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Cultivando as raízes

Florense Silvio Garibaldi revive memórias ao contar a história do Armazém Vindima e sua relação de fé com a Paróquia Nossa Senhora de Lourdes

Fé, amor, dedicação, carinho e simplicidade, estas são apenas algumas das características que descrevem o florense Silvio Garibaldi, de 41 anos. Muitos o conhecem pelo Armazém Vindima, o ‘shopping’ de Flores da Cunha, onde é possível encontrar, como o próprio nome diz, ‘de tudo um pouco’. O endereço nostálgico proporciona uma verdadeira viagem de volta ao passado, nos fazendo recordar histórias e memórias ao exibir em suas prateleiras itens que, com o tempo, acabaram ficando, de certa forma ‘esquecidos’, mas que, quando precisamos comprar, sabemos exatamente onde buscar.  
O empreendimento, localizado na Rua Júlio de Castilhos, 2206, no Centro da cidade, foi adquirido em 1997 pelo pai, Roque Garibaldi (in memoriam), e hoje é comandado por Silvio Garibaldi juntamente com a irmã, Ivanete Garibaldi, de 50 anos, e a mãe, Nair Coloda Garibaldi, de 77 anos.
Além do comércio, o florense também é conhecido por muitos pelo seu exemplo de fé e dedicação à Paróquia Nossa Senhora de Lourdes, colaborando com diversas frentes. Conheça a história inspiradora de Silvio Garibaldi.

O Florense: Como surgiu a oportunidade de trabalhar com o comércio?
Silvio Garibaldi: Aqui (onde hoje está o Armazém Vindima) começou com o irmão da minha bisavó, depois passou para outras pessoas, como a Gema Pagno, os Schiavenin e depois teve um armazém que se chamava ‘Armazém Vindima’ que pertencia a outro proprietário, eles eram em três sócios e venderam essa sociedade para construir o prédio. Como essa sociedade se desfez e meu pai, que era caminhoneiro, deixou a profissão, nessa época nós adquirimos o negócio, em 17 de maio de 1997, já com o nome Armazém Vindima. Ele queria que a família trabalhasse junto e achou uma oportunidade nesse local.
 
OF: Sempre trabalhou nesta área? De onde vem o interesse? 
Garibaldi: Comecei a trabalhar no Jornal O Florense, eu entregava jornal quando tinha uns 10 anos e fiquei uns três, quatro anos trabalhando nisso. Depois fui para uma granja e também trabalhei em uma confecção, que era na parte do comércio, eu vendia e ajudava. Além disso, depois do trabalho, vinha aqui ajudar no armazém, em 2000 comecei todo o dia. Sempre gostei, quando era pequeno eu e meus primos brincávamos de armazém, comércio, um vendia detergente, isso, aquilo. Antigamente nós comprávamos fardos de açúcar, sal, entre outros e colocávamos na garagem em uma prateleira e, com as minhas primas, a gente brincava de vender, tinha os dinheiros antigos, os Cruzados, os Cruzeiros; e quando o pai comprou o estabelecimento vi a oportunidade de trabalhar aqui. 

OF: Quais detalhes lembra do início? 
Garibaldi: Quando a gente assumiu, em 1997, vendíamos roupas, maisena, café, fumo, sardinha em salmoura, cera (que vendíamos por peso, era uma lata grande com cera vermelha ou amarela e o pessoal comprava por gramas). O café a gente não moía na hora, já comprávamos pronto e vendíamos assim; a sardinha em salmoura, que vinha em latas maiores, a gente vendia por peso, com o tempo elas começaram a ficar com a embalagem um pouquinho menor para o pessoal levar para casa porque não podia mais vender avulsa; a maisena também não podia mais vender assim, nem o café e as tripas (elas vinham dentro de um saco, em molhos, agora não, vem em um potinho, de uma forma mais higiênica e organizada). No Armazém tinha as mesinhas para as pessoas jogarem cartas; era a mercearia, que é o mercadinho; o barzinho; e as mesinhas com cadeiras para o pessoal sentar. Lembro também que, no início, a gente não usava calculadora, era tudo feito no papel, tinha bastante rascunho e fazíamos as contas a mão, e era assim ‘tudo no automático’. A balança tinha que calcular os pesos, ela ficava em cima do balcão com uma bacia, a gente colocava o produto, via o kg e calculava a mão, mas foi só uns quatro anos assim, depois começamos a usar a calculadora. Tinha também outra maquininha, mas a gente usava apenas quando eram compras maiores, coisas práticas fazíamos a mão. No início também tinha uma madeira com um ferro, que quando precisava pegar uma panela lá no alto a gente colocava o gancho e puxava para baixo, nem precisava de escada.

