Economia

Saiba como formalizar o vinho colonial

Agricultores que comandam empreendimentos familiares em Flores da Cunha e Nova Pádua devem buscar informações junto aos escritórios da Emater-RS/Ascar

Uma pequena produção que varia de 15 mil a 20 mil litros de vinho elaborada no porão de casa com muita dedicação pelo casal Nelso Zin, 65 anos, e Diva Schiavenin Zin, 67 anos, moradores da comunidade de São João, interior de Flores da Cunha. A venda é predominantemente feita na própria vinícola, para clientes habituais. Este é um típico caso de produção que se enquadra na Lei do Vinho Colonial, que regula a bebida que é produzida por agricultor familiar, estabelecendo os requisitos e limites para a sua produção e comercialização. Com a formalização, o empreendedor rural pode fazer uso da oportunidade para estruturar seu negócio voltado a produzir e comercializar seu vinho, em conformidade com as normas, agregando mais uma fonte de renda à família e mantendo acesa a tradição da produção de uva e elaboração de vinho colonial.

Em janeiro deste ano os primeiros empreendimentos familiares gaúchos aptos à comercialização de Vinho Colonial, enquadrados na Lei 12.959/2014, receberam seus números de registro durante a abertura oficial da colheita da uva no Estado, realizada em Nova Pádua. Produtores de Garibaldi e Bento Gonçalves foram os primeiros registrados pelo processo que permite a venda em feiras, cooperativas ou na propriedade utilizando apenas o talão de produtor rural para emissão de notas, sem a necessidade de abrir uma empresa.

Outros produtores estão buscando informações para dar início ao processo, inclusive em Flores da Cunha, como é o caso de Nelso Zin. Ele e a esposa Diva mantêm dois hectares de Bordô e boa parte da safra é vinificada no porão da casa, onde tanques de inox e equipamentos modernos tomaram o lugar das antigas pipas de madeira. Neste ano, com o incentivo dos próprios clientes, Zin procurou as primeiras informações para dar início à formalização. O vinho elaborado por ele, com a assistência de um enólogo contratado, é vendido praticamente todo na propriedade. “A produção em litros varia de 15 mil a 20 mil, mas temos nossos clientes conhecidos, então 90% dessa produção é vendida em casa mesmo. Formalizar esses vinhos é uma boa, assim podemos oferecer a nota para quem precisa”, destaca Zin.

Os investimentos

Um dos fatores que gera dúvidas para Zin é a aplicação em valores necessária para a formalização. A resposta, porém, varia muito conforme as necessidades das instalações do empreendimento. “É difícil dar um valor, porque esse investimento é muito variável conforme cada caso. Alguns produtores estão aproveitando para investir mais que o necessário e fazer outras melhorias, outros estão focando somente nas adequações necessárias. É importante que o produtor busque as primeiras informações sobre cadastro no Programa Estadual de Agroindústria junto à Emater e faça a contratação do Responsável Técnico, que é o profissional que vai auxiliar em todo o processo”, adianta a consultora do Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin), Janine Basso Lisbôa.

O processo de formalização permite que o produtor faça a venda de seus vinhos em feiras, cooperativas ou na própria propriedade apenas com o talão do produtor, sem precisar abrir uma empresa para isso. Zin não tem a pretensão de levar seus vinhos para outros destinos, nem de aumentar a produção, mas acredita que melhorias sempre são bem-vindas. “Nós dois nos viramos com todo o trabalho, desde os vinhedos até a elaboração do vinho. Vamos manter essa produção e também a qualidade dos nossos vinhos”, destaca o produtor que, neste ano, colheu cerca de 30 mil quilos de uva.

 

A lei

A Lei nº 12.959, de 19 de março de 2014, conhecida como Lei do Vinho Colonial, altera a Lei nº 7.678, de 8 de novembro de 1988, e regula o vinho que é produzido por agricultor familiar ou empreendedor familiar rural, estabelecendo os requisitos e limites para a sua produção e comercialização. Essa lei define também quais são as diretrizes para registro e fiscalização desse produto.

