Conheça a trajetória de sucesso de Lourenço Darcy Castellan
Fé, dedicação ao trabalho e amor pela família foram os pilares do empresário que levou sua marca para o mundo
A tarde chuvosa e cinzenta do último domingo, dia 3, mesclou-se ao sentimento de luto de milhares de florenses que se sensibilizaram com a perda do precursor do setor moveleiro no município de Flores da Cunha, bem como na região da Serra Gaúcha, Lourenço Darcy Castellan, aos 92 anos. Há alguns dias, o sócio-fundador e presidente emérito da Fábrica de Móveis Florense, estava hospitalizado no Hospital Pompéia, em Caxias do Sul, e acabou não resistindo às complicações de saúde.
A alegria do imponente Castelo da Família Castellan, ambiente de encontros festivos e que desperta a curiosidade dos habitantes do município e turistas, deu lugar a um cenário de tristeza e luto, velando, na capela anexa, em cerimônia restrita para familiares e amigos mais próximos, o corpo do empresário, na segunda-feira, dia 4. Logo após o corpo foi transladado para cremação junto ao Memorial Crematório São José, em Caxias do Sul.
Como forma de homenagem póstuma, a prefeitura de Flores da Cunha decretou luto oficial de três dias por sua morte, além disso, as bandeiras do Centro Administrativo Angelo Araldi e da Praça da Bandeira permaneceram hasteadas a meio mastro.
Lourenço Darcy Castellan consolidou a Florense entre as melhores grifes de móveis do mundo. Foi um dos empresários de ponta da Serra Gaúcha, integrando, ao lado de nomes como Raul Randon (Empresas Randon), Paulo Bellini (Marcopolo) e Adelino Colombo (Lojas Colombo), uma geração de gigantes empreendedores. A morte de Castellan também marca o fim de uma era formada por esse seleto e inspirador grupo, que tanto contribuiu para o desenvolvimento econômico da região.
Muito mais do que um legado de bens materiais, o empresário deixa seu exemplo como um homem visionário, à frente do seu tempo, que acreditou nos seus sonhos e fez a diferença. Conheça a história do empresário que escreveu a sua própria história com muita determinação, e serve de modelo para atuais e futuras gerações.
Como tudo começou
O sexto dos dez filhos de Serafina Carpeggiani e Antonio Castellan, Lourenço Darcy Castellan, nasceu em 24 de janeiro de 1930. De família humilde e descendente de imigrantes italianos, ele começou a labuta cedo, ainda aos 11 anos de idade, como botcha (nome dado aos serventes que levavam água para os trabalhadores) na Granja União, local de trabalho de seu pai. “A minha infância não foi fácil, não tínhamos roupa no inverno, nós morávamos em uma casa de madeira, simples. A minha mãe me serviu de exemplo, além de cuidar dos dez filhos, lavava roupa para fora”, lembrou Castellan em entrevista ao documentário sobre sua vida, que deve ser lançado em breve.
Logo depois conseguiu um emprego na Ferraria & Carpintaria Olímpio Cavagnolli – devido, também, à tamanha insistência em ser contratado por Olímpio, e querer aprender a fazer coisas ‘difíceis’. Ali atuava como ferreiro, funileiro, marceneiro e carpinteiro – ele abdicou da escola para ajudar a família – mas encarou como uma oportunidade de crescimento, que nunca esqueceu e considerou determinante para iniciar sua trajetória.
“Quero agradecer a Deus por ter aprendido a profissão cedo, pois com 14 anos já era profissional e já fazia cabines de caminhão, corrocerias, reboque, caixões, confessionários, pipas de vinhos”, destacou Castellan, em entrevista concedida ao Jornal O Florense, em 2003.
Na década de 1940 não havia energia elétrica, tudo era produzido artesanalmente. Nessa época, Castellan saía todos os dias, às 4h da manhã, de sua casa para chegar ao trabalho, percorrendo cerca de um quilômetro e, por vezes, trabalhava também à noite. Esforço que valeu muito a pena, quando, no início de 1953, sua habilidade com a madeira lhe rendeu um convite para trabalhar na fábrica de móveis e esquadrias de Claudino Nissola, primo de sua mãe. Poucos meses depois, acompanhado do cunhado Angelo Corradi, do irmão Décio Castellan, do tio Valentino Carpeggiani e de Ernesto Bertollini, Lourenço comprou a marcenaria – que estava à venda uma vez que Nissola almejava mudar-se para uma cidade maior – e fundou a Fábrica de Móveis Florense, em 18 de maio de 1953, com apenas 23 anos de idade.
A fábrica, especializada em móveis no estilo chippendale e coloniais, era formada por um galpão de madeira de apenas 200 metros quadrados, e algumas poucas máquinas: “Chão batido, terreno 11x40, quando chovia alagava. Nós fundamos a Florense”, lembrou Lourenço sobre as dificuldades iniciais à frente da empresa, em gravação para o documentário.
Inicialmente, os móveis eram fabricados sob encomenda, vendidos de porta em porta, ou por meio de indicações. Com a qualidade dos produtos e a honestidade incansável de seu trabalho, adquiriu credibilidade e conquistou clientes como Francisco Stédile, Raul Randon, Pedro Bulla, Paulo Bellini e Ivo Tramontina, do seleto grupo de empresários do qual ele viria a fazer parte, em breve.
Os rendimentos que adquiria com as vendas, ele usava para investir ainda mais em fazer seu negócio prosperar. Modernização das máquinas e equipamentos que levou a um aumento da produção e fez com que a fábrica caminhasse para uma ampliação física, com aquisições sucessivas de terrenos e construção de novos pavilhões.
“Para fazer móveis, eu tive que fabricar pessoas. O grande sucesso da Florense foi que eu contratei, logo em seguida, um monte de gurizada e ensinei a trabalhar. Essa gurizada aprendeu e em dois, três anos se formaram. Foram aumentando os pedidos, mas eu já tinha marceneiros que sabiam trabalhar. A primeira coisa que eu tive que fazer foi fabricar mão de obra. Até hoje estou fazendo pessoas e dando oportunidade sempre para elas dentro da empresa”, frisou Lourenço em entrevista a este meio de comunicação, em 2003.
E a prova de que seu lado “caça-talentos” deu certo é que das mais de 100 fábricas de móveis que o município comporta, a grande maioria foi fundada por ex-funcionários da Móveis Florense. Veia empreendedora que também se manifesta em outros empresários, de diversos segmentos de Flores da Cunha, bem como na cena cultural. Exemplo disso foi o incentivo dado pelo visionário ao então funcionário Flávio Luis Ferrarini, que conseguiu, com seu apoio, publicar seu primeiro livro de poesias individuais intitulado ‘Volta e Meia um Poema na Veia’, em 1985. O primeiro de uma sequência de mais de 20 obras do escritor.
“Me sinto muito feliz de ver que muitas dessas pessoas hoje são empresários ou comerciantes que tiveram sucesso na vida”, enfatizou Lourenço em entrevista ao Jornal O Florense, em dezembro de 1998, por conta da inauguração da Fundação Lourenço Castellan, que ele teria criado com o intuito de proporcionar bem-estar e lazer aos seus funcionários.
Fontes consultadas: Arquivo O Florense, site Hemeroteca Digital – BNDigital, site revista Afrodite, Gaúcha ZH/Pioneiro, site Móveis de Valor, livro “Lourenço Castellan: um nome que faz a diferença”, trailler do documentário “Lourenço Castellan: O Homem que construiu um Castelo”, sites da Câmara Municipal de Flores da Cunha e da Prefeitura Municipal de Flores da Cunha.
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