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O venerável Frei Salvador

Corpus Christi e Frei Salvador tornaram Flores da Cunha o centro do turismo religioso

A rotina de Frei Salvador sempre foi marcada por orações e pelo trabalho na lavoura. Nasceu Hermínio Pinzetta no dia 27 de julho de 1911, na localidade de Evangelista, no município de Casca. 
Aos 32 anos, Pinzetta entrou para o Convento São Boaventura, de Marau. Em 1944 foi transferido para o Convento Sagrado Coração de Jesus, em Flores da Cunha. Como irmão leigo – religioso que não era obrigado a ter curso secundário e nem superior –, Frei Salvador realizava trabalhos de catequese e cuidava da horta, da cozinha e de lavanderia. Ele também auxiliava as missões e os ministros da Eucaristia.
Nunca foi do gosto de Frei Salvador exibir-se publicamente. Mas, em 1966, foi lhe solicitado a ocupar um cargo de destaque na procissão eucarística de Corpus Christi. Foi tão íntima sua ligação com a eucaristia que sua morte aconteceu na véspera da Procissão de Corpus Christi. 
1972. Um ar de festa movimentava a Praça da Bandeira, em frente à Igreja Matriz. Pelas ruas, pequenos grupos de formavam na preparação dos tapetes. Ao toque de mãos habilidosas, grandes porções de serragem colorida iam tomando forma, com desenhos e símbolos eucarísticos.  Inesperadamente, o ar festivo daquele entardecer do dia 31 de maio foi quebrado pelo dobrar dos sinos tocando afinados. Logo em seguida o anúncio do falecimento de Frei Salvador Pinzetta, ocorrido às 18 horas, no Hospital Nossa Senhora de Fátima.
“Podemos interpretar a coincidência de Frei Salvador morrer exatamente no dia da procissão de Corpus Christi como uma manifestação divina de amor de Cristo pelo seu servo e amigo. No dia em que Cristo deveria ser transportado pelas ruas da cidade, cedeu seu lugar a Frei Salvador, talvez como um ato de supremo amor a quem tanto amor lhe dedicou”, dizia uma reportagem do O Florense, de 28 de maio de 1997. 
Frei Salvador permaneceu em Flores da Cunha por 24 anos, até o dia 31 de maio de 1972, quando faleceu vítima de derrame cerebral, aos 61 anos de idade. 
Para Nelso Antoninho Giachelin, 61 anos, que quando criança conheceu Frei Salvador, lembrar dele o enche de memórias boas. “Conheci Frei Salvador quando criança. Eu e meus amigos jogávamos bolinhas de gude na rua onde ele passava para ir ao Eremitério. Muitas vezes nos convidava para seguir com ele conversando e rezando”, lembra Giachelin, que diz que ao chegar perto do morro onde estava Nossa Senhora de Fátima, mandava as crianças voltarem para ele ficar sozinho rezando. “Lembro que nós ficávamos escondidos para ver o que ele fazia”, diz. 
Outra memória de Giachelin é passar pelo convento, junto com sua mãe, para pegar mudas que o Frei Salvador generosamente distribuía. “Ele era muito humilde e simples, de uma bondade infinita, pouca fala. Viveu sempre em oração com muita fé”.
“Quando ele faleceu eu era adolescente, e como tinha vontade de estudar para ser padre, eu costumava ajudar na igreja. Quando veio a notícia de sua morte estava ajudando na confecção dos tapetes de Corpus Christi. Foi muito triste”, relembra Nelson, que também participou do velório de Frei Salvador. 
Giachelin conta que é um privilégio ter conhecido e convivido com Frei Salvador. “Fui atendido muitas vezes quando pedi sua intercessão  por mim e por amigos que estavam muito mal e hoje estão bem”.

