Prejuízos ainda são calculados em Flores da Cunha
Agricultores fazem levantamento após as madrugadas geladas e o granizo da última semana na Serra Gaúcha, fenômenos que aconteceram após um período atípico de calor no inverno, prejudicando a produção de frutas – principalmente a uva
Aos 64 anos de idade, o agricultor Gotardo Carraro garante nunca ter visto uma ocorrência de geada tão severa. Os 6 hectares da variedade Bordô que ele, na companhia da esposa Maria Giotti Carraro, 64 anos, cuida na comunidade de Nova Roma, no interior de Flores da Cunha, tiveram seus brotos queimados pelo rigoroso frio do fim de semana. O casal terminou a poda das videiras na última sexta-feira e foram surpreendidos de forma negativa já no dia seguinte, prevendo praticamente 100% de perda da produção. “Nunca vi um estrago como neste ano. Estávamos com uma produção muito bonita e já havíamos feito duas sessões de tratamento. Agora é rezar para que no ano que vem as parreiras brotem”, desabafa Carraro, que pretendia colher mais de 140 mil quilos de uva na próxima safra.
A realidade da família Carraro infelizmente ecoa em cerca de 90% das propriedades de Flores da Cunha. As perdas ainda são contabilizadas pelos agricultores, seguradoras e sindicatos. De acordo com o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR) de Flores da Cunha e Nova Pádua, Olir Schiavenin, os reais prejuízos dependem de uma série de fatores – por isso prefere não estimar um percentual. “Tudo depende do estágio da videira, do sistema de poda, da variedade, do vigor e da idade das parreiras. Uma possível brotação e recuperação da produção tem todos esses fatores como interferência”, explica Schiavenin.
Segundo o técnico agrícola do escritório da Emater de Flores da Cunha Jair Carlin, a principal variedade vitícola atingida foi a Niágara. Depois dela estão a Isabel e a Bordô, que estavam ‘embaladas’ pelas altas temperaturas registradas neste inverno e que incentivaram uma brotação antecipada. Carlin destaca que a recomendação nas áreas afetadas é buscar uma nova brotação das videiras. “O produtor pode cortar os galhos mais compridos e que foram queimados, com isso utilizar um adubo à base de nitrogênio para fazer com que a gema casqueira brote. Infelizmente, mesmo com essa segunda brotação, a produção será bem menor”, lamenta. Dar continuidade aos tratamentos programados para o vinhedo é outra recomendação, tendo como intuito garantir a sanidade e fortificação da parreira.
Seguro traz tranquilidade
Muita chuva: perda. Muito sol: perda. Granizo: perda. A agricultura sofre constantemente com as variações do clima, que interfere diretamente em todas as etapas de produção de qualquer cultura. É pensando nesta inconstante realidade que os seguros agrícolas vêm tendo cada vez mais adesão dos agricultores, que podem ter certa tranquilidade financeira em situações de sinistros como o que aconteceu com a geada do fim de semana. “O seguro ajuda exatamente nesses casos, é uma garantia de que o agricultor vai passar o ano com o mínimo de tranquilidade”, complementa Carlin. Para as famílias que pagam pelo serviço, a recomendação é entrar em contato imediatamente com a seguradora contratada e aguardar pela vistoria. “O problema é que na maioria dos casos o prejuízo não fica somente em uma safra, mas prejudica também a próxima, por isso o seguro deve ser feito sempre”, indica Schiavenin.
Agricultor Gotardo Carraro e a esposa Maria Giotti Carraro, da comunidade de Nova Roma, estimam perda de 100% na produção deste ano.
É graças ao seguro que o agricultor Gotardo Carraro consegue manter a calma diante das videiras totalmente danificadas pelo frio. “Graças a Deus contratamos o seguro há anos e eu recomendo que todos os produtores o façam. É uma maneira de se prevenir desses problemas”, complementa Carraro, que já perdeu outras safras com o frio e também com o granizo. “Ninguém prevê a natureza. Já cheguei a colher apenas 13 mil quilos de uva. Não podemos desanimar, enquanto tivermos saúde vamos olhar sempre para frente”, aposta o agricultor. De acordo com a Emater-RS/Ascar, o distrito de Mato Perso foi a região do município menos atingida pela geada.
Em Nova Pádua
Os produtores de Nova Pádua também sofreram com a geada dos dias 11 e 12 de setembro. De acordo com o agrônomo da Emater-RS/Ascar do município, Willian Heintze, a ocorrência da geada aconteceu de forma menos generalizada nas propriedades – algumas foram mais atingidas e outras com menos rigor. “A cultura que mais sofreu, como em outros municípios, foi a da uva. Outras frutíferas como o pêssego e a ameixa também foram prejudicadas, porém a real dimensão das perdas será vista de agora em diante, já que os danos são causados dentro das células e isso será visto no desenvolvimento da fruta”, explica.
