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Voluntariado para melhorar a vida de crianças africanas

Quem não pode ir para outro continente praticar voluntariado, como a estudante de Odontologia Elaine Vedana e a nutricionista Gessica Alessi, pode contribuir por meio das campanhas educacionais organizadas pelas florenses

Você já pensou em fazer uma viagem de férias, conhecer outra cultura completamente diferente da sua? A florense Elaine Terezinha Vedana, 24 anos, radicada em Florianópolis, onde cursa Odontologia na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) desde 2009, decidiu viver essa experiência que mudou sua vida. Prestes a receber o diploma, passou três meses, de dezembro de 2013 a março de 2014, com a colega Marcela Nuemberg Sávio, no Quênia, no continente africano.

Elas trabalharam como voluntárias pela organização não governamental (ONG) Mama África (www.mammaafrica.it), entidade italiana que atua no país desde 2007, promovendo educação e saúde para crianças da região de Mathare, a segunda maior favela do Quênia. “O foco do projeto é educar e abrigar crianças órfãs, com graves problemas de saúde ou em miséria extrema, que sobrevivem com cerca de um dólar por dia. O Mama África criou e mantém uma escola, onde cerca de 300 crianças têm acesso a aulas e tratamentos de saúde, com consultório médico e dentário. Trabalhamos nesse local e em outras escolas ao redor”, conta Elaine.

Elas foram ao país por intermédio da Aiesec, uma organização global formada por jovens universitários e recém graduados que promove intercâmbios para estágios internacionais ou para experiências de voluntariado, há mais de 65 anos e em 124 países. Segundo ela, a escolha do Quênia foi feita pelo fato de que ambas não tinham a intenção de fazer turismo, mas sim de ajudar uma comunidade local. “Tinha outra opção, mas vi nesse intercâmbio a possibilidade de aplicar meus conhecimentos em odontologia e trabalhar com pessoas carentes que não têm nenhum recurso”, cita.

Além do trabalho realizado nas escolas quenianas, Elaine conta que atuaram em Uganda, na fronteira leste. Lá, estiveram em uma fazenda isolada que não tinha água e energia elétrica, onde lecionavam inglês e prestavam serviços odontológicos. Ela lembra que era necessário criar laços com as crianças e conhecer suas histórias. “Ficávamos dois ou três dias acompanhando os moradores, conversando e trocando informações de cultura. Quando eles estavam mais familiarizados com a gente é que ensinávamos como deveriam escovar os dentes, dentro da realidade e possibilidade de cada um.”

Dificuldades
Elaine lembra que apesar da realização pessoal que obteve com a oportunidade de estar em lugar como o Quênia, aplicando seus conhecimentos e ajudando ao próximo, enfrentaram muitas dificuldades. Inicialmente com a desconfiança do povo local e com problemas de locomoção devido ao trânsito caótico. “Eles acham que todo branco é europeu e tem dinheiro. Então, tentam tirar vantagens o tempo todo. As coisas sempre tinham preço diferenciado para nós, mas logo no início aprendemos a lidar com isso e já avisávamos que éramos estudantes. Iniciávamos uma conversa e eles já nos consideravam locais”, conta.

Conforme ela, a comunicação foi outra dificuldade, pois grande parte da população fala o idioma local, o kiswahili, utilizando poucas palavras do inglês, que é a segunda língua do país. “As crianças mais novas aprendem o inglês na escola e todos falam. Porém, os mais idosos sabem apenas o básico, o que dificultava o entendimento. E o engraçado é que todas as pessoas, até mesmo os mais instruídos da faculdade, mesclavam o tempo todo o kiswahili e o inglês, nos deixando bem confusas”, lembra.

Fotos/ONG Mama África/Divulgação

Favela de Mathare.

A grande lição
Elaine diz que já sabia o que encontraria no Quênia uma realidade diferente, mas que se surpreendeu com tamanha disparidade social. O governo queniano não oferece nenhum tipo de serviço público como saúde e educação para a população, a qual convive com a miséria e com a fome. “É completamente diferente do nosso mundo. A gente está acostumada a dizer para nossos pacientes que eles precisam escovar os dentes três vezes por dia, após as refeições, mas não podíamos chegar lá e dizer isso para as crianças, pois, muitas vezes, nem comida e água elas tinham. Passavam vários dias com o mesmo uniforme rasgado, quando tinham”, relata a universitária que levou mais de mil escovas e tubos de creme dental para distribuir aos alunos.

