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Dúvidas rondam a reforma do ensino médio

Mudanças que devem ser implantadas após 2018 dividem opiniões e multiplicam incertezas nas escolas locais. Confira o que pensam os diretores das escolas de Flores da Cunha e Nova Pádua

Flexibilização curricular, ampliação da carga horária, formação técnica dentro da grade do ensino médio e uma política de indução da escola em tempo integral. Essas são algumas das principais mudanças previstas na Lei do Novo Ensino Médio, sancionada no dia 16 de fevereiro pelo presidente da República, Michel Temer. A medida, aprovada no Senado por 43 votos a favor e 13 contrários, gera dúvidas por todo o país, inclusive em Flores da Cunha e Nova Pádua, onde três escolas têm ensino médio e atendem a mais de 1,1 mil estudantes. Para os diretores dessas instituições, muitas são as preocupações quanto às novas medidas, como as estruturas físicas e a vinda de profissionais não licenciados para as salas de aula. O novo modelo depende ainda da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que está em elaboração e deve ser homologada em 2017.

Com texto apresentado em setembro passado pelo governo federal, a medida que reformula o ensino médio gerou enorme repercussão, inclusive com a ocupação de estudantes em escolas públicas. O novo currículo será norteado pela BNCC, obrigatória e comum a todas as escolas (da educação infantil ao ensino médio). Esta Base estabelecerá 60% da carga horária, e o restante do tempo será́ composto por itinerários formativos nas áreas de conhecimento ou de atuação profissional, estes preenchidos de acordo com a opção dos alunos – linguagens e suas tecnologias; Matemática e suas tecnologias; Ciências da Natureza e suas tecnologias; Ciências Humanas e Sociais aplicadas; e formação técnica e profissional.

Atualmente, o currículo do ensino médio é composto por 13 disciplinas obrigatórias. Além de manter a obrigatoriedade dos estudos e práticas de Filosofia, Sociologia, Educação Física e Artes, Língua Portuguesa e Matemática são disciplinas obrigatórias nos três anos de ensino médio independente da área de aprofundamento que o estudante escolher. O ensino de Língua Inglesa também se torna obrigatório desde o 6º ano do ensino fundamental. Para os alunos que optarem pela formação técnica, é permitido que profissionais com notório saber possam ministrar aulas exclusivamente em disciplinas dos cursos técnicos e profissionalizantes.

Maior carga horária

Com a reforma do ensino médio, a intenção é que progressivamente o modelo de ensino migre para o tempo integral. Atualmente, os alunos têm carga horária obrigatória de 800 horas anuais, ou seja, quatro horas por dia. Em um período de cinco anos as escolas devem ter carga de 1.000 horas anuais, o que corresponde a cinco horas por dia. A meta final é chegar a 1.400 horas por ano, quando então os alunos estariam em regime integral cursando sete horas diárias.

Para ser colocado em prática, o novo modelo depende ainda da BNCC, que será obrigatória e irá nortear os currículos os colégios de ensino médio. O documento deve ser encaminhado ao Conselho Nacional de Educação, que terá de avaliá-lo para depois ser homologado pelo Ministério da Educação. Só depois disso o novo ensino médio poderá ser aplicado, seguindo um cronograma com as principais alterações, ou seja, não deve ser colocado em prática até 2018. De acordo com o governo, o objetivo é adequar o modelo do ensino às reais necessidades dos alunos, dando a eles o protagonismo em sua vida escolar.

