Crise no setor do alho deixa produtores preocupados
Concorrência com produtos importados e queda nos preços dificulta comercialização da olerícola
“É triste dizer que estou pensando em parar com a produção de alho, até porque faço isso há 22 anos”, diz o produtor Rudinei Antonio Giotto, morador da comunidade de Monte Bérico, e que colheu na última safra 70 mil quilos do produto. Rudinei é um dos inúmeros produtores de alho que está enfrentando dificuldades na comercialização da olerícola. Preços baixos, crescimento das áreas plantadas em países produtores (a China registrou aumento de 15% na área cultivada e a Argentina de 50%), dificuldades na taxa antidumping e concessão de liminares têm feito o setor viver uma das piores crises dos últimos anos. O preço do produto sofre com a demanda da China, que precifica o mercado mundial e tira a competitividade do produto nacional. Outro problema tem sido a renovação da taxa antidumping – a tarifa venceu em 2018 e foi prorrogada para mais um ano, com vencimento em outubro –, além dos processos liminares judiciais, que permitem o desembarque do alho importado sem o pagamento da taxa antidumping. Sem aplicação do direito antidumping, o produto importado da China pode chegar até R$ 30 abaixo do custo de produção do alho nacional.
“O preço do alho não está a contento do produtor, mesmo com a taxa antidumping. Hoje o produtor está vendendo em torno de R$ 1 acima do número de classificação. É muito pouco, pois isso não cobre o custo de produção”, explica o vice-presidente da Associação Nacional de Produtores de Alho (Anapa) e presidente da Associação Gaúcha dos Produtores de Alho (Agapa), Olir Schiavenin.
A maior preocupação do setor é que a taxa antidumping não seja renovada, como ocorreu com o setor leiteiro e que posteriormente foi revogada. “É nosso maior receio, pois se isso não ocorrer podemos dar adeus à cultura do alho. Mesmo com a taxa temos dificuldades em competir, imagina sem. O dumping nada mais é que você vender num terceiro país a preço menor do que você pratica no país de origem. É isso que está acontecendo com a China. Eles vendem mais barato aqui do que comercializam lá, pois o governo subsidia. Se o governo deles subsidia, o nosso governo tem de compensar isso sob pena de quebrar a produção nacional”, diz Schiavenin, que nessa semana viajou a Brasília para tratar sobre esse e outros assuntos. Neste e no próximo mês já estão agendadas ações que visam sensibilizar o Governo Federal em relação à taxa antidumping do alho e as concessões de liminares. “Muitos produtores diminuíram a área plantada e muitos agricultores familiares estão endividados, sem perspectiva de produção para a próxima safra. A situação é gravíssima”, alerta o presidente da Anapa, Rafael Corsino.
Em Flores da Cunha, o alho é cultivado em aproximadamente 70 hectares, produzindo anualmente cerca de 700 toneladas – muitos produtores do município têm áreas arrendadas em outras localidades. O Rio Grande do Sul é o quarto maior Estado produtor com 11,9% da safra brasileira. Atualmente, os produtores de alho estão na fase de comercialização da última safra. Conforme conjuntura da Emater/RS, a estimativa é que 60% da safra já tenha sido comercializada. O preço médio do alho está entre R$ 4 a R$ 5. O Brasil compra de outros países metade do alho que consome.
“Vivemos um momento de incertezas sobre o que fazer”
O agricultor Rudinei Antonio Giotto, morador da comunidade de Monte Bérico, cultiva alho desde os seus 14 anos, hoje está com 36 anos, e nunca enfrentou tantas dificuldades como nos dois últimos anos. “O custo de produção está alto e o valor de mercado muito baixo. Se colocarmos todas as despesas de produção, com defensivos, maquinários e mão de obra, não temos nenhuma margem de lucro”, diz. Na última safra, Giotto plantou seis hectares de alho – numa área no município de Ipê –, e colheu 70 mil quilos. Para essa quantidade, seu custo de produção chegou aos R$ 300 mil. “O alho tem um ciclo longo, que gira em torno de 16 meses, desde a separação das sementes até o pagamento completo, e isso se torna oneroso. Se a taxa antidumping não for renovada vai inviabilizar e será impossível sustentar a produção”, destaca ele, que até o início de maio deverá comercializar toda a safra num valor médio de R$ 5 ao quilo.
As expectativas estão tão incertas que Giotto não sabe o que irá fazer na próxima colheita, embora já tenha separado as sementes para o plantio de alho. Uma das alternativas é que utilizará parte das terras do alho para cultivar outras produções, como beterraba e cenoura.
“O mais sensato seria diminuir a área de plantio, mas vou aguardar para ver se o mercado dá uma reagida. Por enquanto, vivemos um momento de incertezas sobre o que fazer. Na verdade, vou plantar outras culturas para pagar o alho”, comenta.
Para ele, o momento é de segurar as contas, tentar manter a sustentabilidade da produção e não realizar investimentos. “O ruim disso é que quando você aprende a dominar as técnicas de plantio do alho, investe e passa a manter uma boa produção, ocorre essa crise e você tem que partir para uma cultura nova e desconhecida e começar tudo de novo”, lamenta.
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