Sobre a experiência, Elaine só tem elogios. Apesar de ter ido ensinar, diz que aprendeu muito com as pessoas dos lugares em que esteve. O povo que convive com a miséria total, com a falta de comida, de água, de moradia, com o mínimo para a sobrevivência, conferiu uma grande lição de vida às estudantes. “Apesar de todas as dificuldades que eles têm, estão sempre com um sorriso no rosto, nos abraçando e nos dando muito amor e carinho, para agradecer por estarmos lá. É muito diferente da nossa realidade, na qual as pessoas têm milhões no banco e vivem com a cara fechada”, lamenta a universitária, que assegura ter constatado que não é necessário ter dinheiro para ser feliz.

Sair da zona de conforto e vivenciar um cotidiano diferente do habitual fez com que a jovem florense revisse conceitos, inclusive com relação à profissão. “Essa foi uma das melhores experiências da minha vida. Derrubei todos os meus conceitos do que é e do que não é normal. Mudei como pessoa. Aprendi que levar a vida na simplicidade e valorizar as pequenas coisas é o mais importante”, avalia a estudante que está desenvolvendo um projeto em uma comunidade carente de Florianópolis, onde atende gratuitamente os moradores e ex-dependentes químicos. “O voluntariado é uma causa que levarei adiante enquanto eu puder e da forma que eu puder. Não existe nada mais gratificante do que receber um sorriso de agradecimento”, completa.



Legado para uma geração

Após algumas semanas de trabalho na favela de Mathare, as universitárias Elaine Terezinha Vedana e Marcela Nuemberg Sávio perceberam que poderiam fazer mais pelas crianças quenianas. Foi então que pensaram em criar um projeto para ampliar o ensino na escola, que atende somente até a 4ª série. “O nosso colégio era um dos únicos que tinha uma estrutura física para abrigar as crianças. Nossa vontade era de encher aquele espaço. Eles só não tinham as outras séries porque não tinham dinheiro”, conta. Para tentar reverter a situação, elas buscaram ajuda dos amigos brasileiros e, por meio do Facebook, organizaram a campanha Adote uma criança no Quênia, com o objetivo arrecadar dinheiro para custear os estudos de mais alunos.

Na rede social elas criaram a página Help Mamma Africa (www.facebook.com/helpmamaafrica), onde apresentam histórias como a de Sidney Njenga, nove anos, um garoto esperto e dedicado, que está na 3ª série. Ele vive em Mathare com os pais, que não têm condições de pagar os estudos dele. Hoje, a página tem mais de 490 likes e, segundo Elaine, por meio dela, cerca de 20 crianças quenianas do ensino fundamental já foram ‘adotadas’. “Estamos mudando a realidade e fazendo a diferença na vida dessas pessoas. Cada criança adotada é uma conquista muito grande para nós. Muitas outras esperam pela oportunidade de estudar e todos podem ajudar”, lembra a voluntária.


Sidney Njenga.

Para ‘adotar’ Sidney ou outra criança do país é muito fácil. Basta fazer uma doação de R$ 40 mensais (R$ 480 anuais) para o ensino fundamental e R$ 120 mensais (R$ 1.440 anuais) para o ensino médio. “Esse dinheiro é utilizado pela ONG Mama África para pagar professores, água, luz, comprar comida, livros e uniforme. Os alunos entram na aula às 8h e saem às 16h. Passam o dia e recebem todas as refeições. Praticamente todos eles só comem porque estão na escola”, justifica.
O dinheiro deve ser depositado até o dia o dia 20 de cada mês, em uma conta criada apenas para receber as doações brasileiras. Em seguida, o valor total é repassado para a Mama África.

As estudantes controlam a conta e, todos os meses, apresentam extratos das transferências. Os padrinhos podem acompanhar a evolução de seus afilhados, pois mensalmente as diretoras do projeto enviam notícias das crianças, com fotos, notas de provas e cartas. “Resolvemos abraçar esta causa porque tivemos a chance de ver com nossos próprios olhos que o projeto realmente funciona. Tudo o que é doado é utilizado 100% em prol das crianças e, graças à honestidade de todos os organizadores e voluntários que trabalham duro, já conseguiu mudar o futuro de muitos jovens”, comemora Elaine.