OF: O que mais vendiam naquela época? E hoje?
Garibaldi: Vendíamos muito café, queijo, fumo em corda, tripa – naquela época e agora também – condimentos para fazer salames, inclusive nós temos a pimenta que a gente moe na hora, até os dias de hoje. A gente já vendeu muitas panelas, agora menos, vendíamos bastante doces, medicamentos, arrolhas, breu para fazer sabão de casa, não o de álcool. Hoje não tem uma coisa que a gente vende mais, é um pouco de tudo. 

OF: Quais itens antigos ainda são comercializados? Como é a procura?
Garibaldi: Fechos e linhas de costura ainda tem procura, só que antes tinha umas seis, sete gavetas cheias, carretéis, agulhas de máquina e de mão, fumo em corda, pimenta avulsa, ‘budei’ (tripas). Uma coisa que muita gente vem procurar são as cadeiras antigas, aquelas de palha, mas não fabricam mais. E como tem essas lojas mais específicas a gente acaba deixando de lado porque vai custar mais caro para nós do que para eles já que eles vão comprar direto e nós de um intermediário. No fim de semana, por exemplo, o pessoal procura material elétrico, torneiras, resistência de chuveiro, se tem esses itens sai porque está tudo fechado, então, às vezes, essas coisas temos porque o pessoal precisa e vem aqui, lembram um pouco do antigo, ‘ah vou lá porque talvez tenha cadeira, tenha palha, tenha isso, tenha aquilo’.
 
OF: O que esse reconhecimento significa para vocês?
Garibaldi: É gratificante para nós, e quando não tem o que eles pedem, ficamos tristes, porque às vezes acontece, mas isso é sinal de que ainda tem uma memória antiga, uma referência antiga dentro da cidade, eu penso assim. Se chega aqui, pede e tem, a gente fica muito feliz, agora, quando não tem, a gente fica meio constrangido até porque eles identificam que vão achar tudo aqui, e quando não acham a gente se frustra.

OF: Como é manter um modelo de comércio ‘antigo’ em meio a tantas modernidades?
Garibaldi: Às vezes é difícil, percebemos que perdemos bastante, não está como uma vez que tinha um grande fluxo de pessoas, de vendas, acabamos perdendo bastante até com toda essa tecnologia, não vou dizer que não, mas a gente persiste, a gente sempre diz ‘vamos mais um pouquinho’ porque é uma coisa que não queremos nos desfazer, é algo que vem de dentro e queremos manter as tradições. Tem meses que está bom, outros que está bem lá embaixo, então a gente está sempre se mantendo porque tem um mês que alavanca e dois que não, mas se perdeu bastante, está sendo mais difícil para trabalhar.

OF: Hoje, qual é o diferencial que oferece aos clientes?
Garibaldi: O atendimento e o acompanhamento. Às vezes a pessoa pede ‘eu quero um biscoito’, e não vai buscar, então minha irmã vai lá e pega, tem ainda os mais antigos que vem e querem que a gente vá na prateleira com eles para ajudar e eles gostam de conversar um pouquinho, dessa coisa mais humana, que não é como ir em um mercado maior. Aqui tem mais diálogo, o pessoal pede ‘tem papel higiênico?’, o produto está lá, mas às vezes temos que ir buscar ou então acompanhar o cliente para mostrar onde está. Além disso, digo que aqui é como se fosse uma rodoviária, vem o pessoal do interior e eles vão no mercado comprar as coisas que não tem aqui e, para não ficarem na rua carregados, eles deixam as coisas no armazém e aproveitam e fazem uma comprinha, pegam tudo e vão para casa. Aqui também é um ponto de encontro deles, eles param para fazer lanchinho, a gente faz um sanduíche mais caseiro que eles comem e tomam um copo de vinho. Nós também gostamos muito de falar em dialeto quando vem o pessoal que conhece mais, e os mais velhos falam bastante em dialeto aqui.
 