Aspersão salvou a brotação na Linha 100
Diferente da maioria das propriedades vitícolas da região, a família de Roberto Molon, da Linha 100, interior de Flores da Cunha, não tem muitos prejuízos para contabilizar após a geada do último fim de semana. Por meio da aspersão, um sistema utilizado tanto para irrigação de vinhedos quanto para prevenir a geada, a brotação dos 4 hectares da variedade Bordô foi totalmente salva. “Como a geada é um frio seco e ocorre sempre com temperaturas negativas, ela faz as células murcharem e, pela falta de líquido, os brotos queimam e morrem. A aspersão molha a superfície, mantendo toda a parte vegetal – as folhas e os brotos, sempre a zero grau e sem perder a umidade”, explica Morgana Molon, agrônoma e filha de Roberto.
Morgana Molon/Divulgação
Sistema manteve as videiras molhadas durante a madrugada.
A aspersão aplica água durante toda a noite da geada e, ao se congelar, a água libera calor latente, reduzindo o resfriamento e mantendo a temperatura por volta de zero grau. A família utilizou a aspersão durante as madrugadas de sexta e sábado, ligando o sistema antes das temperaturas ficarem negativas e também observando a umidade do ar. Mais de 90% da produção foi salva. “Algumas partes das bordas do vinhedo, onde a aspersão não alcançou o suficiente, queimaram, mas não representa perdas significativas”, aponta Morgana.
Embora o sistema esteja instalado nos vinhedos há 30 anos, a agrônoma conta que há pelo menos uma década não era necessário utilizá-lo como antigeada. A ideia da aspersão surgiu no contato com profissionais da área de outros países que a utilizavam para salvar a produção do frio. “Inicialmente a aspersão precisava de mais água, hoje é apropriada para isso e consome menos. É utilizada também em épocas de seca, portanto, tem dupla serventia. O único requisito para o sistema é a disponibilidade de água”, complementa Morgana. O método vem sendo utilizado no Sul do Brasil para a proteção não somente de vinhedos, mas também de frutíferas de clima temperado, prevenindo as geadas tardias (de primavera). Leia mais sobre como tratar videiras prejudicadas pelas intempéries na página 22.
Chuvas afastam o frio da Serra
O mesmo fenômeno que levou para as alturas a média de temperaturas neste inverno será o responsável por dias chuvosos nas próximas semanas em todo o Rio Grande do Sul, especialmente na Serra. O fenômeno El Niño, que também foi o causador da chuvarada registrada em julho deste ano, deve retornar com semanas de intensa umidade e volumes acentuados de precipitação.
Dessa forma, o meteorologista do Centro Estadual de Meteorologia (Cemet-RS), Flávio Varone, afasta a possibilidade de novas geadas na Serra, ao menos neste período chuvoso. “Teremos bastante umidade nas próximas duas semanas e no início de outubro. O frio deve aparecer apenas no Sul do Estado. A tendência é que geadas não aconteçam mais. A tendência é muito mais de umidade do que de frio”, adianta Varone.
Práticas culturais podem evitar perdas
Os agricultores devem adotar uma série de práticas para evitar prejuízos ainda maiores quando acontecem estragos causados pelas intempéries, como geada ou granizo. Nos casos da viticultura e da fruticultura de clima temperado (pêssego e ameixa, entre outras), o procedimento específico depende do grau de danos provocados aos vinhedos e os pomares, diz o pesquisador em fitopatologia da Embrapa Uva e Vinho, Lucas Garrido.
De acordo com ele, nas situações de perdas altas, próximas de 100%, os produtores deverão efetuar uma poda de formação, igual à feita no inverno. A seguir, precisarão aplicar fungicidas de contato para proteção dos ferimentos nas plantas e cicatrização daqueles decorrentes do granizo. Também uma nova adubação é necessária para que a planta tenha nutrientes suficientes para a brotação e acúmulo de novas reservas, pensando-se na próxima safra.
Para os vinhedos e pomares que apresentam um nível menor de estragos, a recomendação, assinala Garrido, é a aplicação de fungicidas de contato para proteção dos ferimentos ocasionados nas plantas pelo granizo. Também as frutas danificadas devem receber uma ou duas pulverizações com fungicidas de contato para evitar que fungos causem o apodrecimento das mesmas, a partir dos ferimentos.
