Falta de efetivo da BM atinge situação crítica
Envio de policiais para outras regiões do Estado reduz em mais de 40% o número de servidores e compromete a segurança no município
A confusão ocorrida no clube de Otávio Rocha na madrugada do último domingo, associada a dois sequestros relâmpagos, um deles com agressões e tentativa de estupro contra uma jovem de 21 anos (leia na página 14) expôs a fragilidade em que se encontra a corporação da Brigada Militar de Flores da Cunha. No momento das três ocorrências, praticamente simultâneas, dois raptos e uma briga no clube Otávio Rocha, apenas dois policiais realizavam o policiamento no município. A demora no atendimento das ocorrências pela falta de policiais causou um mal-estar na comunidade, que há pouco tempo também está sem o único brigadiano que realizava o policiamento comunitário no 3º Distrito.
Conforme o comandante da 2ª Cia PM, capitão Juliano André Amaral, que há dois meses se encontra em Porto Alegre realizando cursos, a redução no efetivo neste período se deve pelo fato de que alguns policiais foram deslocados, por solicitação do comando estadual, para atender outras localidades, onde, nesta época, há maior concentração de turistas, como o Litoral Norte e a região de Gramado. De acordo com Amaral, do efetivo de 24 servidores lotados em Flores da Cunha, incluindo o oficial, cinco foram destinados para a Operação Golfinho, um está atuando no Natal Luz e outro foi destinado para trabalhar no Presídio de Apanhador. Se contarmos que uma policial se encontra de licença saúde e outros dois estão de férias, a redução no efetivo chega a 41%.
Segundo o capitão Jorge Ricardo Custodio, chefe de recursos humanos do Comando Regional de Policiamento Ostensivo da Serra (CRPO/Serra), a cedência de policiais para outras localidades onde há maior fluxo de turistas “é momentânea”. De acordo com ele, a Serra enviou 144 militares para o litoral. Segundo o oficial, enquanto não se formarem os novos policiais que estão realizando curso em Farroupilha e não retornarem os cedidos para o litoral a comunidade “tem que lidar com a deficiência”.
Incentivos para atrair a vinda de mais policiais
Com um efetivo de quatro servidores a menos de quando assumiu pela primeira vez o comando da Brigada Militar (BM) da cidade, há cinco anos, o capitão Juliano Amaral acredita que se houver mais incentivo o policiamento de Flores da Cunha seria bem maior. Segundo o oficial, cinco policiais estariam dispostos a vir de imediato e outros cinco que estão sendo formados em Farroupilha devem começar já nos primeiros meses de 2010. “Isso se nós tivéssemos a garantia do auxilio para eles”.
No entanto, o presidente do Consepro, Adilson de Oliveira, disse que apesar das dificuldades que a entidade atravessa, se houver policiais interessados em atuar em Flores da Cunha, o auxilio moradia será pago. “Por mim pode vir mais. Deixo de pagar a manutenção das viaturas e pago o aluguel dos brigadianos”, afirma. Conforme Oliveira, o repasse da prefeitura e a verba do Judiciário não tem sido suficientes para manter as despesas em dia. “Temos um brigadiano por viatura e sozinho não se faz nada. Ou colocamos gente para trabalhar ou vamos ficar sem segurança. O que aconteceu sábado já é um indício”, aponta.
Para o prefeito Ernani Heberle, a segurança pública é atribuição do Estado, e, além disso, a prefeitura florense já repassou este ano ao Consepro para custear a manutenção de viaturas, compra de equipamentos e auxilio alugueis, cerca de R$ 95 mil. “Duvido que outras cidades tenham dado todo esse valor”, destaca Heberle, acrescentando que irá convocar uma audiência pública sobre o assunto com o objetivo de discutir onde podem ser buscados mais recursos. Por outro lado, o presidente da Câmara de Vereadores, Felipe Alexandre Salvador, pretende sugerir ao Executivo Municipal para que destine a sobra dos recursos do orçamento da Casa, cerca de R$ 100 mil, ao Consepro, para serem aplicados na BM e Corpo de Bombeiros.
Policiamento comunitário
Outro assunto que ronda a área de segurança no município, e que causou desconforto em duas grandes comunidades florenses, é a desativação do policiamento comunitário, instalado em São Gotardo e Otávio Rocha há poucos meses. Depois de terem se mobilizado para ter viaturas e policiais nestas duas localidades, a exemplo de Mato Perso, aos poucos os moradores do 3º Distrito e de São Gotardo, localidade onde reside o prefeito Ernani Heberle, perderam o que haviam conquistado.
Segundo o sub-prefeito de Otávio Rocha, Luiz Bernardi, a frequente troca de comando na BM nos últimos dois anos foi um dos fatores que contribuíram para a redução no efetivo e a consequente desativação do policiamento comunitário. “Mesmo assim vinham de vez em quando”, lembra. Bernardi desta, ainda, que conversou com o presidente do Consepro, Adilson de Oliveira, para que ao invés de pagar aluguel na cidade policiais utilizem duas casas que estão disponíveis sem custo algum no 3º Distrito.