 

Opiniões

Vitório Dal Cero, diretor da Escola Estadual São Rafael: “Esse assunto ainda é muito novo e é até difícil ter uma opinião formada. Estou aguardando a aprovação da BNCC e acredito que a partir disso terei uma ideia mais clara de qual será a intenção do governo. Consultando aos alunos, existe uma demanda neste sentido, pois se formos levar em conta disciplinas como Química e Física, por exemplo, que são as que mais reprovam, lá no ensino superior não são aproveitadas dependendo da área escolhida por eles. Porém, o que acredito ser temeroso é a opção de escolha de disciplinas, principalmente as matérias que levam o aluno a pensar, a ter senso crítico. Sabemos que o que motivou essa mudança é a evasão escolar, e também as avaliações externas onde o Brasil tem baixo índice comparado a outros países. É difícil dizer se a mudança será positiva. Tudo depende muito da dedicação do aluno e sabemos que a educação pública no Brasil atravessa uma crise que também é levada pela má valorização dos profissionais, escolas sem estrutura, o que resulta na qualidade negativa da educação. Espero que essas mudanças, já que foram aprovadas e vão se concretizar, sejam positivas e venham para melhorar o cenário. Que o jovem que concluir o ensino médio saia mais preparado para o mercado de trabalho e para a vida.”

Patrícia Paula Pontalti, diretora da Escola Estadual Frei Caneca: “Estou muito preocupada com essa reforma, até por não ter muitas informações consistentes sobre ela e da mesma forma os alunos. Pelo menos 60% da carga horária serão ocupadas por conteúdos obrigatórios que estão na BNCC. Os outros 40% é o que me preocupa. Neste tempo os alunos poderão escolher o que eles vão querer fazer, por exemplo, o estudante que optar no curso superior por Jornalismo vai utilizar este tempo para estudar apenas a área de linguagem. O problema é que temos alunos com 17 anos de idade saindo do ensino médio e que não têm a mais vaga ideia de que profissão quer seguir. Minha preocupação é essa, qual vai ser o fomento que eles vão encontrar no ensino superior para suprir a falta desses conteúdos que ficaram para trás? Outra preocupação é a presença do profissional de notório saber. Entendemos que esta reforma valoriza a escola técnica, e não temos nada contra este ensino, porém, os professores que atuam nas escolas têm licenciatura e mesmo assim encontram dificuldades para lidar com os adolescentes que estão em uma fase conflitante. Daqui a pouco esses professores vão perder postos, por exemplo, um técnico em contabilidade que vai ocupar o lugar de um professor de Matemática. Esse profissional vai ter didática para lidar com adolescentes? Além disso, a estrutura da escola e o espaço físico para um turno integral também me preocupa.”

Benedita Galiotto Baroni, diretora da Escola Estadual Luiz Gelain de Nova Pádua: “Acredito que o novo ensino médio possui em sua reformulação aspectos positivos e negativos, uma vez que a carga horária será ampliada para 1.400 horas e o aluno poderá estudar assuntos de seu interesse, entretanto, as escolas não dispõem de espaço físico para completar a carga horária. Algumas áreas do conhecimento ficarão sem serem ministradas por não terem mais obrigatoriedade, bem como os profissionais que atuam com esses alunos não precisarão ser licenciados, basta terem notório saber na área do conhecimento. De que forma estimularemos nossos alunos a cursar licenciaturas? Quem irá contratar e avaliar o saber desses profissionais que estarão ingressando nas escolas? De que forma atuarão com os alunos sem terem no mínimo um prévio conhecimento pedagógico? Os adolescentes, nessa etapa da vida, já têm condições de decidir o que é melhor para ser estudado? Como exemplo podemos citar uma turma de 35 alunos na qual cada aluno em particular possui uma preferência: de que forma conseguiremos atender a todos? No geral, a reforma do ensino médio é necessária e bem-vinda e como proposta tem potencial para excelentes resultados devido a sua flexibilidade a longo prazo, porém, o sucesso depende de espaço físico adequado, recursos humanos bem preparados e valorizados financeiramente, além de ouvir a opinião de todos os envolvidos no processo e nas mudanças que se querem fomentar.”

Em Flores da Cunha e Nova Pádua são mais de 1,1 mil alunos que hoje frequentam o ensino médio. - Camila Baggio/O Florense
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