Educar hoje para não reprimir amanhã
Esse é o principal objetivo da Escola Municipal Cívico-Militar Tancredo de Almeida Neves, a primeira a aderir esse modelo na Serra Gaúcha
O ano de 2022 está sendo marcado pela retomada das aulas presenciais nas instituições da rede municipal e estadual de ensino, no entanto, para os alunos florenses da Escola Municipal Cívico-Militar Tancredo de Almeida Neves, no bairro União, também será um período de muitas novidades. É que desde o dia 21 de fevereiro foram incorporados ao time de professores, funcionários, diretores e 290 estudantes, do 1º ao 9º ano, dois monitores para iniciar, de forma efetiva, essas atividades. Para a proposta foram designados o tenente Ferreira e o sargento Herton, ambos da Brigada Militar.
“O sucesso da escola cívico-militar depende do engajamento de todos. Quando falo em todos, me refiro também à comunidade, à escola, aos alunos, aos professores, à equipe diretiva e à sociedade como um todo. Nós temos diversas atividades onde o monitor, fora da sala de aula, trabalha as questões voltadas ao respeito, a organização, a autoestima e a liderança, porque se entende que a partir do momento em que se muda ou reforça comportamentos que já existem em casa, nós conseguimos formar cidadãos melhores e ter uma sociedade melhor”, explica o secretário municipal de Educação, Cultura e Desporto, Itamar Brusamarello, ao mesmo tempo em que revela que Flores da Cunha foi a primeira cidade a aderir esse modelo na Serra Gaúcha, juntamente com o projeto da Secretaria da Educação do Estado (Seduc RS).
Em relação à demora para iniciar as atividades na instituição – que já havia recebido monitores no fim de 2020 – Brusamarello esclarece que ela se deve à pandemia, com a interrupção das aulas presenciais e ao processo seletivo feito pelo estado para posterior realização do curso que possibilita a atuação dos monitores junto aos colégios. “Teve um momento em que vieram os monitores para conhecer a escola, para ter uma experiência, mas não tivemos, naquele cenário, uma experiência direta com os que passaram por processo seletivo, outros fizeram cursos e agora estão aptos a exercer a função de monitor. Entendemos que além do curso e do processo seletivo que ele fez, ele traz toda uma bagagem, uma experiência do militar, porque, na verdade, os nossos monitores são reservistas da Brigada Militar”, argumenta Brusamarello, e enfatiza que, se o programa tiver uma boa adesão e o resultado for positivo, a ideia é expandí-lo.
Pelo que depender da diretora da escola Tancredo de Almeida Neves, Ana Paula Zamboni Weber, a iniciativa tem tudo para dar certo: “Nós estamos, há duas semanas, iniciando esse trabalho que são as rotinas que fazem parte da proposta cívico-militar, objetivando a formação do cidadão, relações humanas, direitos e deveres. A maior contribuição dessa rotina é na formação atitudinal dos alunos. Aprender a conversar, respeitar horários, ter responsabilidade, aprender a lidar com situações conflitivas sem fazer uso da força ou da agressão, é isso que estamos almejando”.
De acordo com a diretora, que ocupa o cargo há dois anos, o que diferencia, basicamente, essa metodologia educacional da tradicional, uma vez que os monitores não interferem no planejamento pedagógico dentro da sala de aula, são as rotinas. “Essa atuação dos monitores é evidenciada na chegada e na acolhida dos alunos, é essa a maior mudança, porque eles estão em filas, e ali é o momento de combinações para se dirigirem às salas de aula. Todos os horários são monitorados e esse trânsito dos alunos, de um local para outro, é que estamos insistindo para que seja feito de uma forma organizada”, destaca e acrescenta que, pensando nisso, os monitores também acompanharão os recreios.
