Nova Pádua

Uma visão de futuro em 1991

Emancipação de Nova Pádua levou o Pequeno Paraíso Italiano a ser reconhecido no cenário gaúcho e brasileiro

Em pouco mais de um ano, a comunidade de Nova Pádua conseguiu fazer surpreender até mesmo os mais incrédulos. De maio de 1991 até maio de 1992, organizou-se a Comissão Emancipacionista, com toda a documentação exigida pela lei, que encaminhou o processo à Assembleia Legislativa, realizou seu plebiscito, desmembrou o Travessão Alfredo Chaves, teve a lei criada e sancionada pelo Governador e, neste sábado, dia 20 de março, comemora 29 anos de emancipação política. 
Uma vitória comemorada por muitos e lembrada com carinho por quem fez a diferença. “O que eu fiz para emancipar Nova Pádua, se houvesse necessidade em fazer, faria tudo novamente”, diz com orgulho o presidente da Comissão Emancipatória, Odir Boniatti, que na época era vice-prefeito de Flores da Cunha e hoje atua como secretário da Saúde do Pequeno Paraíso Italiano. 
Boniatti conta que tudo começou com o padre Antônio Galiotto, o qual incentivou a comunidade a se engajar para uma possível emancipação. “Era uma quarta-feira, teve uma reunião na casa do meu irmão, Nestor. Tinha o vigário, tinha os vereadores, e foi iniciada a conversa de emancipação. No domingo de manhã, dia 19 de maio, reunimos a comunidade no salão, em torno de 180 pessoas. Faltava 12 dias para entregar a documentação para emancipar Nova Pádua”, conta Boniatti. Na reunião foi colocado em discussão a emancipação e aprovada por maioria. “Nesse dia fui aclamado como presidente da Comissão. Ficou decidido que eu escolheria toda a comissão e a primeira coisa que fiz, para não criar atritos e questões políticas, foi convocar um membro de cada partido político, tanto que o presidente fui eu (MDB), o vice foi o Ivo Sonda (PP), e coloquei um membro do PDT”, conta. 
A partir deste dia, o trabalho árduo iniciou. O tempo era curto, “confesso que ia madrugada adentro fazendo trabalhos”, afirma Boniatti. A comissão tinha até o dia 31 de maio para entregar na Assembleia Legislativa toda a documentação da emancipação. E foi constatado o primeiro problema: o número de eleitores. “Só com os habitantes de Nova Pádua não tínhamos eleitores que chega para realizar o plebiscito de emancipação. Então precisamos anexar Alfredo Chaves na conta”, diz Boniatti que afirma que a localidade foi anexada sem mesmo saber da história. “Nós nem tivemos oportunidade de conversar com eles antes para ver se aceitavam, mas como havia a possibilidade depois de se desanexarem, não tinha problema. E se quisessem ficar, nós ficaríamos com eles também”. 
No dia 31, em Porto Alegre, a documentação foi entregue. “Confesso até que nós fizemos documentos assim, que às vezes não eram documentos totalmente completos, devido ao tempo, mas nós fomos substituindo depois”. Um acordo verbal, após a entrega da documentação, entre Nova Pádua e Alfredo Chaves foi realizado, o qual foi cumprido com a volta da localidade à sede mãe: Flores da Cunha. 
Após, novos desafios: uma comissão contra a emancipação: “essa comissão se juntou com Alfredo Chaves para ganhar mais força, mas isso foi mais um lado político, porque eu não via, sinceramente, razões de gente esclarecidas como eram, políticos, que não aceitassem a emancipação de Nova Pádua. Mas respeitamos”.
Boniatti afirma que antes do plebiscito, a comissão percorreu por toda Nova Pádua, colocamos os prós e os contra da emancipação. “Eu me lembro que na oportunidade eu dizia com toda a garra e força que Nova Pádua ia aparecer estatisticamente no cenário gaúcho e brasileiro como um município de destaque, e realmente aconteceu isso”.

Mudanças após a emancipação 

A principal mudança após a emancipação foi a entrada de recursos federais e estaduais para o município. “Nova Pádua começou a ter recursos e esses serem aplicados no desenvolvimento da comunidade. O primeiro prefeito já começou a asfaltar Nova Pádua, na primeira administração”, relata Boniatti. 
Conforme Odir Boniatti, todos os prefeitos que passaram por Nova Pádua cumpriram com suas obrigações. “Todos trabalharam dentro da capacidade de cada um”. 
O atual prefeito de Nova Pádua, Danrlei Pilatti, filho de Nova Pádua, declara que ouviu muitos relatos da época da emancipação. “Acredito que foi o momento mais marcante para a comunidade, porque ele trouxe o desenvolvimento. Na época tiveram que fazer as pessoas acreditarem que aquele era o melhor projeto para a cidade no momento, e hoje, 29 anos depois, é concreto isso, é visível. Naquele momento, para alguns não passava de um sonho, e hoje a gente vê tudo isso concretizado, e estamos indo na mesma linha, de seguir com o desenvolvimento”, acredita Pilatti. Dentre suas propostas para o Pequeno Paraíso Italiano, está incentivar ainda mais a agricultura e o turismo. 

