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Você conhece a doença celíaca?

Maio Verde conscientiza sobre a condição que restringe massas, bolos e cervejas da dieta e muitas vezes é assintomática

Massas, bolos, biscoitos, pães e até cervejas. Imagine ter uma dieta inteira sem esse tipo de alimento, especialmente numa região rica em pizzas, tortéis e afins. Pois essa é a realidade dos celíacos, portadores de uma doença pouco conhecida, mas que acomete um a cada 100 indivíduos. A fim de conscientizar a população sobre o problema, o mês de maio foi pintado de verde para difundir a vida sem glúten, o grande vilão dos celíacos.
A doença celíaca é uma doença autoimune que se manifesta quando há a ingestão de glúten, proteína presente no trigo, na cevada e no centeio. A reação imunológica do organismo à proteína causa inflamação na mucosa intestinal, o que dificulta a absorção de nutrientes. 
Segundo a médica gastroenterologista Kelli Verdi, a doença é genética e costuma afetar várias pessoas da mesma família, em especial parentes de primeiro e segundo grau. Além disso, a incidência é maior em mulheres, podendo se manifestar tanto na infância, quanto na fase adulta, em pessoas com diabetes, Síndrome de Down e outras doenças autoimunes. 
“A doença se manifesta de várias formas. Existem indivíduos sem sintomas e outros que podem desenvolver diarreia, dor abdominal, vômito, prisão de ventre, estufamento, refluxos. E outros indivíduos manifestam sintomas extraintestinais, como dores de cabeça, lesões de pele, cansaço, anemia, infertilidade e deficiência de vitaminas”, explica Kelli.
Caso a pessoa desenvolva esses sintomas ou tenha risco aumentado para desenvolver a doença, a recomendação é procurar atendimento médico. O diagnóstico é feito através de exames laboratoriais e uma avaliação intestinal. 
O principal tratamento é uma dieta rigorosa, livre de glúten. “A retirada do glúten quase sempre reverte as manifestações da doença. Uma vez que o glúten é retirado da alimentação, a pessoa com a doença celíaca vai ter uma vida normal. Porém, a adesão não é comum e muitas vezes a ingesta de pequenas quantidades pode causar o retorno desses sintomas e complicações da doença”, comenta a gastroenterologista. 
A doutora Kelli, no entanto, chama atenção para o fato de que isso não é tão simples quanto parece: “Por isso, o apoio da família e dos amigos bem como o entendimento da doença são essenciais. Um acompanhamento muitas vezes multidisciplinar, com psicólogo, psiquiatra, nutricionista, gastroenterologista, é de grande importância para o paciente celíaco”. 
 
A dieta sem glúten
Uma vez que a doença celíaca é diagnosticada, o ideal é agendar uma avaliação com um nutricionista a fim de receber orientações sobre a melhor conduta nutricional a ser seguida. “A dieta sem glúten restringe muito a alimentação do paciente. Eu diria que ele vai precisar aprender a comer novamente e sem um bom acompanhamento fica difícil”, justifica a nutricionista Leila Maria Dias.
A profissional garante que a retirada do glúten não causa nenhuma deficiência ao paciente, apesar de se tratar de uma proteína. No caso dos celíacos, outras opções de carboidratos são requeridas apenas para evitar uma alimentação restrita e monótona. Pessoas que não apresentam doença celíaca ou intolerância não precisam retirar o glúten da dieta sem orientação médica, pois a restrição não está associada a nenhum benefício à saúde.
Segundo Leila, novos hábitos como os de olhar rótulos e entender as informações nutricionais se fazem necessários na vida dos celíacos. Mas entre os mais importantes estão a conscientização e a aceitação da doença. “É preciso saber que o glúten não pode mais fazer parte da sua alimentação e que, se ingerido, lhe fará muito mal”, diz a nutricionista.
Além da aceitação da própria condição, o celíaco também tem de enfrentar outro desafio: a aceitação dos que estão à sua volta. “Já foi pior, mas ainda é uma das maiores dificuldades. Falta muita informação. A associação que se criou do glúten com dietas da moda e frescura alimentar atrapalha muito”, comenta Leila, que prossegue: “A retirada do glúten é a única saída, uma questão de necessidade, de saúde, de qualidade de vida, de sobrevivência até, eu diria”. 
Foi justamente com o intuito de informar sobre o impacto da condição celíaca na vida das pessoas que, em 2018, foi criada a campanha Maio Verde, mês dedicado a ações de conscientização sobre a doença. O objetivo, segundo o site oficial do movimento, é “uma ação profunda, onde todas as organizações, empresas do segmento, comunidade dos celíacos e médicos se unam pela causa, pelo movimento em prol de todas as pessoas que convivem ou fazem parte disso”. 
A nutricionista comemora iniciativas como a do Maio Verde: “Que tenhamos cada vez mais campanhas nesse sentido. Que se fale muito sobre o assunto neste mês, mas que não esqueçamos dele no restante do ano. Mais conhecimento e empatia e menos achismos e julgamentos”, afirma Leila.

O dia a dia de um celíaco
Não dar bola. Foi essa a reação imediata da florense Júlia Dondé quando descobriu, há alguns anos, a sua condição de celíaca. “Eu fazia acompanhamento médico, mas os exames de sangue que poderiam dar alterados por causa da doença, continuavam bons. Fui empurrando com a barriga, comendo às vezes, sem tirar completamente o glúten da minha vida”, conta Júlia.
O susto veio quando o resultado dos exames se alterou, passado um tempo de negligência. “Aí eu me preocupei. Fiquei chateada comigo mesma por não ter levado a sério. Parece fácil, que é só deixar de comer. Mas e todas as situações do nosso dia a dia em que nós saímos e só nos deparamos com coisas que têm glúten para comer?”, questiona.
Júlia afirma que, na maioria das vezes, quando explica a sua condição em um restaurante, ela é confundida com frescura, preocupação estética ou até mesmo com outras doenças mais comuns, como a intolerância à lactose. “As pessoas também são inconvenientes no incentivo a comer, dizem: “um pedacinho não vai te fazer mal”. Mas elas não sabem a gravidade do que pode vir a acontecer”, revela Júlia.
Hoje, consciente da importância de lidar com a doença, ela deixa de lado o pão de cada dia da dieta e, quando sente vontade, coloca a mão na massa para fazer a receita sem glúten. Não raro, precisa comer antes de sair de casa para não se confrontar com todas as situações nas quais ficará sem opções de comida - mostrando como disciplina, resiliência e planejamento são palavras-chave no cotidiano de um celíaco.  
Mesmo com os inconvenientes, ela diz que os cuidados valem a pena: “Não tem coisa no mundo que pague estar bem de saúde e não ficar sofrendo com os sintomas que essa doença te traz. A longo prazo, se eu não cuidasse, poderia ter uma consequência muito maior”, alerta Júlia, cuja mãe, assintomática, descobriu a condição por sua causa.
No próximo dia 20, junto com a nutricionista Marina Sgarioni, Júlia participará de uma live de conscientização sobre o tema, às 18h30min, disponível no Instagram da Tudo em Grãos (@tudoemgraosfloresdacunha). Antes disso, ela fez um apelo aos restaurantes: “Uma coisa importante seria colocar um sinal no cardápio que marque as refeições com e sem glúten. Nós não estamos pedindo dez refeições sem glúten. Uma única opção já mostra que o estabelecimento tem um cuidado especial, nos faz sentir valorizados, incluídos”, encerra Júlia. 

Júlia Dondé ignorava cuidados até que seus exames se alteraram. - Pedro Henrique dos Santos
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