Fama de Santo ainda vivo

Antes mesmo de sua morte todos já diziam: “Ele é mesmo um santo”.  No livro tombo do convento e da paróquia, bem como o livro de óbitos da Igreja Matriz, registraram a respeito de Frei Salvador afirmações como: “Todos o conheciam como o padre santo”, “Nele transparecia a santidade”, “Foi o homem de maior virtude que passou por aqui”. 
E, a partir desses relatos, foi dado encaminhamento ao processo de beatificação de Frei Salvador. 
“Como sabemos, Frei Salvador está sendo proposto para a Congregação dos Santos, como beato. Na tradição espiritual católica temos um grande número de santos e santas. Talvez, possamos nos perguntar aqui o que caracteriza um santo católico?”, pergunta Frei Sérgio Dal Moro, postulador do processo de beatificação de Frei Salvador. Conforme o Frei, todo santo tem duas características básica: é uma pessoa totalmente enamorada, envolvida, próxima de Deus, é uma pessoa toda de Deus, contemplativa; essa característica acima não o afasta da realidade humana, ao contrário, o impulsiona para servir a humanidade, principalmente, nos irmãos, nas pessoas mais pobres, sofredoras, doentes e marginalizadas. “Aliás, essa característica é o termômetro para verificar a autenticidade da primeira”, destaca o Frei, que acrescenta: “Nossos santos e santas são nossos modelos de vida cristã, de seguimento de Jesus e nossos intercessores. Enquanto caminhavam na terra, eram modelos; na glória, bem junto de Deus, são nossos intercessores”, declara. 
“Frei Salvador tem muita importância para todos nós, mas, principalmente para Flores da Cunha. Frei Salvador é gente nossa, de nossa terra, de nosso tempo. Ele viveu seu caminho de santificação aqui, é um “santo” daqui e não de longe. Para nós frades, é modelo; para todos os cristãos, estímulo para viver autenticamente a própria vocação e intercessor nas mais diversas situações de vida”, enaltece Frei Sérgio.    
Conforme Dal Moro, quem conheceu e conviveu com Frei Salvador não tem dúvidas que ele é um “santo”. “Mesmo os que não tiveram oportunidade de conhecê-lo pessoalmente, os testemunhos vivos nos deixam essa convicção”.  
Em 2022, comemoraremos o cinquentenário do falecimento de Frei Salvador e, com ele, poderemos festejar a beatificação. “Alguém poderia dizer: se para nós Frei Salvador é “santo” porque todo esse trabalho num processo de beatificação? De fato, esse processo é muito prolongado e trabalhoso. Muito tempo, trabalho, inclusive despesas financeiras. Mas por um simples razão: a Igreja leva muito a sério um processo de beatificação, não podemos enganar a fé do povo de Deus. Precisamos de bases sólidas para esse reconhecimento”, destaca Frei Sérgio. 

O Eremitério
Conforme os relatos, Frei Salvador saía do convento todos os dias para rezar em meio ao mato – hoje local onde abriga o Eremitério Frei Salvador. Devoto de Nossa Senhora de Fátima, ele se ajoelhava e ficava horas rezando. 
Com seu ritual diário, muitas pessoas o seguiam e, aos poucos, construíram o local sagrado para Frei Salvador. Conforme Lígia Pedron Vanelli, voluntária do Eremitério Frei Salvador, após sua morte e o início da Romaria, tudo ganhou proporção. “As pessoas começaram a relatar milagres e graças alcançadas por causa do Frei Salvador. As Romarias a cada ano vêm aumentando o número de fiéis, e nelas distribuímos mudas de hortaliças e pães. Hortaliças porque ele também oferecia para as pessoas; e pães, pois o Frei Salvador foi o primeiro ministro extraordinário da Eucaristia da Diocese, ele não era um Frei que rezava missas, ele era um serviçal, foi dado para ele quase que um poder de levar a eucaristia para os doentes nas casas. Eu me lembro muito bem dele passando pelas casas”, diz Lígia.
“O Frei Salvador era uma pessoa que não tinha estudo, não tinha cultura, não tinha bens materiais, ele não era uma pessoa que tinha uma oratória muito boa, quase não falava, não era uma pessoa bonita esteticamente, mas tinha simplicidade, aquele carinho, aquele olhar sincero, aquela palavra meiga, ele tinha tudo o que hoje falta nas pessoas. E é isso que as pessoas vêm buscar aqui (no Eremitério)”, relata a voluntária que informa que a cada dia o Frei Salvador está alcançando mais campo, mais credibilidade com as pessoas. E isso tende a aumentar na medida em que o processo de beatificação avance. 

O processo de beatificação
1977 – cinco anos após sua morte iniciou o processo de beatificação de Frei Salvador Pinzetta. 
2007 – após anos parado, sem um coordenador, o então ministro provincial dos Capuchinhos do Rio Grande do Sul, Frei Álvaro Morés, indicou Dom Frei Ângelo Domingos Salvador como postulador local, a fim de retomar o processo jurídico
13 de abril de 2011 – aberto oficialmente o Processo de Beatificação na Diocese de Caxias do Sul, com a instauração do Tribunal Eclesiástico Diocesano.
26 de outubro de 2012 – Os autos originais do inquérito diocesano, chamado Positio, em duas cópias autênticas, foram entregues a Roma, na Congregação das Causas dos Santos, pelo então postulador local, Dom Frei Ângelo Domingos Salvador, no dia 26 de outubro de 2012. 
2018 – por questões de saúde, Dom Frei Ângelo deixou de ser o postulador local do processo. Assumiu, por alguns meses a função,  Frei Celso Bordignon. No final de 2018 ficou responsável de dar continuidade aos trâmites Frei Sérgio Marcello Dal Moro.
5 de junho de 2018 – o Congresso dos Teólogos da Congregação da Causa dos Santos se reuniu para discutir a Positio do Servo de Deus Salvador Pinzetta e o julgamento foi unanimemente positivo: 9/9 votos.
14 de maio de 2019 – foi promulgado pelo Vaticano o Decreto que declarou ‘Venerável’ o Frei Salvador Pinzetta. 
27 de julho de 2020 – aberto o processo em nível diocesano para a a comprovação de um milagre – pela Igreja e pela Ciência – por intercessão de Frei Salvador Pinzetta.
Outubro de 2020 – encerramento da etapa.
Novembro de 2020 – validação do processo pelo Vaticano.

 - Arquivo O Florense
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