresários do setor e dos produtores. Isso está dando certo e tem que ser levado adiante. Hoje não esperamos mais quantidade. O que realmente importa é a qualidade. Não adianta termos um bom sistema de vinificação se não tivermos um bom cultivo”, destaca o empresário que hoje recebe uva de, em média, 30 fornecedores.

Salvador observa que não basta mais analisar somente o açúcar de uva; hoje também observa-se o polifenol, a constituição da casca, a maturação das sementes, compostos que não eram analisados há algum tempo e que agora são essenciais. “Por isso eu ainda acredito que a safra 2012 será muito melhor que 2005, se analisarmos os demais aspectos envolvidos. De 2005 para cá muito mudou. O vinho é mais divulgado, mudou a percepção de produção e de comercialização. Então, os frutos que a safra de 2012 irá herdar serão muito maiores, mas posso afirmar que aprendemos muito nesse tempo e a tendência é melhorar cada vez mais”, pontua Salvador.

As bebidas deste ano também serão destaque
Se a matéria-prima e a técnica de elaboração são boas, dificilmente se faz vinhos ruins. Então, a julgar pela qualidade da uva até o momento, presume-se que a safra 2012 renderá excelentes vinhos, espumantes e sucos. Considerando as condições climatológicas apresentadas até o momento, o enólogo Daniel Salvador destaca que os consumidores podem esperar vinhos com distinções organolépticas. “Se essa condição se manter nós teremos vinhos surpreendentes. A esperança é que lá em 2017 estejamos ainda bebendo alguns vinhos de 2012 em situação de envelhecimento imediato e, quem sabe, quebramos o paradigma de que o Brasil é terra somente de vinhos jovens. Nós temos condições de elaborar grandes vinhos e isso irá repercutir internacionalmente”, aposta.

Quanto às características dos vinhos que estão nascendo, Salvador explica que teremos bebidas bem definidas. “Neste ano, também observamos que a maturação de açúcar e de taninos está sendo paralela. Isso vai refletir em vinhos com menor graduação alcoólica, porém maduros. Teremos vinhos de guarda com menor quantidade de álcool. Em decorrência da qualidade da safra, em 2012 também esperamos um incremento substancial nas vendas”, completa o enólogo.
Presidente da Apromontes, Deunir Argenta aposta que a safra 2012 irá resultar nos melhores vinhos produzidos no Brasil até hoje. “Tudo indica que a safra 2012 irá resultar em vinhos excepcionais, considerando a qualidade da matéria-prima. Indiscutivelmente poderemos ter vinhos que se igualam aos melhores do mundo”, afirma Argenta.

Para o presidente da ABE, Christian Bernardi, ainda é cedo para fazer afirmações com relação ao vinho proveniente desta safra. “O que se pode dizer é que neste ano o acompanhamento dos vinhedos e a determinação do momento da colheita é ainda mais importante para obter características adequadas ao estilo da vinícola ou do produto desejado. Podemos ter certeza que os enólogos brasileiros estão se esmerando para surpreender o consumidor”, afirma.

Chuva abaixo da média
Conforme previsão climática de consenso do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), o verão permanecerá com precipitação abaixo do padrão climatológico. A análise detalhada dos modelos estatísticos feitas pelo Instituto indica que os meses de março e abril tendem a manter um padrão de chuvas abaixo da média na região nordeste do Rio Grande do Sul. Isso pode favorecer as castas tardias como a Cabernet Sauvignon, que inicia sua colheita no mês de março e segue até abril.

Queda no volume deverá ser menor do que 20%
É inegável que a seca prejudicou a safra 2012 no quesito quantidade. O granizo de dezembro acabou, parcial ou totalmente, com dezenas de parreirais na região. Apesar disso, as previsões de perdas de 20% ou mais da safra não deverão se confirmar. De acordo com o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR) de Flores da Cunha e Nova Pádua, Olir Schiavenin, esse percentual deverá ser bem mais baixo. “É cedo ainda para uma conclusão definitiva, mas pelos relatos dos produtores que tenho acompanhado, acredito que a queda na produção não será tão acentuada como divulgado anteriormente. Em termos de qualidade, não tenho dúvida que esta será uma safra excepcional. Penso, inclusive, que será melhor que a de 2005, pois o aspecto da parreira está melhor do que naquela época”, avalia o presidente. O STR abrange 15 mil propriedades e 18 mil famílias em Flores e Nova Pádua.

Apromontes quer ampliar a promoção dos vinhos regionais

Este ano promete ser especial para a Associação de Produtores dos Vinhos dos Altos Montes (Apromontes). Conforme o presidente Deunir Argenta, estão definidas as datas para eventos importantes realizados pela entidade: entre junho e julho serão lançados os vinhos da Apromontes; em agosto a expectativa é que seja realizado o lançamento dos espumantes das vinícolas que compõem a Associação. O tradicional Baile dos Espumantes está programado para novembro. “Também queremos participar de eventos regionais, estaduais e nacionais, de forma institucional, unicamente com o objetivo de divulgar a entidade e seus associados”, afirma o empresário.

Um projeto aguardado pelas vinícolas parceiras é o que busca obter a certificação de Indicação de Procedência para os produtores de uvas da região. Conforme Argenta, a pesquisa realizada pelas Embrapa Uva e Vinho, Embrapa Clima Temperado, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e Universidade de Caxias do Sul (UCS) foi concluída no final de 2011. O projeto será encaminhado para o reconhecimento do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). A expectativa do presidente é que a aprovação do projeto ocorra ainda em 2012.



Colheita das primeiras variedades de uvas na Luiz Argenta Vinhos Finos confirma a expectativa do setor. - Gilmar Gomes / Luiz Argenta Vinhos Finos / Divulgação
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