Geral

Alto consumo de remédios ainda preocupa Nova Pádua

Neste ano iniciou uma campanha de conscientização com visita a moradias, quando profissionais revisam receitas

Pequena e próspera, Nova Pádua registra Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) de 0,761 (quanto mais próximo de 1, melhor). No que se refere a condições de vida em geral, o cenário municipal contrasta com a realidade de grande parte do país. Porém, em pelo menos um aspecto a cidade segue uma tendência que atinge diversas partes do mundo: o consumo desproporcional de medicamentos, principalmente os antidepressivos.

Com pouco mais de 2,5 mil habitantes, segundo estimativa do IBGE de 2013, a prefeitura da cidade gastou, no ano passado, quase meio milhão de reais em medicamentos. A grandeza do valor fica clara quando este é comprado ao gasto de Flores da Cunha: R$ 1 milhão para mais de 28 mil habitantes. Ou seja: Flores tem cerca de 11 vezes mais habitantes e gasta apenas o dobro que a cidade vizinha.

O vice-prefeito e prefeito em exercício de Nova Pádua, Ronaldo Boniatti (PSDB), afirma que o município está fazendo o possível para não incluir nenhum medicamento novo na lista de fármacos na Farmácia Municipal, que já soma 349 tipos, além de fraldas geriátricas. Ele reconhece que os gastos estão muito acima da projeção de orçamento do município. “Vai chegar um momento em que não teremos mais condições de sustentar isso”, prevê. Segundo ele, a prefeitura trabalha em iniciativas preventivas.

Dos cerca de R$ 500 mil investidos na compra de remédios em 2013, a maior parte saiu dos cofres paduenses: mais de R$ 465 mil. O Estado contribuiu com cerca de R$ 18 mil e, a União, repassou mais ou menos R$ 12 mil. De acordo com estudos realizados por intermédio do Plano Municipal de Saúde, que contempla o Plano Municipal de Ciências Farmacêuticas, se o município continuar a custear os medicamentos nesse ritmo, assim como se o acesso a esses itens continuar crescendo da forma como tem ocorrido nos últimos anos, em 2019 a prefeitura estaria gastando cerca de R$ 10 milhões com a compra de remédios.

Justamente para evitar este desequilíbrio o secretário da Saúde paduense, Odir Boniatti, afirma que um dos focos da administração é diminuir a demanda por medicamentos. Uma das ações que já teve início neste ano é a visita médica a domicílio. Nas quartas-feiras profissionais da saúde visitam idosos e enfermos acamados ou que necessitem de medicamento. Nesta oportunidade o médico também analisa a situação do paciente e quais remédios ele usa. Em alguns casos, ocorre a suspensão, a troca e até a inclusão de remédios.

Depressão e desgaste físico
O secretário Boniatti diz que um dos medicamentos mais distribuídos no município são os antidepressivos. Além disso, ele observa que os casos de ortopedia e traumatologia (ossos e articulações), como desgaste nos joelhos e problemas de coluna, também são comuns entre os paduenses. Estes dois fatores, segundo ele, são resultado de uma característica própria da comunidade: trabalhar muito e ter pouco lazer.

O perfil dos moradores, em grande parte, é de pessoas que desde muito jovens trabalham intensivamente na agricultura. Além da exaustão física, lembra Boniatti, a lida agrícola exige contato com agrotóxicos, que podem interferir no sistema nervoso. Apesar de reconhecer que a cidade ainda não oferece muitas alternativas de diversão aos moradores, o secretário destaca que esta questão não é apenas responsabilidade do poder público, lembrando que recentemente uma academia instalou-se no município. “As pessoas podem ver TV, pegar uma praia”, sugere.

Os três tipos de medicamentos mais consumidos em Nova Pádua são para controle da pressão, tratamento de problemas digestivos e antidepressivos. Destes, a Fluoxetina (correspondente ao Prozac) e a Amitriptilina (correspondente ao Amitryl) estão entre os 10 mais solicitados no ranking geral da Farmácia Municipal.


Depressão é tratada com medicamentos receitados por médicos

A paduense Fabiana Tonello, 40 anos, tem depressão há mais de uma década. Desde o diagnóstico definitivo, após o parto do filho mais novo, até maio do ano passado, ela conseguia os antidepressivos na Farmácia Municipal de Nova Pádua. Porém, depois de uma crise muito forte da doença, o médico orientou que ela comprasse a versão original dos medicamentos – entre eles, o Rivotril – já que o município fornece os genéricos.