OF: Que conselho daria para quem deseja abrir seu próprio empreendimento?
Garibaldi: Muita calma, muita paciência, pensar duas vezes, colocar o pé no chão em primeiro lugar, acho mais difícil agora do que uma vez. Eu vejo que a cabeça dos jovens de agora não tem medo, muitos dão certo, muitos se focam em algo, ‘eu vou abrir um negócio se der certou ou não’. Já eu sou assim, tem que ter os pés no chão, acho que fomos acostumados com os nossos pais a começar devagar, aos pouquinhos, então hoje dar um conselho em relação ao negócio, se for em relação a nossa cabeça: com os pés no chão, se for com a cabeça deles: se tem um sonho vai com calma, mas siga adiante, eu acho que a gente tem que seguir o que a gente sonha.

OF: Durante a sua caminhada, a fé e a oração sempre estiveram presentes em sua vida. Quais foram suas contribuições para a religião? 
Garibaldi: Fui Catequista, Ministro da Eucaristia e Ministro da Esperança. Antes de ser catequista, desde os 11 anos, participei do grupo jovens, também tive ligação com o grupo de liturgia, sempre estive envolvido com a paróquia. Hoje, além de Ministro da Esperança, sou zelador de quadra, coordenador de zelador de quadra, ajudo no Grupo de Oração da Renovação Carismática Católica, faço parte da comunidade OASIS como colaborador e ajudo na liturgia, quando precisa. Pertencia à equipe do Frei Salvador, mas desisti porque era muita coisa, não dá para pegar tudo, senão a gente não abraça nada.

OF: O que motivou a participar de diversas frentes dentro da Igreja?
Garibaldi: Acho que pelos exemplos das minhas avós e da família, meu pai foi coroinha quando pequeno, uma das minhas avós era catequista – não se chamava catequista naquela época – ela também era parteira e cozinheira da comunidade. Isso das festas eu gosto muito, a minha avó fazia comida para os casamentos, enterros, e eu achava bonito isso porque ela fazia comida para as famílias que tinham perdido um ente querido, desde pequeno eu fui vendo e gostando. Meu avô ia com a carroça buscar os falecidos nas casas, eu não vi muito, mas lembro que falavam. Visitar os doentes também, eles levavam galinha, uma dúzia de ovos, pão. Eu levei as minhas duas avós várias vezes, elas gostavam muito de visitar a pessoa que estava doente, levavam alguma coisa, então acho que isso veio de família. E como a minha avó morava na frente da funerária ela ia em todos os velórios, então ela contava de um, de outro, e isso foi me levando para esse caminho.

OF: Como gostaria de ser lembrado pelas pessoas? 
Garibaldi: Como alguém simples. Que Jesus cresça e que eu desapareça, algo assim, que Jesus cresça, que vejam as obras de Deus, mas que eu diminua, que apareçam as coisas boas. Que possa aparecer Jesus, Maria, que possa aparecer os ensinamentos que eles deixam. Que os outros possam ver nisso tudo os ensinamentos de Deus, mas não eu, que tenha essa humanidade, que todos sejam mais humanos, mas não eu. E que a religiosidade não vá se perdendo, é isso que eu quero. Também o terço em família, que o pessoal não perca o gosto de ir na missa. Nós precisamos de Jesus, então nós temos que procurá-lo todos os fins de semana, mesmo às vezes com preguiça, mas procurar ir. Que não se perca esse elo porque muitos pensam que a missa ou a religiosidade é somente para os antigos, mas é para os antigos e os presentes também.

*Alguns questionamentos foram respondidos com a colaboração da irmã de Silvio, Ivanete Garibaldi, que auxilia no empreendimento desde o início.

ilvio Garibaldi está à frente do Armazém Vindima, o estabelecimento conhecido como o ‘shopping’ de Flores da Cunha.  - Valdinéia Tosetto Silvio Garibaldi , Ivanete Garibaldi e Nair Coloda Garibaldi compartilham a rotina no armazém há mais de duas décadas. - Valdinéia Tosetto
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