Evolução enológica foi decisiva na Safra 2021
A brotação uniforme nos vinhedos e poucas chuvas no período de floração contribuíram para uma safra de grande volume
O Brasil vitivinícola amadureceu. Nos últimos 20 anos, a cadeia produtiva da uva e do vinho passou por uma transformação histórica, mostrando ao mundo que com muito estudo e investimento é possível driblar condições climáticas extremas. O Brasil é um continente de solos, climas, terroirs e neste universo, engenheiros agrônomos e enólogos, se debruçam numa jornada incessante para melhor compreender cada microclima, podendo extrair o melhor de cada vinhedo. São 26 regiões produtoras em 10 estados brasileiros, cada uma com suas particularidades. Mesmo assim, de forma geral, podemos dizer que a Safra 2021, no Brasil, colheu uvas sãs, no ponto ideal de maturação para cada tipo de vinho a ser elaborado. Ou seja, foi uma vindima de qualidade e também de grande volume.
O resultado é reflexo deste conjunto de ações que combinam conhecimento, sensibilidade, tecnologia e natureza. “As últimas safras estão sendo brindadas com vinhos e espumantes diferenciados, com reconhecimento internacional. Aprendemos com o tempo, evoluímos junto com ele. Este ano não foi diferente. O mercado pode aguardar por rótulos com grandes atributos”, garante o presidente da Associação Brasileira de Enologia (ABE), enólogo André De Gasperin. A brotação uniforme nos vinhedos e poucas chuvas no período de floração contribuíram para uma safra de grande volume. Já a qualidade contou com a expertise dos técnicos que fizeram um bom manejo nos vinhedos, permitindo que a colheita acontecesse no tempo certo.
O diretor Técnico em Enologia da ABE, enólogo Vagner Marchi, chama a atenção para a heterogeneidade da Safra 2021, muito maior que a do ano passado. “Dependendo da região e da variedade, a qualidade se diferencia. Equilibrar tudo isso é um desafio. E é aí que entra o trabalho de manejo do viticultor, aliado às particularidades de cada vinhedos e à expertise do enólogo”. Para o ex-presidente da ABE, enólogo Daniel Salvador, esta safra se resume aos avanços em viticultura com a evolução enológica. “Hoje temos uma estrutura invejável, conhecimento, fizemos ensaios permanentes, aprendemos a respeitar e a entender a vinha. Tudo isso impactou nas uvas e, consequentemente, nos vinhos com resultados espetaculares”, ressalta.
Sinal de bons espumantes
O conselheiro da ABE, enólogo Carlos Abarzúa, relata que o inverno de 2020 teve precipitação pluviométrica acima do normal, não impactando o ciclo da videira em dormência. As horas de frio se mantiveram dentro do normal (400 horas abaixo de 7,5ºC), com maior concentração em julho, sendo satisfatório para a plena superação da dormência e para garantir uma brotação uniforme das variedades Chardonnay e Pinot Noir, ideais para espumantes. Foram registradas muitas geadas neste período. Algumas no final do inverno e início de brotação da variedade Chardonnay, sendo necessário a intervenção humana com práticas como uso de calor, aquecimento dos vinhedos com fogões, uso de aminoácidos protetivos.
Segundo Abarzúa, já a primavera de 2020 foi caraterizada por precipitações pluviais abaixo da média histórica para o trimestre. Foram 124mm bem distribuídos. A umidade foi ideal para garantir um bom start do ciclo de brotação da videira. Em outubro, foram apenas 54mm e em novembro 42mm, o que garantiu um florescimento pleno e uma excelente frutificação. A temperatura média foi acima de média histórica na primavera-verão, porém com grande amplitude térmica diária, com dias quentes e noites frias. Por isso, o ciclo não foi antecipado, o que favoreceu a qualidade enológica das uvas precoces. “Podemos dizer que com uma primavera seca tivemos espetacular florescimento e pegamento do fruto, o que garantiu boa produtividade e qualidade dos vinhedos”, explica.
De forma geral, os enólogos destacam a excelente qualidade das uvas utilizadas na elaboração dos vinhos brancos e bases para espumante. Além da boa sanidade e da concentração de açúcares, essas uvas também apresentaram uma acidez natural que garantirá o frescor desse tipo de produto. O testemunho é do vice-presidente da ABE, enólogo Ricardo Morari. Segundo ele, no caso dos tintos, os rótulos de maior volume terão vinhos jovens, frutados e leves. Já os que nasceram da seleção e do intenso manejo nos vinhedos, da concentração de açúcares e maturação fenólica, passando por maceração com casca, resultarão em vinhos com maior tempo de guarda. Em ambos os casos, a sanidade das uvas se fez presente.
Outro aspecto importante a ser considerado é que a estabilidade climática a partir da metade de fevereiro permitiu prolongar a vindima, o que foi importante para atingir essa maior maturação nas tintas. O enólogo Bruno Motter, diretor Técnico em Viticultura da ABE, acredita cada vez mais que cabe aos enólogos ‘sair da cantina’ e ir aos vinhedos, acompanhando de perto cada etapa da formação da matéria prima. “Não podemos parar de buscar novas técnicas e variedades de uvas, formas de manejo, tudo para minimizar a oscilação das safras. Assim, faremos grandes vinhos todos os anos”, destaca.
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