Ana Paula menciona ainda que a implementação desse modelo é muito importante dentro da realidade da instituição, sendo um diferencial na formação e motivação do aluno e, justamente por isso, os pais estão apostando muito nesse formato e a expectativa das famílias e da comunidade é muito grande. “Nós começamos essa semana, mas a intenção é de se tornar algo muito mais rico, principalmente desenvolver lideranças e colocar o aluno como protagonista. Os lugares e os os fluxos também vão ser mais sinalizados, vamos ter espaços de convivência que vão ser implementados, com locais para ler, desenvolvendo toda essa convivência harmoniosa”, enfatiza a diretora.
“É um desafio muito grande, é muito trabalho, e um momento de privilégio também, porque nós podemos estar ali apresentando uma proposta que vem enriquecer o processo educacional, e que dá certo. Não podemos parar de trabalhar e ter um planejamento, ter esse projeto claro para realmente pensar nas melhores ações para chegar nesse objetivo e na missão de todas as escolas que é formar, sim, cidadãos que tenham uma bagagem de conhecimentos, de atitudes, de valores, que é a formação integral. Não basta nós termos uma rotina organizada, é preciso que a escola seja um ambiente em que o aluno queira ir, que ele possa perceber nele todas as suas potencialidades e, desenvolver a capacidade de liderança”, conclui Ana Paula, com otimismo.
“Hoje nós estamos na ponta onde tudo se inicia”
Qual é, exatamente, a função desenvolvida pelos monitores em uma escola cívico-militar? De acordo com o sargento Herton, da Brigada Militar, que foi designado para a atividade juntamente com o tenente Ferreira, o monitor trabalha as regras básicas que devemos ter para viver em comunidade: “Desde os primórdios, a sociedade se organizou através de regramentos, estamos aí para agregar valores atitudinais e cívicos que, de alguma forma, se perderam. Educação, disciplina e regramentos são a base de tudo, justamente para que na sala de aula eles também tenham atitudes boas, que essas crianças, daqui em diante, também consigam ter uma maior atenção e, em consequência, melhorar o seu aprendizado para que convivam, no futuro, em sociedade”, revela o sargento Herton, que é natural de Três Passos e veio ao município para trabalhar junto à nova proposta.
Herton também explica que, para que as escolas possam participar desse programa, elas precisam atender um público estudantil em situação de vulnerabilidade social, uma vez que o foco do trabalho está em oferecer oportunidades para as crianças. “No decorrer do programa vamos adaptando, criando, justamente para que não se caia em uma rotina, vamos evoluindo. A prática do ato cívico, que estamos iniciando e é gradativa, vai se desenvolver semanalmente, na manhã na entrada da primeira turma – que são os anos finais, com hasteamento da bandeira – e, após o meio dia, na entrada do turno da tarde, novamente será entonado – pode ser o hino Nacional, o hino à Bandeira, do Rio Grande do Sul, do município, isso é indiferente”, destaca o sargento, sobre algumas das atividades desenvolvidas.
Outro ponto positivo evidenciado por ele é encontrar um grupo unido e coeso em prol do mesmo objetivo: “É um trabalho conjunto até porque como é tudo novo, como é novo para essas crianças, é novo para nós, porque o nosso trabalho de 30 anos é totalmente diferente, nós estávamos em uma ponta e hoje nós estamos na ponta onde tudo se inicia, no desenvolvimento do ser humano, para ele viver em sociedade. Então hoje nós estamos agregando valores a essas crianças, tanto educacionais como de ser humano”, enfatiza Herton, que atuou por muitos anos em penitenciárias e complementa lembrando que essa é uma experiência nova, mas, muito gratificante, por poder trabalhar o início da evolução das pessoas.
“O maior desafio é trazer valores para que tenhamos uma sociedade melhor, mais crítica positivamente. Hoje, essas crianças que ainda não estão formadas no seu emocional, que são psicologicamente imaturas, é nelas que está o nosso maior desafio: prepará-las para que vivam em uma sociedade mais organizada”, conclui o sargento, ao mesmo tempo em que propõe uma reflexão sobre a importância de educar, hoje, para não ter a necessidade de reprimir, amanhã.
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