O pesquisador anota que, em ambos os casos (maior ou menor perda), é importante a manutenção de pulverizações com fungicidas para que as plantas possam manter as folhas e novas brotações com boa sanidade. “Sem a produção de novas brotações e folhas a videira estará mais sujeita a não entrar adequadamente em dormência no próximo inverno, o que poderá aumentar os problemas de morte de plantas por escurecimento da casca”, observa Garrido. Em caso de qualquer dúvida, os produtores deverão consultar os técnicos de extensão rural ou de vinícolas a que entregam sua produção ou são associados.
A realidade da família Carraro infelizmente ecoa em cerca de 90% das propriedades de Flores da Cunha. As perdas ainda são contabilizadas pelos agricultores, seguradoras e sindicatos. De acordo com o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR) de Flores da Cunha e Nova Pádua, Olir Schiavenin, os reais prejuízos dependem de uma série de fatores – por isso prefere não estimar um percentual. “Tudo depende do estágio da videira, do sistema de poda, da variedade, do vigor e da idade das parreiras. Uma possível brotação e recuperação da produção tem todos esses fatores como interferência”, explica Schiavenin.
Segundo o técnico agrícola do escritório da Emater de Flores da Cunha Jair Carlin, a principal variedade vitícola atingida foi a Niágara. Depois dela estão a Isabel e a Bordô, que estavam ‘embaladas’ pelas altas temperaturas registradas neste inverno e que incentivaram uma brotação antecipada. Carlin destaca que a recomendação nas áreas afetadas é buscar uma nova brotação das videiras. “O produtor pode cortar os galhos mais compridos e que foram queimados, com isso utilizar um adubo à base de nitrogênio para fazer com que a gema casqueira brote. Infelizmente, mesmo com essa segunda brotação, a produção será bem menor”, lamenta. Dar continuidade aos tratamentos programados para o vinhedo é outra recomendação, tendo como intuito garantir a sanidade e fortificação da parreira.
Seguro traz tranquilidade
Muita chuva: perda. Muito sol: perda. Granizo: perda. A agricultura sofre constantemente com as variações do clima, que interfere diretamente em todas as etapas de produção de qualquer cultura. É pensando nesta inconstante realidade que os seguros agrícolas vêm tendo cada vez mais adesão dos agricultores, que podem ter certa tranquilidade financeira em situações de sinistros como o que aconteceu com a geada do fim de semana. “O seguro ajuda exatamente nesses casos, é uma garantia de que o agricultor vai passar o ano com o mínimo de tranquilidade”, complementa Carlin. Para as famílias que pagam pelo serviço, a recomendação é entrar em contato imediatamente com a seguradora contratada e aguardar pela vistoria. “O problema é que na maioria dos casos o prejuízo não fica somente em uma safra, mas prejudica também a próxima, por isso o seguro deve ser feito sempre”, indica Schiavenin.
Agricultor Gotardo Carraro e a esposa Maria Giotti Carraro, da comunidade de Nova Roma, estimam perda de 100% na produção deste ano.
É graças ao seguro que o agricultor Gotardo Carraro consegue manter a calma diante das videiras totalmente danificadas pelo frio. “Graças a Deus contratamos o seguro há anos e eu recomendo que todos os produtores o façam. É uma maneira de se prevenir desses problemas”, complementa Carraro, que já perdeu outras safras com o frio e também com o granizo. “Ninguém prevê a natureza. Já cheguei a colher apenas 13 mil quilos de uva. Não podemos desanimar, enquanto tivermos saúde vamos olhar sempre para frente”, aposta o agricultor. De acordo com a Emater-RS/Ascar, o distrito de Mato Perso foi a região do município menos atingida pela geada.
Em Nova Pádua
Os produtores de Nova Pádua também sofreram com a geada dos dias 11 e 12 de setembro. De acordo com o agrônomo da Emater-RS/Ascar do município, Willian Heintze, a ocorrência da geada aconteceu de forma menos generalizada nas propriedades – algumas foram mais atingidas e outras com menos rigor. “A cultura que mais sofreu, como em outros municípios, foi a da uva. Outras frutíferas como o pêssego e a ameixa também foram prejudicadas, porém a real dimensão das perdas será vista de agora em diante, já que os danos são causados dentro das células e isso será visto no desenvolvimento da fruta”, explica.
