Geral

Flores não bastam

Dia Internacional da Mulher é celebrado nesta quarta-feira, dia 8. Conheça a história de Denelise Fontana de Almeida que é apaixonada pela sua profissão

A ideia de celebrar o Dia Internacional da Mulher surgiu depois que o Partido Socialista da América organizou, em 1909, uma jornada de manifestação pela igualdade de direitos civis e em favor do voto feminino. Mas, somente em 1975, o dia 8 de março foi instituído pela Organização das Nações Unidas (ONU) e, a partir daí, a data passou a ser comemorada em mais de 100 países. 
De lá para cá diversos avanços foram conquistados, mas, mesmo assim, ainda há muito a ser feito. Prova disso são as pesquisas de igualdade salarial que comprovam que, em média, as mulheres recebem salários 20% menores do que os homens, conforme um estudo publicado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), em 2022. 
Também é preciso galgar um longo caminho no que tange à política, afinal, a pesquisa Mulheres na Política, realizada em 2022 pelo Instituto DataSenado, com candidatos e candidatas às eleições de 2018 e 2020, mostrou que, somando as duas eleições, apenas 33% dos candidatos eram mulheres, revelando uma diferença proporcional, já que a população brasileira é formada por 52% de mulheres com mais de 18 anos.
Outro dado, mais alarmante, diz respeito aos crimes contra a vida da mulher.  De acordo com informações do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, no primeiro semestre de 2022 foram registrados 699 feminicídios, uma média de quatro mulheres mortas por dia. Em meio a todas essas informações, cabe o questionamento: realmente temos razões para comemorar o 8 de março?

“Não tem que ter medo, nem ligar para o que os outros dizem, tem que ‘botar a cara’ e fazer”
Sabe aquele ditado que diz ‘lugar de mulher é onde ela quiser’? Para a florense Denelise Fontana de Almeida, de 31 anos, ele vai muito além de uma expressão corriqueira. A motorista de caminhão na empresa Escavar Terraplenagem revela que sua rotina é marcada por extremos: de um lado o preconceito por estar em uma profissão taxada como masculina, de outro o reconhecimento das pessoas pela coragem em estar nessa área, considerada um tanto quanto ‘bruta’ para mulheres. 
A paixão de Deni (como é chamada pelos mais próximos) pela estrada começou ainda na infância, vendo o pai trabalhar na empresa de transportes que ele mesmo havia fundado. Ela conta que suas primeiras experiências como motorista foram dirigindo vans e micro-ônibus e foi só em um segundo momento que passou para os caminhões. “Meu marido é motorista de caminhão também, aí ele me incentivou, comecei a viajar com ele, ir para a estrada. Depois eu peguei um caminhão para trabalhar, um 3/4 baú, e fui para a estrada. Só que quando se tem criança pequena e os dois estão fora de casa é ruim, então eu precisei achar alguma coisa que ficasse mais perto”, conta a florense, que também é mãe de quatro crianças de 11, 9, 7 e 4 anos.
Foi buscando novas oportunidades que surgiu a possibilidade de Denelise trabalhar na Escavar Terraplenagem. Por meio de um colega que, na época, atuava na empresa, ela foi informada que o local estava com uma vaga em aberto e pretendia contratar uma mulher. “Eu fui fazer o teste. Lembro que eles estavam limpando um açude no Travessão Accioli, em Nova Pádua. Eu já dirigia caminhão, tudo certo, só que é totalmente diferente pegar um caminhão e sair na BR, na estrada, botar a marcha e ir. Claro que perigo tem nos dois, só que trabalhar com a terraplenagem é bem mais complexo, é um negócio que exige muito cuidado, é uma atenção redobrada do tipo ‘aqui eu posso ir, ali não posso, aqui o caminhão vai afundar, aqui tem muito barro, aqui vou atolar’. Então era tudo diferente”, relata a motorista, acrescentando que, na ocasião, chegou a pensar o que tinha ido fazer no local e cogitou desistir. 
“Eram só homens, e eu no meio deles. Todo mundo parou para olhar o que ia dar e, ainda mais com o meu tamanho, eu sou pequena. Subi no caminhão, aí meu patrão me deu as dicas de como funcionava e ele foi comigo as primeiras viagens e me disse que o principal é ter calma, porque imprevistos acontecem. Depois eu fui sozinha. Nosso trabalho é bruto, não tem nada de delicadeza, por isso tem que ter calma na hora de dirigir e noção do que está carregando, do peso, o que pode o que não pode fazer, porque tem lugares apertados que não dá para manobrar direito”, lembra a motorista, que foi contratada e atua na função há quase um ano. 
Hoje, Deni recebe inúmeros elogios por seu trabalho, mas revela que no início foi um pouco complicado, pois quando chegava nas obras as pessoas perguntavam quem era o motorista e assim que ela respondia era questionada ou observada o tempo todo, para ver se realmente conseguiria executar tais tarefas. “Tem um pouco de preconceito, do tipo ‘como assim uma mulher?’. Eles limitam muito e, sim, temos limitações, eu não vou dizer que tenho uma força que um homem tem, por exemplo, mas os guris me ajudaram até eu pegar bem o jeito”, conta a florense. 
E se engana quem pensa que essa discriminação é apenas por parte dos homens, a motorista conta que muitas mulheres chegaram a questioná-la sobre como conseguiu a vaga: “Eu dizia que não pode ter medo de se sujar. É terra de cima a baixo, barro, pó, poeira. Tem que ter competência, só fazer bem o que faz, gostar do que faz. Tem preconceito, mas tem muito elogio também. Eu sou a única mulher aqui na empresa, talvez a única de Flores a trabalhar com isso”, destaca Deni, que mesmo trabalhando em um serviço bruto não deixa a vaidade de lado. 
A motorista é apaixonada por seu trabalho e confessa que até tentou atuar em outras áreas, como no comércio, em escritórios, mas não se sentia realizada: “É muito bom, é uma coisa que eu gosto de fazer. Estou na rua, estou solta, é uma coisa que me dá liberdade, me dá prazer”, orgulha-se.
Para as mulheres que se identificaram com a história de Deni e também querem se aventurar com o volante, ela deixa um conselho: “Tem que ir, não tem que ter medo, nem ligar para o que os outros dizem, tem que ‘botar a cara’ e fazer. Teve umas meninas que vieram fazer testes e tu vê que elas querem, que gostam, então não é porque não deu certo uma vez ou duas, vai tentando, se é o que gosta tem que ir atrás e não ‘dar bola’ para o que os outros falam, se é o teu sonho tem que ir”, finaliza a motorista, emocionada. 

Denelise Fontana de Almeida completará um ano de empresa em abril.  - Karine Bergozza
Compartilhe esta notícia:

Outras Notícias:

0 Comentários

Deixe o Seu Comentário