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Não se brinca com o coração

A campanha Setembro Vermelho conscientiza sobre as doenças cardiovasculares, que ainda são as principais causas de mortes no mundo

O coração é tido como o órgão mais importante, pois no peito se carrega as pessoas, lugares e memórias que se ama. Para celebrá-lo, nasceu o Dia Mundial do Coração, comemorado todos os anos no dia 29 de setembro. Mas, a importância do músculo é tanta que não coube num dia só. Assim, surgiu o Setembro Vermelho, com o intuito de promover a conscientização sobre as doenças cardiovasculares. 
Para o florense Arnaldo Novello, 64 anos, a descoberta de um problema cardíaco quase veio tarde demais. Ele estava jogando futsal com os amigos quando começou a sentir uma forte dor no peito. Novello interrompeu os exercícios, voltou para casa, mas a dor não passou. No dia seguinte, procurou um médico cardiologista e cerca de uma semana depois já estava na mesa de cirurgia, submetido a uma revascularização miocárdica. Ele era 20 anos mais jovem. “Hoje eu vivo bem, mas quando eu fui informado do procedimento, fiquei assustado. A gente nunca sabe se volta”, conta Novello. 
E os números são mesmo alarmantes. No Brasil, segundo dados da Sociedade Brasileira de Cardiologia, quase 300 mil pessoas já foram vítimas de doenças cardiovasculares e da circulação apenas em 2020. Para se ter uma ideia, isso representa o dobro do número de mortes por câncer de todos os tipos e 2,3 vezes mais que as derivadas de acidentes. O Rio Grande do Sul é o estado com a segunda maior taxa de mortalidade por doenças cardiovasculares no país, atrás apenas do Rio de Janeiro – em solo gaúcho, são estimados 221,4 óbitos por 100 mil habitantes ao ano.

Como prevenir  

De acordo com o cardiologista, Dr. Ezequiel Toscan, cada vez mais a área da cardiologia vem se dedicando à prevenção. Se uma vez os médicos procuravam tratar de doenças já estabelecidas, hoje presta-se muita atenção aos fatores de risco, como a hipertensão, a diabetes, o sedentarismo e o tabagismo, que aumentam a probabilidade de desenvolver problemas cardíacos.  
“Nós procuramos fazer o diagnóstico mais precoce possível, antes da instalação da doença, identificando condições que possam aumentar o risco, inclusive genéticas. A prevenção minimiza muito as consequências, como a invalidez e a incapacidade para o trabalho”, adverte Toscan.  
Como prevenção, é importante manter uma dieta equilibrada, evitando o sal e o açúcar em excesso e os altos índices de colesterol. A saúde do coração também se fortalece com a prática de exercícios físicos regulares, a diminuição do estresse e, claro, a moderação no uso do álcool e o antitabagismo. Conforme o Hospital Sírio-Libanês, essas medidas evitam cerca de 80% dos problemas cardíacos.  
O Dr. Ezequiel Toscan chama a atenção para a gravidade desse tipo de doença que, mesmo com a pandemia, continua sendo a maior causa de mortes no mundo. “Não é preciso chegar na idade adulta para se prevenir, é melhor começar na idade escolar. Fazer exercício é tão importante quanto escovar os dentes. Comer bem é tão importante quanto lavar as mãos”, afirma o médico.  

De vida nova

Setembro foi agitado para o florense Ademir Ignácio Rigo, 54 anos. Mireto, como é conhecido em São Gotardo, abriu várias vezes o coração para falar de um tema que lhe salvou a vida: a doação de órgãos. Promovido pela campanha Setembro Verde, o ato solidário dá ao próximo uma segunda chance de viver, que Rigo recebeu em 2016, quando um transplante lhe presenteou com um novo coração. 
Não é a primeira vez que Ademir compartilha sua história com O Florense. Um ano após a cirurgia, ele ainda se acostumava à nova rotina e agradecia a benção que lhe fora dada. Hoje, completamente adaptado ao órgão, ele ainda se lembra de agradecer. 
Isso porque Mireto sofria com problemas reumáticos desde a infância. Aos 21, descobriu um sopro no coração que evoluiu para uma arritmia severa. Sete anos depois, veio a primeira das quatro cirurgias cardíacas pelas quais passou para tentar resolver os problemas. Em 2015, a situação ficou gravíssima e Ademir foi informado de que a única saída era o transplante. “Eu parei de trabalhar, porque não podia fazer esforço. Caminhar me cansava bastante, eu tinha dificuldades para dormir”, conta Rigo. 
A espera por um novo órgão durou um ano e oito meses. Por duas vezes, ele teve de lidar com expectativas frustradas – na segunda, já estava a caminho de Porto Alegre, quando o médico lhe informou que o coração não era o ideal para o seu tamanho e tipo sanguíneo. Mas o primeiro dia de dezembro de 2016 reservou um final mais feliz. Ademir assistia TV, quando a esposa, Edilce, chegou do trabalho com a tão aguardada notícia. “Ela e meu irmão estavam nervosos, quase desmaiando. Eu que tive de ampará-los”, relembra. 
A cirurgia foi feita no Hospital São Francisco, da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, e durou cerca de 12 horas. “Foi angustiante, o dia não passava. Se despedir é muito assustador”, conta a filha Vitória, na época com 16 anos, lembrando que só viu o pai novamente depois do Natal, quando ele voltou para a casa.  
No regresso, Ademir viveu sua primeira quarentena: ficou meses de máscara e completamente isolado no andar de cima da casa. Hoje, também toma precauções, por estar no grupo de risco. “Eu recebi uma benção e dou bastante valor a isso. Tento me cuidar da melhor maneira para o sacrifício do outro valer a pena”, afirma Rigo.  
Antes da pandemia, o coração de Mireto batia mais forte nos campeonatos de bocha que participava, dos quais saiu duas vezes campeão. Além disso, fazia caminhadas de até 6km, praticava vôlei e outros serviços menores, sem grandes exageros. “A maior alegria é estar vivo. É como se eu tivesse acertado na loteria. Mas o prêmio que eu recebi é maior, não tem preço”, diz Mireto, ressaltando a companhia da esposa, que é sua enfermeira desde antes do casamento.
De vida nova, seu desejo é que cada vez mais pessoas possam receber a mesma benção. “Estou vivo graças a alguém que sabia da importância da doação. Quem quiser ajudar, deve conversar com a família. Essa conscientização é importante. Doar órgãos é doar vidas”, alerta Rigo, cuja família já está presente nessa grande rede de solidariedade e amor ao próximo.

Ademir Ignácio Rigo e filha Vitória Fachim Rigo comemoram diariamente a vida. - Pedro Henrique dos Santos
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