“Nossa visão era de respeito à democracia”

É desta forma que o ex-prefeito Alberto Walter de Oliveira explica sua atuação de apoio às comunidades de Nova Pádua, para que alcançassem a emancipação, e de Alfredo Chaves, que desejou permanecer com Flores da Cunha e não integrar o novo município.
Para Oliveira, a emancipação de Nova Pádua “foi boa também para Flores da Cunha. É um filho que cresce, se desenvolve, cria suas estruturas, gera sua receita e de uma hora para outra, democraticamente, decide prosseguir outro caminho. Foi bom para Flores da Cunha e muito bom para Nova Pádua.”
Avaliar uma decisão, depois de 30 anos e ter a certeza de que foi acertada é, para o ex-prefeito de Flores da Cunha, motivo de satisfação. “Cada dia tenho mais convicção de que nós acertamos na decisão tomada. Acertamos, naquele momento, em não criar nenhum embaraço para a emancipação”.  Sempre dedicado aos números para embasar suas decisões, o ex-prefeito foi o responsável pela elaboração de um estudo que mostrava as vantagens econômicas, como o incremento de receita que Nova Pádua poderia ter, sem perda de arrecadação para Flores da Cunha. 

“Nova Pádua montou o cavalo encilhado na hora certa”

O primeiro vice-prefeito de Nova Pádua, Ivan Menegat, lembra que aquele foi o momento certo, proporcionado pela legislação que permitia aos distritos e localidades a busca pela emancipação. Mesmo com algumas forças contrárias, a ação pró-emancipacionista realizou todas as tarefas burocráticas e o plebiscito transcorreu com tranquilidade. “Às vezes se excediam as questões políticas, dando margem para o lado pessoal, mas isso não foi motivo de perda”, lembra Menegat. 
Depois do plebiscito, o consenso já não foi alcançado. “Veio a emancipação, o sim ganhou, houve festa, as pessoas se abraçaram, mas depois vinha a segunda fase, que era a instalação do município”, conta Ivan. Os partidos se organizarem para eleger o prefeito e “aí começaram as dissidências, a disputa. O candidato de consenso não vingou, que a meu propósito ele merecia”, afirma Ivan. A proposta inicial era que o Odir Boniatti seria o candidato a prefeito, Ivan Menegat seria o vice e Ivo Sonda seria o presidente da Câmara, lembra o ex-vice-prefeito. Mas os partidos não concordaram e houve a eleição com chapas distintas, onde Dorvalino Pan tornou-se o primeiro prefeito do novo município.
O apoio do prefeito de Flores da Cunha, Alberto Oliveira, na época, continuou depois da eleição. Ivan conta que ele acompanhou a comitiva de Nova Pádua na negociação do aluguel do local onde foi instalada a prefeitura municipal, e a prefeitura de Flores da Cunha custeou a reforma da casa, que era das irmãs de São José. 
O passo seguinte foi criar uma estrutura administrativa, bastante enxuta, cabível para o momento. Houve negociação de transferência de funcionários e a divisão de máquinas que pertenciam a Flores da Cunha, na proporção do território emancipado. Ivan afirma que “o prefeito Alberto foi justo, possibilitando uma negociação tranquila”. Para organizar toda a administração do município era necessário alguém com conhecimento das leis e da parte contábil. Por isso, aprovamos junto à Câmara um convênio para a troca de funcionários, com a cedência para Nova Pádua de Sonia Montanari. “Ela era a cabeça, foi o braço direito para estruturar a administração de Nova Pádua”, relata Ivan. 
A primeira administração de Nova Pádua estava alinhada com o governo do Estado, conduzido por Alceu Collares. Através de convênios com a Secretaria de Obras e com a Cintea foi possível obter máquinas para abertura e melhoria de estradas, que eram demandas antigas. Também foi cedida uma perfuratriz de poços artesianos, permitindo água potável para todo o interior. “Não é que nós estivéssemos esquecidos, mas o valor de investimentos multiplicou várias vezes. Com a emancipação, aumentou a receita para Flores e para Nova Pádua”, explica Menegat. Com arrecadação própria e folha de pagamento baixa, foi possível contratar médicos com especialidade, investir em estrutura do parque de máquinas. Foram compradas diversas máquinas – giratória, caminhão, pá carregadeira – para ajudar na agricultura. O agricultor começou a ser atendido de uma forma como nunca havia sido. “Levávamos cascalho, se abria a estrada ao redor do parreiral... era isso que faltava, aquele algo a mais”, finaliza Menegat. 