Já o vereador Moacir Ascari (Fera), sócio-proprietário de um posto de combustível em São Gotardo, denunciou na Câmara de Vereadores a saída do único policial da localidade, cedido para atuar no litoral. De acordo com o vereador, ele mesmo ofereceu uma sala junto ao posto, livre de qualquer despesa, mas nem por isso foi possível manter o servidor. Conforme o prefeito Ernani Heberle, “a comunidade se mobilizou, conseguiu viatura, alugaram casa e agora tiraram a policia de lá”. “Na verdade o governo do estado tem muita responsabilidade nisso, e nós não podemos assumir isso sozinhos”, garantiu o prefeito.
Destaques
Eu estou há dois meses em Porto Alegre fazendo cursos. Já consegui mais de sete policiais de outros locais do Estado com perfil para irem trabalhar na nossa região, atraídos pelos benefícios, pela qualidade de vida que nós temos aí. Só que eu estou travado. Por quê? Porque o presidente do Consepro me diz: não traz porque eu não vou te pagar.
Eu não posso me comprometer em levar um brigadiano para morar em Flores da Cunha se daqui a pouco eu vou estar mentindo que ele vai por um auxílio e eu não consigo pagar esse auxílio...Tanto é que neste mês, até agora, não pagaram o aluguel.
Minha política de trabalho é convencer as forças vivas do município que nós temos que ter um recurso para atrair o policial. Se não acontecer isso tem a segunda opção: o estado mandar. Mas aí não sou eu que vou dizer para o Estado que ele tem que mandar... e pelo que eu vejo não tem força política aí, porque por força política nunca foi ninguém para Flores da Cunha.
Na semana que vem vou entrar com tudo... na rádio, no jornal, com o prefeito, vereadores, seja quem for. Vou dizer assim: nós vamos continuar a fazer a nossa parte, com dois, com três, com quatro ou com vinte... o ideal seria trabalhar com vinte policiais, mas se a comunidade não vai nos ajudar e não quer daí deixamos a Brigada administrar. Daí nós vamos ver quando ela vai mandar efetivo para nós...
Juliano André Amaral, Capitão da BM local
Estamos encontrando dificuldade em conseguir dinheiro da prefeitura para pagar os aluguéis. O prefeito está colocando que não é de responsabilidade dele pagar aluguel para brigadiano. Ele diz que o Estado tem quem bancar esse tipo de coisa...
Pode-se ver que o Consepro está sendo mantido hoje mais pelo Ministério Público do que pela própria prefeitura. A prefeitura nos mandou R$ 80 mil, mas só com a Brigada eu gastei R$ 103 mil e com a Polícia Civil mais R$ 33,5 mil. Só de aluguel eu gastei R$ 53 mil, em manutenção de viatura mais R$ 21 mil. O dinheiro que está vindo da Prefeitura está sendo investido exclusivamente para os aluguéis e para manutenção das viaturas.
O poder público precisa sentir que tem que ajudar. A situação está quase impossível, porque hoje estamos pagando os alugueis em dia, em alguns momentos tive que segurar porque não havia recebido o dinheiro. E isso tem trazido problemas para os brigadianos.
Por mim pode vir mais (brigadianos). Deixo de pagar as viaturas e pago os brigadianos. Temos um por viatura e sozinho não se faz nada. Ou colocamos gente para trabalhar ou vamos ficar sem segurança. O que aconteceu sábado (em Otávio Rocha) já é um indício.
Daqui a pouco não haverá mais brigadiano em Flores e vamos depender de Caxias, porque eles estão indo embora. Estou tentando pagar em dia o aluguel, independente se a prefeitura paga ou não paga, mas também preciso me preocupar com a prestação de contas da prefeitura. Esse mês está em dia.
Com os R$ 15 mil que restam eu consigo pagar mais uns três aluguéis, exagerando. Só que não existe nenhum projeto para o ano que vem e o prefeito já sinalizou que no próximo ano irá repassar só R$ 50 mil.
Manda vir mais cinco, não podemos ficar sem segurança. Se vier depois pagamos com o dinheiro da Justiça. Vamos ter que colocar na mesa do prefeito.
Adilson de Oliveira, presidente do Consepro
A responsabilidade pela segurança é do Estado. Nós, junto com o Consepro e comunidade, temos que viabilizar algum outro suporte complementar, mas não tem que ser determinante para que se determinem as políticas de segurança.
Nós repassamos neste ano 95 mil reis para o Consepro. A média histórica é 40, 50 mil reais por ano. Tem que ser feito uma grande discussão com a comunidade. Tem que envolver as entidades, trazer o comandante regional.
O Consepro tem que ir atrás de dinheiro, tem que trabalhar, a exemplo de Farroupilha. O modo como está sendo conduzido não sei não... Tem que haver mais mobilização. Não é o município que tem que repassar. Não é o município. O Estado tem que pagar mais.
A segurança é um problema dos 27 mil habitantes de Flores. Vamos convocar uma audiência pública sobre o assunto, discutir onde podemos buscar mais dinheiro. Temos que ver as alternativas. Se o Consepro não convocar, a prefeitura convoca uma reunião. Mas, repito: não é a prefeitura que vai assumir uma responsabilidade do Estado.
Ernani Heberle, prefeito
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