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Uma Liga entrelaçada pelo amor

Entidade florense completa 25 anos auxiliando no combate ao câncer. Irmãs Renata e Dioneia emocionam-se em seguir os passos da mãe

Dar continuidade ao legado de bondade que começou a ser edificado pela mãe, Teresinha Mari Zorgi (in memoriam), uma pessoa muito querida pela comunidade florense, é o que uniu ainda mais as irmãs Renata Zorgi Lusa, 52 anos, e Dioneia Zorgi Salvador, 49 anos, na nobre missão de ajudar o próximo e fortalecer os laços que unem a Liga Feminina de Combate ao Câncer de Flores da Cunha. 
A ideia de criar a entidade partiu de Teresinha, em 1997, durante o tratamento quimioterápico da batalha que travou contra o câncer de mama. De acordo com Renata, nas idas e vindas para Caxias do Sul, ela soube da existência de uma Liga, que ajudava financeiramente e emocionalmente as pessoas com a doença e, a partir de então, surgiu a iniciativa de proporcionar esse amparo, também, ao município vizinho. “O emocional das pessoas fica muito abalado e a mãe percebia o quanto era importante essa troca, esse apoio da entidade de Caxias. Ela chegou em casa e me disse que, quem sabe, a gente devesse buscar ajuda para fazer uma Liga aqui em Flores”, lembra a filha que, no período, era vereadora do município e se prontificou a buscar informações para realizar o sonho da mãe. 
“A Liga surgiu em 1998. Na época, eu tinha como assessora de bancada da Câmara a Suzana Carpeggiani, coloquei para ela a situação e disse para abraçarmos juntas essa causa, para buscarmos fazer uma Liga em Flores, e ela concordou, de imediato. Logo depois entramos em contato com a presidente da entidade caxiense, que nos convidou para uma reunião para saber como funcionava e, assim, a gente foi buscando ajuda para instituir uma Liga”, conta a atual diretora de comunicação da entidade florense, ao mesmo tempo em que reforça a importância dos incansáveis voluntários, que estão envolvidos desde o começo com o trabalho filantrópico. 
Renata também explica que a aprovação de uma Liga de Combate ao Câncer no município passava pela entidade estadual, um processo bastante burocrático, demorado, e que exigiu que se buscasse o apoio de muitas pessoas da comunidade e de outras entidades que pudessem se engajar na proposta. Por isso, nos primeiros cinco anos de atuação, a Liga ainda não tinha a aprovação oficial da Assembleia Geral: “Mas, nesse período, nunca deixamos de trabalhar e de auxiliar os nossos pacientes. Através de Caxias, a Liga nos ajudou, nos estendeu a mão, elas foram as nossas madrinhas”, enaltece, acrescentando que, no início, as voluntárias promoviam eventos para angariar fundos – jantares de mulheres, venda de camisetas – e destinar às voluntárias caxienses.
Ainda sem um local para atendimentos, a presidente da Liga por cerca de sete anos relata que trabalhava na Olimovéis e conversava com as pessoas ali mesmo, em sua sala: “A minha gratidão ao Alberto de Oliveira e a Ana, por terem me permitido, me dado espaço dentro da empresa caso viesse algum paciente me procurar, porque eu era referência, de certa forma, como primeira presidente”. Com o passar dos anos e a consolidação da entidade, a demanda pelos serviços oferecidos foi aumentando e, nesse momento, as voluntárias procuraram o poder público para verificar a possibilidade de uma sala para a Liga, pedido que foi concedido e, conforme Renata, só fortaleceu a relação da entidade com a administração, que permanece nas mais diversas gestões.  
“Infelizmente a gente tem cada dia mais procura de pessoas, de pacientes que precisam da nossa ajuda, mas é muito gratificante saber que temos uma Liga e que a gente pode ajudar essas pessoas. Do início até agora, foram mais de 5 mil atendimentos, então percebemos a diferença entre atender ou não essas pessoas. Com certeza ajudamos um pouquinho cada um, seja da forma que for, muitos, graças a Deus, tiveram êxito em seus tratamentos, que é o que almejamos, outros foram vencidos pela doença, como é o caso da minha mãe, mas, felizmente, ela deixou esse legado lindo para nós”, evidencia a corretora de imóveis, revelando seu sentimento em dar continuidade ao trabalho voluntário da mãe e, ao lado da irmã: “É fantástico. É uma forma de eu ter ela, todo dia, presente na minha vida. Não tem um dia que eu não lembre dela, que foi uma pessoa maravilhosa e, claro, a saudade é imensa, mas, ao mesmo tempo, a essência dela está conosco sempre. Ela deixou esse legado para nós, de poder dar continuidade, então é muito gratificante, porque ela era puro amor, pura bondade, solidariedade em poder ajudar as pessoas. E a Liga existe porque ela deixou essa sementinha plantada”, emociona-se, acrescentado que muitas pessoas procuravam sua mãe, sabendo que ela tratava de um câncer, como uma forma de buscar apoio e como conselheira, para dar força e, desse movimento, surgiu a Liga.