Luta e implantação do ensino médio

Como as escolas no Quênia contam apenas com ensino fundamental, quando concluem essa etapa as crianças param de estudar, pois não existe ensino médio no país devido ao alto custo de manutenção. Percebendo que muitos jovens também tinham o sonho de estudar e de um dia, quem sabe, ter a chance de ingressar em um curso superior, as universitárias brasileiras, com ajuda da ONG Mama África, criaram uma escola de segundo grau, por meio de recursos oriundos de doações do Exterior.


Alunos do ensino médio.

No início de 2014 elas conseguiram um terreno, localizado em um vilarejo no interior de Thika, uma cidade a aproximadamente uma hora e meia de Nairóbi, para a construção. Contudo, Elaine destaca que a distância (era necessário pegar dois ônibus e um táxi para chegar à escola) inviabilizava o acesso dos alunos. Por isso, reformaram uma casa antiga que existia neste terreno e o local é utilizado como dormitório para as crianças ficarem durante a semana. Antes de voltar ao Brasil elas conseguiram inaugurar a escola de segundo grau. Hoje, ela diz que 24 alunos estão frequentando as aulas. Destes, três são mantidos por meio de padrinhos brasileiros e, os demais, por conta da ONG italiana.

Uma mala de alegria

A corrente do bem parece ter contagiado os florenses. A exemplo do que fez Elaine Vedana, outra florense também irá trabalhar voluntariamente na África do Sul. No dia 24 de agosto a nutricionista Gessica Alessi, 29 anos, embarca em uma viagem de duas semanas para atuar em uma escola com cerca de 30 alunos, com idades entre cinco e seis anos. Lá, pretende desenvolver o projeto África, nutrição e vida, com ações voltadas ao segmento nutricional. “Nunca pensei em fazer algo assim, mas quando recebi o convite, na hora brilhou o olho. Então, comecei a desenvolver um projeto sobre o que faria no país. Meu objetivo é aplicar meus conhecimentos e ajudar a melhor a vida dessas pessoas”, cita.


Gessica Alessi.

Gessica organizou uma campanha nas redes sociais para arrecadar materiais escolares para levar às crianças. Quem quiser colaborar e fazer a doação de qualquer tipo de material pode entrar em contato pelo Facebook (www.facebook.com/gessicaalessi), pelo email nutricionista.gessicaalessi@gmail.com ou pelo celular (54) 8108.0808. “A meta é encher uma mala de material escolar: lápis de cor, canetinha, borracha, giz de cera, lápis, caneta, tesoura, apontador... Enfim, são materiais de pouco valor, mas que para eles fará a diferença. Vamos todos juntos levar um pouquinho da solidariedade brasileira e colocar um sorriso nos rostinhos daqueles pequenos”, solicita ela, destacando que quem não tiver a possibilidade de doar algo, pode ajudar compartilhando a iniciativa nas redes sociais.


Como participar

Quer ajudar?
- Conta para depósito: Banco do Brasil, agência 2357-4, conta corrente 20275-4. Titular: Roberta Nuernberg Savio (irmã de Marcela).

Sobre a Aiesec
- Universitários ou recém formados que têm vontade de viajar para algum lugar do mundo, conhecer outras culturas e ainda promover o bem por meio do voluntariado podem procurar a Aiesec no Brasil (www.aiesec.org.br). Mais de 200 universidades brasileiras têm parceria com a organização. São 5 mil membros voluntários distribuídos em 77 escritórios locais que promovem em torno de 3 mil intercâmbios por ano, somente do Brasil.

- O objetivo dos intercâmbios é oportunizar o desenvolvimento pessoal dos estudantes e suas habilidades por meio do contato com outras culturas e realidades. São dois modelos de programas: Cidadão Global e Talentos Globais. No primeiro os estudantes têm a oportunidade de desenvolver ações em ONGs e projetos educacionais com ênfase em gestão de projetos, educação cultural e ensino de novas línguas, entre outras. No segundo, os participantes são inseridos em culturas diferentes com o objetivo de vivenciar desafios profissionais em empresas internacionais.

A florense Elaine Vedana (agachada) e a colega Marcela Sávio (de touca) com crianças atendidas pela ONG Mama África. - ONG Mama Africa/Divulgação
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