Um dos maiores ganhos com a publicação da Lei do Vinho Colonial é a simplificação no processo de formalização do empreendimento, não sendo necessária a abertura de uma empresa, reduzindo, assim, os custos e a burocracia para o agricultor familiar.

Os requisitos

– Deve ser produtor da agricultura familiar, comprovado por meio da Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP).

– Produzir até 20 mil litros de vinho ao ano.

– 100% das uvas utilizadas na elaboração dos vinhos devem ser de cultivo próprio.

– Elaborar e envasar o vinho exclusivamente no imóvel rural.

– Comercializar o vinho diretamente ao consumidor final na propriedade rural, em feiras de agricultura familiar ou em estabelecimentos mantidos por associações ou cooperativas rurais.

– Ter faturamento anual de até 15.000 UPF (em 2017, valor de R$ 247.083, reajustado anualmente).

Passo a passo

– Para a formalização de um empreendimento produtor de vinho colonial, é necessário o cumprimento dos requisitos em três áreas de legislação que podem ser realizados ao mesmo tempo: fiscal (enquadramento como microprodutor rural na Receita Estadual para emissão da nota fiscal com talão de produtor e participação no Programa Estadual de Agroindústria Familiar – Peaf); sanitário (registro do estabelecimento junto ao Ministério da Agricultura e posterior registro de produto); e ambiental (obtenção de licenciamento ambiental do estabelecimento).

– Um guia sobre a formalização de agricultores familiares foi lançado e está disponível pela internet (www.ibravin.org.br) e também nos escritórios da Emater e nos sindicatos dos trabalhadores rurais.

O Jornal O Florense resumiu esse passo a passo. Confira:

A – Cadastramento no Programa Estadual de Agroindústria Familiar (PEAF): A primeira etapa consiste em fazer o cadastro junto ao programa. Para isso, o produtor deve procurar o escritório municipal da Emater e encaminhar o cadastro do PEAF. Mais informações podem ser obtidas nos sites da Secretaria Estadual do Desenvolvimento Rural, Pesca e Cooperativismo (www.sdr.rs.gov.br) e da Emater (www.emater.tche.br).

B – Obtenção do alvará de localização ou declaração de autorização de funcionamento de empreendimento junto à prefeitura: Cada município possui seu Plano Diretor e diretrizes sobre onde é permitida a instalação de indústrias ou agroindústrias. Por isso é necessário procurar a prefeitura e verificar se a implantação de agroindústria na região da sua propriedade rural é permitida. Se sim, o produtor deve solicitar o alvará de localização ou declaração de autorização para a instalação da vinícola.

C – Licenciamento ambiental: O licenciamento ambiental é uma obrigação legal e deve ser obtido para instalação e operação de qualquer empreendimento potencialmente poluidor através de órgão do Sistema Nacional do Meio Ambiente. A partir do cadastramento no PEAF, a agroindústria familiar terá acesso à assistência técnica por meio da Emater RS para orientações sobre a adequação ambiental do empreendimento, elaboração de projetos de tratamento de resíduos e encaminhamento do processo de licenciamento ambiental.

D – Contratação de Responsável Técnico: Todo empreendimento que processe alimentos precisa ter um Responsável Técnico (RT). O RT é o profissional que responde pela qualidade e segurança dos produtos elaborados. Compete a este profissional auxiliar o produtor na interpretação dos requisitos sobre as instalações, na elaboração de documentos e processos referentes à elaboração dos produtos e no acompanhamento para a garantia de sua qualidade e rastreabilidade.

