Irregularidades na contratação de trabalhadores traz à tona debate sobre criação de cooperativas
Iniciativa almeja encontrar uma solução benéfica para as futuras safras
A cadeia produtiva da uva e do vinho possui etapas bem definidas, condicionadas às estações do ano e aos efeitos que o clima exerce sobre a natureza. Por isso a mão de obra para as atividades da ‘colônia’ oscila em extremos quanto ao número de pessoas necessárias.
Parece óbvio, mas é por isso que a safra da uva exige a dedicação de um número de pessoas bastante superior às outras etapas. É preciso colher no período certo para que o produto mantenha as suas melhores características. Isso implica no preço pelo qual a uva é comercializada, na qualidade do vinho ou suco elaborado, na satisfação do consumidor e das empresas vinícolas.
De maneira geral, as cidades da Serra Gaúcha não dispõem de mão de obra suficiente, nem se buscar em outros segmentos, para atuar nos serviços que envolvem a colheita da uva.
Para saber como esse assunto é administrado em Flores da Cunha, O Florense conversou com o presidente do STR, Ricardo Pagno. Segundo ele, os agricultores de nosso município e de Nova Pádua também contratam empresas terceirizadas para a colheita e as pessoas vêm de todas as regiões do país, inclusive de fora: “Sabemos que época de safra é normal que todos busquem mão de obra fora da família, temos nordestinos, indígenas, argentinos, mas eu acho que o agricultor trata as pessoas como se fossem da família, elas acabam almoçando junto com o agricultor. Os valores que eles recebem para fazer esse trabalho também são consideráveis e os casos em que acontece essa questão de trabalho escravo não são por parte dos agricultores, mas sim por algumas dessas empreiteiras”, revela Pagno, acrescentando que neste ano o Ministério Público do Trabalho (MPT) realizou ações fiscalizatórias em Flores da Cunha e Nova Pádua e não encontrou irregularidades nas condições de trabalho dos empregados. No entanto, houve problemas referentes à documentação de pessoas que não estavam com a Carteira de Trabalho assinada, o que preocupa o presidente da entidade e os agricultores, afinal, em situações de contratação por curto período, de 20 a 30 dias, o processo de assinar a CTPS acaba sendo bastante oneroso em proporção ao tempo. Por outro lado: “Se passar de 120 dias de contratação de mão de obra (cumulativo durante o ano) o contratante perde a condição de se aposentar como agricultor. Da mesma forma acontece com outros agricultores que vem para cá trabalhar e que muitas vezes não querem assinar a carteira, pois acabam perdendo a condição de segurado especial”, explica Pagno, frisando que o STR sempre orienta para a contratação de empreiteiras que possuam funcionários regularizados e está buscando alternativas para processos mais simplificados na contratação de mão de obra para a agricultura familiar.
Tentativas de solucionar o problema já foram apresentadas antes pelo advogado Sérgio Augustin, quando juiz de Direito da Comarca de Flores da Cunha e Nova Pádua. Juntamente com o STR, Augustin buscou alternativas para atender as necessidades de contratação temporária da agricultura familiar “Uma opção legal foi a sugestão de constituição de uma cooperativa de trabalhadores. Teoricamente, a cooperativa seria uma solução possível e viável. Infelizmente o formato não foi incentivado pelos dois lados – nem pelos agricultores e sequer pelos trabalhadores. Posso dar exemplos de sucesso, inclusive próximos. Hoje advogo, como forma de contribuição social, para uma Cooperativa de Recicladores de Caxias do Sul. Ela funciona perfeitamente, fazendo um ótimo trabalho socioeconômico e para um grande número de trabalhadores carentes, que passaram a ter uma vida digna”, esclarece Augustin.
Neste ano, antes mesmo da divulgação da notícia sobre trabalho análogo à escravidão em Bento Gonçalves, o advogado revela que o presidente do STR entrou em contato com ele e que, logo após, acionou o Delegado do Trabalho de Caxias do Sul, Vanius Corte, com o intuito de reacender o debate que busca viabilizar a criação de cooperativas de prestação de serviços. Tal iniciativa conta com o apoio da Federação das Cooperativas Vinícolas do RS, que tem como Diretor-Executivo Hélio Marchioro e é presidida por Valderiz Possa, e almeja encontrar uma solução para as futuras safras, benéfica para Sindicatos, Ministério do Trabalho, Secretaria da Agricultura, cooperativas e trabalhadores.
“Existem muitos intermediários de mão de obra que trabalham ilegalmente e são, na verdade, aliciadores de pessoas que são enganadas ou aceitam o trabalho ilegal. Os contratantes que não exigem documentos que demonstrem a legalidade acabam sendo responsáveis solidários com o aliciador. Em outras palavras, há uma infração administrativa, há também crime, e a responsabilidade (administrativa, penal e civil) é, repito, solidária entre o contratante e a suposta empresa terceirizada”, alerta o advogado. Afinal, exigir e saber quem está sendo contratado é responsabilidade do contratante.
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