Aspersão salvou a brotação na Linha 100
Diferente da maioria das propriedades vitícolas da região, a família de Roberto Molon, da Linha 100, interior de Flores da Cunha, não tem muitos prejuízos para contabilizar após a geada do último fim de semana. Por meio da aspersão, um sistema utilizado tanto para irrigação de vinhedos quanto para prevenir a geada, a brotação dos 4 hectares da variedade Bordô foi totalmente salva. “Como a geada é um frio seco e ocorre sempre com temperaturas negativas, ela faz as células murcharem e, pela falta de líquido, os brotos queimam e morrem. A aspersão molha a superfície, mantendo toda a parte vegetal – as folhas e os brotos, sempre a zero grau e sem perder a umidade”, explica Morgana Molon, agrônoma e filha de Roberto.
Morgana Molon/Divulgação
Sistema manteve as videiras molhadas durante a madrugada.
A aspersão aplica água durante toda a noite da geada e, ao se congelar, a água libera calor latente, reduzindo o resfriamento e mantendo a temperatura por volta de zero grau. A família utilizou a aspersão durante as madrugadas de sexta e sábado, ligando o sistema antes das temperaturas ficarem negativas e também observando a umidade do ar. Mais de 90% da produção foi salva. “Algumas partes das bordas do vinhedo, onde a aspersão não alcançou o suficiente, queimaram, mas não representa perdas significativas”, aponta Morgana.
Embora o sistema esteja instalado nos vinhedos há 30 anos, a agrônoma conta que há pelo menos uma década não era necessário utilizá-lo como antigeada. A ideia da aspersão surgiu no contato com profissionais da área de outros países que a utilizavam para salvar a produção do frio. “Inicialmente a aspersão precisava de mais água, hoje é apropriada para isso e consome menos. É utilizada também em épocas de seca, portanto, tem dupla serventia. O único requisito para o sistema é a disponibilidade de água”, complementa Morgana. O método vem sendo utilizado no Sul do Brasil para a proteção não somente de vinhedos, mas também de frutíferas de clima temperado, prevenindo as geadas tardias (de primavera). Leia mais sobre como tratar videiras prejudicadas pelas intempéries na página 22.
Chuvas afastam o frio da Serra
O mesmo fenômeno que levou para as alturas a média de temperaturas neste inverno será o responsável por dias chuvosos nas próximas semanas em todo o Rio Grande do Sul, especialmente na Serra. O fenômeno El Niño, que também foi o causador da chuvarada registrada em julho deste ano, deve retornar com semanas de intensa umidade e volumes acentuados de precipitação.
Dessa forma, o meteorologista do Centro Estadual de Meteorologia (Cemet-RS), Flávio Varone, afasta a possibilidade de novas geadas na Serra, ao menos neste período chuvoso. “Teremos bastante umidade nas próximas duas semanas e no início de outubro. O frio deve aparecer apenas no Sul do Estado. A tendência é que geadas não aconteçam mais. A tendência é muito mais de umidade do que de frio”, adianta Varone.
Práticas culturais podem evitar perdas
Os agricultores devem adotar uma série de práticas para evitar prejuízos ainda maiores quando acontecem estragos causados pelas intempéries, como geada ou granizo. Nos casos da viticultura e da fruticultura de clima temperado (pêssego e ameixa, entre outras), o procedimento específico depende do grau de danos provocados aos vinhedos e os pomares, diz o pesquisador em fitopatologia da Embrapa Uva e Vinho, Lucas Garrido.
De acordo com ele, nas situações de perdas altas, próximas de 100%, os produtores deverão efetuar uma poda de formação, igual à feita no inverno. A seguir, precisarão aplicar fungicidas de contato para proteção dos ferimentos nas plantas e cicatrização daqueles decorrentes do granizo. Também uma nova adubação é necessária para que a planta tenha nutrientes suficientes para a brotação e acúmulo de novas reservas, pensando-se na próxima safra.
Para os vinhedos e pomares que apresentam um nível menor de estragos, a recomendação, assinala Garrido, é a aplicação de fungicidas de contato para proteção dos ferimentos ocasionados nas plantas pelo granizo. Também as frutas danificadas devem receber uma ou duas pulverizações com fungicidas de contato para evitar que fungos causem o apodrecimento das mesmas, a partir dos ferimentos.
O pesquisador anota que, em ambos os casos (maior ou menor perda), é importante a manutenção de pulverizações com fungicidas para que as plantas possam manter as folhas e novas brotações com boa sanidade. “Sem a produção de novas brotações e folhas a videira estará mais sujeita a não entrar adequadamente em dormência no próximo inverno, o que poderá aumentar os problemas de morte de plantas por escurecimento da casca”, observa Garrido. Em caso de qualquer dúvida, os produtores deverão consultar os técnicos de extensão rural ou de vinícolas a que entregam sua produção ou são associados.
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