E – Verificação e adequação dos requisitos sobre as instalações do empreendimento: É necessário que o produtor rural, juntamente com seu RT, avalie suas instalações de acordo com uma lista de requisitos e realize as adequações necessárias. O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) é o órgão responsável pelo registro de empreendimentos elaboradores de vinhos e seus derivados. É a Instrução Normativa nº 17/2015 do Mapa que aprova os requisitos e procedimentos para registro de estabelecimentos. Porém no caso do produtor da agricultura familiar, a Lei do Vinho Colonial prevê que os requisitos da legislação devem ser adequados às dimensões e finalidades do empreendimento e que seus procedimentos sejam simplificados.

F – Elaboração de documentos necessários para a solicitação de registro do estabelecimento junto ao Mapa: Para atender ao que determina o Mapa para o registro de estabelecimento, são necessários diversos documentos, dentre os quais alguns que se referem às boas práticas de elaboração do vinho. Os documentos que precisam ser elaborados ou providenciados pelo produtor com o auxílio do RT são projeto ou croqui das instalações; memorial descritivo das instalações e equipamentos; manual de qualidade; e laudo de análise de água (o mesmo utilizado na inclusão do PEAF).

G – Solicitação de Registro de Estabelecimento junto ao Mapa: Após a conclusão das etapas anteriores e com os documentos listados já reunidos, o RT deve solicitar o registro de forma online por meio do Sistema Integrado de Produtos e Estabelecimentos Agropecuários (Sipeagro), no site do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Após a inserção dos documentos no sistema, os mesmos são conferidos pelo Mapa. É necessário acompanhar o andamento do processo pelo site.

H – Vistoria do empreendimento e ajustes: Após a aprovação dos documentos inseridos no Sipeagro pelo Mapa, o empreendimento passará pela vistoria de um fiscal. A vistoria tem como função avaliar se a documentação apresenta está de acordo com as instalações. Mesmo após a aprovação de documentos, no momento da vistoria o fiscal pode solicitar novos ajustes no estabelecimento. Com a aprovação final, o número de registro de estabelecimento será fornecido pelo Mapa e o produtor terá concluído o processo de registro do estabelecimento.

I – Registro de Produtos: Após receber o registro do estabelecimento é necessário solicitar o registro de produto. Esse registro também deverá ser providenciado pelo RT através do Sipeagro. Para cada tipo de produto deve ser solicitado um número de registro. A solicitação é analisada pelo órgão e também é fundamental providenciar os rótulos de cada um dos produtos. A elaboração deve ser orientada pelo RT.

J – Inclusão no PEAF: Ao finalizar todos os passos anteriores, é necessário que o produtor retorne à Emater para encaminhar a solicitação de inclusão no PEAF. Somente após a inclusão no PEAF é que o empreendimento estará enquadrado junto à Secretaria da Fazenda (SEFAZ) do Rio Grande do Sul e apto a emitir nota fiscal de produtor rural para comercializar o vinho colonial.

K – Cadastro Vitícola e Cadastro Vinícola: O agricultor deverá continuar realizando anualmente a atualização das informações referentes ao Cadastro Vitícola. Em Flores da Cunha o serviço é realizado pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR). O Cadastro Vitícola registra as informações sobre a área plantada e a quantidade colhida por variedade de uva. Além disso, após a formalização do empreendimento produtor de vinho colonial é necessário que o RT passe a realizar as declarações de informação sobre estoque e movimentação de produtos vinícolas no Cadastro Vinícola.

Fontes: 'Um guia para formalização de agricultores familiares no Estado do Rio Grande do Sul', material organizado pelo Instituto Brasileiro do Vinho; Embrapa Uva e Vinho; Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento; Secretaria de Agricultura, Pecuária e Irrigação; Secretaria do Desenvolvimento Rural, Pesca e Cooperativismo; Emater-RS/Ascar; e Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

 O casal Diva Schiavenin Zin e Nelso Zin produz vinho no porão de casa e prima pela qualidade. A formalização da produção irá depender do tamanho do investimento necessário. - Camila Baggio/OF
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