Contrário ao poder de qualquer jeito

O ex-vereador Nivaldo Marin, que por alguns é lembrado como alguém que contrariou o movimento emancipacionista, explica que ele “era contrário àqueles que queriam o poder de qualquer jeito”, relatando que sua proposta era de que “nenhum dos representantes políticos daquela época se envolvesse na eleição”. Ele defendia que Odir Boniatti, Ivo Sonda, Ivan Menegat, Nestor Boniatti e o próprio Nivaldo Marin, que eram ou haviam sido vereadores em Flores da Cunha, não fossem candidatos e que a população pudesse escolher entre outros nomes para conduzir o processo de emancipação do novo município. Ele sustentava a ideia de que para trabalhar pela comunidade, não precisava ser prefeito ou vereador, e propunha que houvesse, sem a participação dos políticos, maior neutralidade nas decisões. Para ele, os prefeitos e vereadores passam, mas a comunidade fica.
A ideia de emancipar, conta Marin, surgiu durante a 6ª Feprocol, em fevereiro de 1991, quando por iniciativa do padre Galiotto, procedeu-se a um levantamento de toda a produção primária de Nova Pádua. Os números apresentados no desfile de carros alegóricos daquele ano evidenciaram a pujança do distrito, que poderia dar base ao desenvolvimento de um novo município. 
Ele lembra que, em um domingo, após a missa, reunida no salão paroquial, a comunidade deveria decidir por dar início ao processo e encaminhar os documentos para emancipação. Após a aprovação, o ex-prefeito de Nova Pádua e, naquela época, vereador de Flores da Cunha, Ivo João Sonda, tomou a palavra e sugeriu que o então vice-prefeito de Flores da Cunha, Odir Boniatti, fosse o presidente da Comissão de Emancipação. De acordo com Marin, na sequência, o próprio Odir sugeriu que Sonda fosse seu vice. “Estavam reunidos os inimigos históricos” e, este fato, de acordo com Marin, é o que revoltou parte da população que, na primeira eleição, votou em outro candidato que não fez parte do processo emancipatório, elegendo o professor Dorvalino Pan como primeiro prefeito de Nova Pádua. Ele lembra ainda que um dos nomes apontados na época para ser o primeiro prefeito era o do ex-prefeito de Flores da Cunha, Cláudio Rugero Bedin, mas o mesmo não tinha domicilio eleitoral em Nova Pádua, ficando impedido de concorrer. 
Passados 30 anos, Nivaldo Marin entende que a emancipação foi boa para Nova Pádua, mas segue discordando da forma como os procedimentos foram realizados. “Se fossemos contra, teríamos trabalhado com força pelo “não””, finaliza Nivaldo Marin. 

A comunidade foi ouvida e sua decisão respeitada

O empresário Plinio Mioranza foi uma das lideranças que atuou para que a decisão da comunidade do Alfredo Chaves fosse ouvida em relação à emancipação de Nova Pádua. Ele conta que, com a inclusão do território do Travessão Alfredo Chaves na área que seria emancipada, as lideranças da localidade procuraram as autoridades para buscar uma solução. “Ficou combinado, naquela ocasião, com a orientação da justiça eleitoral, que o plebiscito se daria com votação em separado da comunidade do Alfredo Chaves”. O resultado conferiu ao ‘não’ mais de 90% dos votos. “Foi a forma de ouvir e respeitar a opinião local”, relata Mioranza. 
Perguntado sobre se esta decisão, de não pertencer ao novo município, foi acertada, Plinio responde: “talvez pudesse ter sido diferente, mas até hoje nunca ouvi ninguém falar disso. Não houve mágoa ou ressentimento”. Para ele, “é visível o crescimento com sucesso de Nova Pádua, mas Flores da Cunha e o Alfredo Chaves também cresceram”, afirma Mioranza. 
Plinio conta ainda que havia algumas famílias que, por tradição ou ligação política com as lideranças de Nova Pádua, queriam se anexar ao futuro município. Entretanto, o resultado do plebiscito foi respeitado e hoje as duas comunidades vivem em clima de boa vizinhança.

Comissão emancipadora:

Presidente: Odir Boniatti

Vice: Ivo João Sonda

1º secretário: Renato Luiz Boscatto

2º secretário: Pe. Antônio Galiotto

1º tesoureiro: Leonísio Bedin

2º tesoureiro: Ivan Carlos Menegat

Conselho: Lino Pan, Nestor C. Boniatti, Remígio Bordin, Nelson Alessi, Hilário Galioto, Vivaldo Sonda, Levino Zorzi, João Paviani, Olinto Smiderle, Inês Sgarioni Baroni. 

Dados:

- Em 1991, Nova Pádua era constituída por 2.290 habitantes. Vinte e nove anos depois, o município possui 2.558 moradores, 268 a mais. 

- 2.117 pessoas estavam aptas a votar no plebiscito para emancipar Nova Pádua. No dia 10 de novembro, 1.932 eleitores comparecem às nove urnas. 

- Nas duas urnas localizadas em Alfredo Chaves, 92% dos eleitores votaram não a emancipação. 

- O município possui área de 110km², divididos entre a sede e as comunidades: Travessão Divisa, Leonel, Barra, cerro Grande, Travessão Bonito, Mutzel, Curuzu, Travessão Paredes (Santo Isidoro e Santo Antônio), Aciolli, Cerro Largo e São João Bosco. 
 

 - Gabriela Fiorio
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