Trabalho voluntário que teve sequência presidido pela irmã de Renata e também sócia-fundadora da entidade, Dioneia Zorgi Salvador, em 2009. “No período, para conseguirmos angariar fundos, fazíamos vários eventos, como o Jantar da Liga – que acontece até hoje no salão paroquial – e o jantar Elas por Elas, que era no Clube Independente e, na época, reunia mais de 400 mulheres”, lembra Dioneia, explicando que os homens começaram a ficar curiosos com o que acontecia nesses encontros e, com o passar do tempo, o evento passou a ser aberto também a eles. 
Lembranças do período em que foi presidente da entidade e, antes disso, de quando sua mãe participou ativamente das ações da Liga, são histórias que jamais serão apagadas da memória da voluntária. “Desde o início, a minha mãe sempre participou de tudo. Quando a Renata montou a Liga, tinha que ter 70 mulheres com CPFs, então tivemos que ir à procura para conseguir fundar. E, pensando em como a gente ia ganhar fundos, na época, ela comentou com a Zanete Oldra para tentar fazer um show e começar a ganhar dinheiro. E aí surgiu a ideia dos shows, que acontecem até hoje”, relata a comerciante, acrescentando que a própria Teresinha se prontificou em protagonizar e organizar os eventos, mesmo estando doente – uma vez que descobriu o câncer de mama em 1997, fazendo o autoexame enquanto tomava banho. 
“Lembro da minha mãe se apresentando com a irmã dela, eram as Irmãs Galvão. Essa foi a primeira dupla que ela começou a interpretar. Elas faziam o show, decoravam músicas, se vestiam – como a gente faz hoje”, conta a voluntária, revelando que outras duplas eram contempladas, pois, ela queria inovar. “Dali surgiu o Milionário e José Rico e, nessa época, minha mãe, para decorar as músicas, no caminho enquanto ia fazer a quimioterapia em Caxias, ela ia no carro conosco e ficava escutando em fita cassete. Nas apresentações, ela tinha um blazer branco, botava todos os anéis e até, na última (no ano de 2000, quando faleceu) quis se apresentar. Mesmo  com um tampão no olho, porque já estava com um tumor no cérebro, ela subiu ao palco com a ajuda da minha irmã, e foi se apresentar. Ela usou óculos porque, na verdade, a dupla usa, aí ninguém percebeu. Essa foi a última apresentação dela, no Clube Independe”, lamenta, com lágrimas nos olhos. 
“Depois que ela faleceu, cada vez mais, queremos fazer as coisas. Não queremos que a Liga morra nunca, é o legado dela, a gente tem um amor, é a nossa mãe, a Liga é a mãe. Eu e a Renata estamos bem envolvidas, a Dani também sempre colabora, indo nos eventos, ajudando a vender as coisas, mas, como ela é um pouco mais tímida, acabou pegando outro legado da nossa mãe: ela adorava São Caetano. Então, minha irmã ficou com essa parte, ela cuida da Igreja, faz as festas coloniais lá”, destaca Dioneia sobre o envolvimento das três filhas com as paixões da mãe, entre elas o voluntariado e a religiosidade.
Outro registro que a comerciante guarda, com carinho, é de quando Teresinha fazia as quimioterapias e agradecia por conseguir comprar os remédios a serem administrados após as sessões, mas, sempre pensava nos que não tinham condições de adquirir, e esta foi outra motivação para o surgimento da Liga que, para as duas, é sinônimo de amor, amor de mãe. “Mesmo com a doença – também na situação anterior que adoeceu, em 1979 – ela não se entregava, a gente perguntava para ela: ‘como você está hoje?’, e ela respondia: ‘melhor que ontem’, então até o último minuto ela batalhou”, revela a voluntária, com um misto de orgulho e tristeza. 
“Ela deixou um legado que quem entra na Liga se apaixona, não tem como não se apaixonar. Os pacientes, quando encontramos com eles na rua, o carinho é tão grande porque, às vezes, eles vêm procurar não é nem pelo dinheiro e pela medicação, é o carinho e a palavra de conforto. Quando a pessoa fica doente, a família toda adoece, muitos têm que deixar de trabalhar para poder cuidar do familiar, então é uma renda a menos, e fica difícil. Às vezes, também, não tem tempo para conversar, não querem desabafar com o filho e o marido, então vem lá na salinha procurar um abraço”, esclarece, complementando que a entidade empresta perucas para quem precisar – feitas a partir da doação de cabelos – e já ofereceu alguns cursos de maquiagem e de formas de amarrar o turbante. Suportes fundamentais para as mulheres se sentirem melhores consigo mesmas, afinal, mulher é vaidosa e gosta de se sentir bonita, e essa necessidade é ainda mais urgente quando falamos da autoestima em pacientes oncológicas, que tem de conviver com a queda de cabelos e sobrancelhas, por exemplo. 
Por fim, Dioneia define o período que foi presidente da Liga como fundamental e sempre se emociona ao falar da história da entidade que, em 2022, comemora 25 anos de atuação: “Eu estou muito feliz. A Liga, para mim, é minha mãe e a Liga estando forte a gente fica forte. Eu quero que a entidade continue muitos e muitos anos, porque é fundamental para os pacientes que tem câncer e, ela se mantendo firme, é o legado da minha mãe e é minha mãe que está ali”, conclui, contendo o choro e agradecendo a todos os voluntários, entidades e empresas que abraçam a causa rosa.

Para as irmãs, Renata e Dioneia, trabalhar pela Liga é manter vivo o sonho da mãe. - Karine Bergozza
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