Geral

Polícia Federal investigará caso sobre trabalho escravo em Nova Pádua

Ocorrência registrada no interior do município foi encaminhada pela Polícia Civil de Flores da Cunha nesta semana, porém, PF diz que ainda não recebeu o processo

Foi encaminhado para a Delegacia da Polícia Federal (PF) de Caxias do Sul o caso das cerca de 20 pessoas, incluindo três menores, que foram encontradas no interior de Nova Pádua em situação semelhante a de trabalho escravo. Os indígenas estavam sem contrato de trabalho e com diversas irregularidades trabalhistas, entre elas alojamento impróprio e a presença de menores sem documentação ou supervisão de um responsável. Iniciado pelo Ministério Público (MP), Brigada Militar (BM) e Polícia Civil, o caso foi encaminhado nesta semana. Os envolvidos foram ouvidos na Delegacia de Polícia (DP) de Flores e liberados.

No dia 12, após denúncia do Conselho Tutelar de Nova Pádua, que relatou ao MP a presença de menores em serviços rurais no município, uma inspeção ocorreu no Travessão Paredes, onde foram encontrados trabalhadores. Num alojamento no Travessão Bonito foram verificadas irregularidades de higiene, além da falta de contrato de trabalho e a presença dos três menores de idade (de 14, 15 e 16 anos). Após identificação, o agenciador dos trabalhadores foi ouvido pela Polícia Civil e os menores foram levados para seus municípios de origem (Liberato Salzano, Nonoai e Engenho Velho).

A partir disso, o caso foi encaminhado pela Polícia Civil para a Polícia Federal, que deve verificar se na situação realmente aconteceram condições análogas a de trabalho escravo. O caso deve ser encaminhado também ao Ministério Público do Trabalho (MPT) para verificação trabalhista, assim como para o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).

De acordo com a titular da DP de Flores da Cunha, delegada Aline Martinelli, o inquérito será feito diretamente pela PF, sob o crime de redução à condição análoga de escravo. “Esse crime é de competência da Polícia Federal, até mesmo por envolver indígenas. Nós da Polícia Civil ouvimos o responsável que negou um trabalho escravo. Realmente as condições eram precárias e a cada semana eles trabalhavam para pessoas diferentes. Muitos paduenses contrataram esses trabalhadores”, diz a delegada. Ainda em depoimento ,o agenciador, que é indígena, disse que os trabalhadores estavam livres para ir embora quando quisessem.

Após as primeiras investigações e retirada dos menores de idade pela Polícia Civil, a PF trata o caso criminal a partir de agora. O MPT e MTE devem fazer a parte administrativa. “Quando são constatadas condições péssimas de trabalho, isso não necessariamente é trabalho escravo, mas infração administrativa. O trabalho de condição análoga de escravo tem que ter a privação da liberdade”, acrescenta Aline.

O promotor de Justiça de Flores da Cunha, Stéfano Lobato Kaltbach, explica que a função do MP também se encerrou com o encaminhamento dos menores de idade para suas cidades de origem. Segundo o promotor, os indígenas ainda estariam no interior de Nova Pádua. “Além dos três menores, um trabalhador maior de idade, que em depoimento afirmou que não podiam sair do local, deixou a propriedade. Os demais podem permanecer trabalhando. Cabe ao MPT e ao MTE averiguar se esse processo é regular ou não”, pondera Kaltbach.

De acordo com o departamento de comunicação da Superintendência da Polícia Federal de Porto Alegre, nenhum documento referente ao caso de Nova Pádua chegou à Delegacia da PF de Caxias do Sul até ontem, dia 18.

O que diz o Ministério do Trabalho e Emprego

O gerente regional do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) de Caxias do Sul, Vanius Corte, diz que aguarda o encaminhamento do caso de Nova Pádua para poder verificar a situação. O órgão tem como primeiro objetivo apurar como está a situação de trabalho. “Para nós, independente se é índio ou qualquer outra nacionalidade, é um trabalhador. Por isso, primeiro fizemos a verificação da situação. Se as condições físicas forem muito precárias e sem a existência de documentos como a carteira assinada, pode se caracterizar trabalho em condição análoga de escravo ou trabalho degradante”, explica Corte. Se assim foi caracterizado, o MTE faz um resgate desses trabalhadores. No caso de Nova Pádua, o MTE ainda não recebeu a ocorrência nem teve contato com o local.

Segundo Corte, após a retirada dos trabalhadores o empregador deve fazer assinatura da Carteira de Trabalho, com o pagamento de todos os direitos, inclusive a rescisão do contrato de trabalho, além de infrações pela situação e ainda é enquadrado na chamada ‘lista negra do trabalho escravo’. “Ou seja, as empresas incluídas nessa lista permanecem ali pelo período mínimo de dois anos e com isso têm várias limitações, como fazer empréstimos, contratar com o poder público e em alguns casos, de exportar produtos”, explica.

Quanto à documentação, Corte destaca que mesmo sem carteira assinada o contratante deve ter um registro do trabalhador. “Existem possibilidades de quem trabalha na agricultura de não assinar carteira, até porque muitas vezes o empregado chega para trabalhar e não tem o documento, mas o registro como empregado é feito. Assim como em uma empresa o empregado tem a carteira, o empregador tem o livro com registros dos empregados. Não existe a possibilidade de um contrato de trabalho que seja informal”, determina.

Período de contratações

No cultivo de diversas culturas é comum que agricultores busquem mão de obra complementar, principalmente na época da colheita – como inicia no setor vitícola nos próximos meses. Porém, contratar exige medidas importantes para garantir os direitos de ambas as partes, tanto do contratante quanto do safrista. Para isso o Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR) de Flores da Cunha e Nova Pádua disponibiliza informações, atendimentos e o modelo de contratos que asseguram um processo legal perante a lei. Dentre as principais orientações está a não contratação de menores de idade e o restante sempre com contrato assinado.

De acordo com o presidente do STR, Olir Schiavenin, a orientação é dada pela entidade há muito tempo, com leis e formas onde o agricultor pode contratar de forma legal. Para a safra da uva, o STR oferece um modelo de contrato previsto por lei que evita muitos problemas semelhantes aos denunciados em Nova Pádua. “É de extrema importância que o produtor tenha algum documento que concretize e legalize o trabalho, ou que tenha Carteira de Trabalho assinada. A lei existe e temos que cumprir, caso contrário, teremos as penalidades previstas na própria lei”, adianta Schiavenin. O STR atende das 7h45min às 11h45min e das 13h15min às 17h30min. Os telefones: (54) 3292.7500 (Flores) e (54) 3296.1710 (Nova Pádua).


Condições precárias foram constatadas no espaço chamado de ‘alojamento’. - Ministério Público de Flores da Cunha/Divulgação
Compartilhe esta notícia:

Outras Notícias:

0 Comentários

Deixe o Seu Comentário