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Uma safra comprometida pela falta de chuva

Seca deixou grãos finos e parreiras fracas e município decreta situação de emergência. Agricultores já estão solicitando aberturas de açudes para melhorar seus reservatórios de água

Na terra da uva, um momento de expectativa. A seca deixou muitos agricultores preocupados com a safra, e se as precipitações não começarem, há possibilidade de a fruta ficar no pé. “A expectativa comparada com o ano passado é bem menor, porque na fase de enchimento do grão começou a escassez de chuva e a produção só vem decaindo”, destaca o agricultor e estudante de agronomia Isaias José Golin, 22 anos. 
Em sua propriedade, em Santa Libera, a falta de chuva castiga os sete hectares de uva Bordô e Niágara. Os reservatórios de água não estão dando conta e chover é a única solução. “Temos uma pequena reserva de água, e estamos optando por molhar as áreas que têm o solo menos profundo, porque a parreira sofre mais”, conta o produtor que tem o intuito de não deixar a parreira morrer, já que é uma cultura permanente. Segundo ele, conforme seu avô, de mais de 70 anos, nunca houve uma seca como essa. 
O mesmo é relatado pelo presidente do Sindicato dos Trabalhadores Agricultores Familiares de Flores da Cunha e Nova Pádua, Olir Schiavenin, que também nunca presenciou uma situação climática tão grave. “A cada dia sem chuva, se agrava cada vez mais a situação. Tem parreiras morrendo, vamos ter uma quebra muito grande e um prejuízo até então incalculável, já que os insumos subiram exageradamente nesta safra”, informa. 
E esta semana está sendo crucial, pois está definindo o que os agricultores irão fazer. “Se a uva não completar o ciclo e tiver muito ácida, não vejo vantagem em colher, até para os fabricantes de vinho, fazer o vinho, porque não vai ter qualidade nenhuma. Talvez seja uma opção cortar a uva e não utilizar ela para nada. Mas, para chegar nesse ponto, é bem difícil. Se a gente olhar algumas áreas onde foi podado mais cedo e que precipitou um pouco, a uva vai se mantendo, ela vai completando o ciclo. Não vai engrossar muito, mas se ela fechar o ciclo e fazer um grau brix suficiente para fazer vinho ou suco, daí dá para aproveitar”, explica Golin.
A perspectiva do início da colheita é para o dia 24, mas os agricultores precisam fazer todo um monitoramento para acompanhar o processo de amadurecimento da fruta e a doçura. E o trabalho não vai parar após a colheita. Com os danos nas parreiras pela falta de precipitação, é preciso cuidar dos pés, trabalhar no manejo do solo, adicionar material orgânico para melhorar a estrutura física do solo, ter um aproveitamento melhor da chuva e se preparar com açudes e maiores reservatórios de água. “Ninguém sabe o que vai acontecer ano que vem. Agora o pessoal fica mais atento e se prepara mais, racionaliza mais a água. E é assim, vamos empurrando com a barriga e de repente ano que vem melhora”, finaliza.
E com o terceiro ano consecutivo de seca, a Secretaria de Agricultura já está percebendo o aumento na demanda de aberturas de açudes. Na primeira semana do ano foram 123 solicitações de aberturas, limpezas e ampliações – em todo o ano de 2021 o número ficou em 84.
“Em função da pandemia, a irrigação se tornou muito cara nesse último ano, então nem todos os agricultores tiveram condições ou optaram em irrigar os parreirais, mas muitos têm irrigação, uns 40 a 50% dos produtores”, informa a secretária de Agricultura, Fabiane Veadrigo, acrescentando que mesmo tendo açudes e reservatórios, todos estão praticamente secos. “Se a chuva não acontecer agora, não vai ter mais água, e se a seca perdurar até depois da safra o ideal é continuar irrigando, mesmo depois da colheita, para manter a folha da parreira, porque a seca desse ano vai ter reflexos nas próximas safras”.

Situação de emergência
A prefeitura, através da secretaria de Agricultura e Abastecimento, juntamente com a Emater, o STR e o Conselho Municipal da Agricultura, realizaram um levantamento dos dados e decretaram situação de emergência na quarta-feira, dia 12, após o prefeito César Ulian receber na terça-feira, dia 11, parecer favorável da Comissão da Defesa Civil Municipal. “O estado só reconhece situação de emergência se tem danos humanos, onde as pessoas não estejam recebendo água para o consumo”, destaca Fabiane. Segundo os números emitidos pela administração municipal, uma comunidade já está sem água para consumo humano e passou a ser abastecida por caminhões-pipa disponibilizados pela prefeitura.
“O dano econômico dos produtores é grande, se compararmos com a safra do ano passado, esse ano já teríamos uma produção 30% menor. Com a estiagem vai ser 40 ou 50% menor e ainda temos dias decisivos pela frente. Se agora começar a precipitação, a uva engrossa, ela consegue se desenvolver, mas se continuar esse período com essa estiagem fica mais complicado”, afirma a secretária que estima que os prejuízos na agricultura ultrapassam os R$ 47 milhões, até o momento – a uva é a cultura mais afetada, mas hortaliças, frutas de caroço, grãos, entre outras produções também sofreram perdas com a estiagem.
Fabiane destaca que algumas regiões do município tiveram mais precipitações, como a região da Linha 80. Já as regiões de Carmo, São Vitor e São Roque choveram menos. “As chuvas de verão são muito localizadas, então dentro do município tem bastante diferença”, ressalta. Conforme a estação meteorológica de Flores da Cunha, nos meses de novembro e dezembro choveu 68 milímetros, sendo que em um período de chuva isso acontece em um único dia. 
O presidente do STR, Olir Schiavenin, também participa de reuniões para amenizar a situação. “Foi realizada uma reunião com todas as regionais do estado para ver a situação e as 23 regiões estão sendo atingidas. Na última semana também estivemos em Porto Alegre, na Frente Parlamentar da Agropecuária, na Assembleia Legislativa, onde foi encaminhado ao governador e à ministra, Teresa Cristina, sugestões de ações emergenciais que minimizem os efeitos da estiagem”, declara. 
Conforme o documento, a nível estadual ações como implementar com urgência o programa Avançar Agricultura, disponibilizar caminhões-pipas para levar água aos locais mais fragilizados e trabalhar na edição de um decreto de emergência estadual estão entre as pautas. Já a nível federal, é proposto algumas regulamentações na lei 14.275/21, que dispõe sobre medidas emergenciais de amparo à agricultura familiar: crédito emergencial com juro 0% e bônus de adimplência, fomento produtivo com assistência técnica, aquisição de alimentos da agricultura familiar via Conab, prorrogação das parcelas no âmbito do Pronaf por 10 anos, entre outros. 

Isaias José Golin realiza o acompanhamento da uva para iniciar a colheita.  - Gabriela Fiorio
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