Porém, nem por isso o auxílio do poder público foi deixado de lado. O marido, Jair Tonello, 42 anos, também precisa de remédio para controlar o colesterol e de antidepressivo para dormir, estes, sim, fornecidos pela farmácia local. Além disso, a sogra de Fabiana, que mora com o casal, Lindina Fabian Tonello, 80 anos, também precisa de medicação para o colesterol e para repor o cálcio, além de Fluoxetina.

Assim como grande parte dos moradores da cidade, a família de Fabiana trabalha bastante para conseguir tocar os negócios, que envolvem a plantação de alho, parreirais e um aviário. “Eu não vou parar; o médico disse que eu vou ter que tomar sempre”, define a agricultora.

Orientação é para que diagnósticos do ‘Dr. Google’ sejam evitados

“Sem o tempo para parar, avaliar a vida e discutir uma melhor qualidade, as pessoas preferem o Rivotril ou a Fluoxetina. Sentem-se um pouco melhor com isso e voltam a cometer os mesmos erros.” A afirmação do professor e psiquiatra Carlos Gomes Ritter ajuda a entender o aumento de pessoas procurando por medicamentos capazes de aliviar a pressão resultante de cobranças.

O amplo e rápido acesso a informações também reflete no consultório. Ritter já está acostumado a atender pessoas que fazem um pré-diagnóstico com o ‘Dr. Google’. Vão para a consulta crentes de que sofrem de determinada doença, sabendo inclusive quais os remédios indicados. “Cabe ao médico ajudar o paciente a interpretar o conhecimento que adquiriu, muitas vezes inadequado e que lhe trará problemas”, explica. A isso soma-se a automedicação, que pode atrapalhar o diagnóstico e piorar o quadro.

Entre os jovens a troca de informações sobre medicamentos pela internet cresce cada vez mais. Membros de uma geração que precisa estudar regularmente, fazer cursinho pré-vestibular, e em alguns casos trabalhar, e que busca resultados imediatos, os estudantes elegeram a queridinha da turma: a Ritalina. Trata-se do metilfenidato, membro da família das anfetaminas – a qual pertence também a famosa metanfetamina, da série Breaking Bad. A Ritalina é indicada a portadores do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). Um dos principais efeitos é a diminuição do cansaço e maior concentração. Eis o que atrai os estudantes.

Em uma rápida pesquisa na internet, surge um blog em que uma menina conta como é sua vida usando Ritalina. Nos comentários, formou-se um fórum em que estudantes (tanto para vestibular, quanto acadêmicos ou concurseiros) buscam informações sobre o medicamento e dizem que ‘acham’ ter déficit de atenção, com base no que pesquisaram. Entre os apelos desesperados, diversos vendedores deixam seu contato para interessado em comparar o fármaco pela internet. Os valores chegam a R$ 400, quase o dobro do que o maior preço encontrado em farmácias.

Assim como os demais ‘faixa-preta’, a Ritalina pode causar dependência física ou psíquica e somente pode ser vendida com a receita, que fica retida na farmácia. Seus efeitos colaterais incluem enjoo, insônia e dor de cabeça. Alguns especialistas falam até em apatia, gerando um efeito zumbi no usuário, que fez com que o medicamento ficasse conhecido como ‘droga da obediência’.

Já que as cobranças existem e é impossível desacelerar o ritmo do mundo, a melhor forma para aumentar a imunidade ao estresse é investindo em pequenas atitudes que todos conhecem, mas a maioria ignora. “Viver bem, praticar esportes, amar bastante, ter compaixão, ter espiritualidade. Coisas que não custam nada para o bolso e estão ao alcance todas as pessoas”, complementa o psiquiatra Ritter.


Os mais vendidos no país

Os medicamentos mais vendidos no Brasil em 2012, segundo a IMS Health, consultoria especializada na área da saúde:

- Neosoro (descongestionante nasal).

- Puran T4 (hormônio para tireóide).

- Salonpas (analgésico e anti-inflamatório).

- Cliclo 21 (anticoncepcional).

- Microvlar (anticoncepcional).

- Buscopan Composto (analgésico e antiespasmódico).

- Rivotril (anticonvulsivante e ansiolítico).

- Dorflex (analgésico).

- Glifage (antidiabético).

- Hipoglós (pomada para assaduras).

Agricultora usa remédios com indicação de um médico. - Gesiele Lordes
Compartilhe esta notícia:

Outras Notícias:

0 Comentários

Deixe o Seu Comentário