Maria de Lurdes Rech

Maria de Lurdes Rech

Cotidiano

Professora, pós-graduada em Métodos e Técnicas de Ensino pela Universidade de Caxias do Sul (UCS), Maria de Lurdes Rech é autora do livro de crônicas Prosa de Mulher e do CD de crônicas e poemas Amor Maior, vencedora de diversos concursos literários em nível nacional. Membro da Academia Caxiense de Letras. Foi produtora e apresentadora do programa cultural Sábado Livre da rádio Flores FM de 2004 a 2012. Colunista do jornal O Florense desde 2007. Atuou na Secretaria de Educação, Cultura e Desporto de Flores da Cunha, onde coordenou a implantação dos Centros Ocupacionais da cidade. Exerceu a função de diretora e vice-diretora de escolas. Atualmente, realiza o trabalho de pesquisadora no Museu e Arquivo Histórico Pedro Rossi com o projeto Vozes do Tempo.

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Vozes do Tempo - parte III

Assim, seguem os fatos que não findam, mesmo com o cantar do galo e o raiar do dia seguinte.

Um povo sem memória não mantém a identidade, tampouco registra sua história, fazendo apagar feitos e efeitos do que por ele mesmo foi construído. Através do projeto Vozes do Tempo, o Museu e Arquivo Histórico Pedro Rossi resgata preciosidades por meio da memória oral dos descendentes dos imigrantes italianos. Histórias que se encaixam com o acréscimo de imagens reais e virtuais, numa justaposição de tempos longínquos e atuais. Assim, percebo que não vivemos num espaço vazio, mas sim, pleno de lembranças capazes de transformar em mil e uma histórias as mil e uma noites em que me deleito sobre relatos colhidos.
Pois foi em 1898 que o dr. Antonio Giuriolo estabeleceu-se e contraiu núpcias com Ida Falavigna em Nova Trento, permanecendo aqui até 1901. O casal teve os filhos Giulia, Antonieta e Mathias. Giuriolo partiu do Vêneto aos 30 anos de idade com formação em Medicina pela Faculdade de Pádova. Exerceu a profissão em Nova Trento e Caxias do Sul até 1920 e foi o primeiro sanitarista a instruir sobre cuidados básicos para a saúde.
Giuriolo ensinou a medicina prática ao cunhado Lynceu Falavigna que, junto a Líbera Soldatelli Falavigna, fundou a Farmácia São Pedro em nossa cidade. Lynceu e Líbera tiveram quatro filhos. José, Antônio Mathias, Inês e Terezinha. Lynceu, ou Tcheo como era chamado, também exerceu a medicina prática em Criúva por muitos anos. Antônio Giuriolo e a família voltaram à Itália em 1920 e no ano de 1922 o médico morreu por pneumonia na terra natal. As filhas Giulia e Antonieta permaneceram na Itália mantendo contato com Líbera por meio de cartas, até o ano de 1975. A esposa Ida e o filho Mathias retornaram após alguns anos. Ida Falavigna Giuriolo está enterrada no Cemitério Público de Flores da Cunha. Antonio Giuriolo e Lynceu deixaram seu legado pelos sete médicos que a família Falavigna formou, sempre atuantes e competentes.
Em 1943, os primos Ulisses e Alcides Mascarello mantinham um grande comércio de secos e molhados no Centro da cidade, vendendo tecidos, miudezas, perfumaria, malas, chapéus, guarda-chuvas, cama, mesa e banho, lajes para túmulos, mantimentos, bebidas e combustível. Lá trabalhavam Augusta Paganella, Gabriel Mambrini, Matilde e Solange Mascarello, Máximo Zamboni e Ari Nary Gelatti, entre outros.
Na Escola Frei Caneca, à noite, a professora Emma Mambrini ensinava cálculos para que eles pudessem melhor atuar no comércio. Numa ocasião, a bomba de gasolina do Mascarello pegou fogo com um toco de cigarro. Adelar Falavigna, o Lalo, colocou a vida em risco para ajudar a apagar o sinistro que por sorte foi controlado. Anos depois, em 1964, Ari, Máximo e Angelim Zamboni compraram de Claudino Chinato o Armazém Florense, que passou a funcionar junto ao casarão de Olinda Soldatelli. Desfeita a sociedade, anos depois, cada um abriu seu negócio, dando origem ao atual Supermercado Vermelhão dos irmãos Zamboni. Adelina Craco, que acompanhou a trajetória dos irmãos Zamboni, filhos de Júlia, ainda trabalha nesse estabelecimento.
Em 1946, Ari Gelatti iniciou uma coleção de lápis, juntando centenas deles até 2016, ano de sua morte, aos 86 anos de idade. Foi coroinha da Igreja dos sete aos 12 anos, trabalhou na fábrica de carroças de Olimpio Cavagnolli e por 22 anos atuou na Loja Mascarello antes de abrir o Armazém Florense. Ari também presenciou a colocação da pedra inaugural do campanário em 6 de outubro de 1946. Nela foi depositada uma garrafa contendo informações da época e moedas. Giovanni Debastiani, popular Nani Fermo, construtor, furou a pedra para a colocação das recordações. A cada martelada que davam, os padrinhos tinham direito de colocar uma moeda. Lá estavam frei Eugênio Brugalli, que permaneceu por 22 anos em Flores da Cunha; Alexandre Pedron, Antonio Ulian, Luiggi Bolzan, Pedro Soldatelli, os festeiros Ulisses e Palmira Mascarello, Anúncio e Ursulina Curra e demais moradores.
Uma grande festa foi realizada no dia da inauguração, com a presença de bandas, degustação de 3.220kg de churrasco, banquete na Canônica, foguetório e alto-falante com pedido de dedicatória. O campanário foi inaugurado em 30 de outubro de 1949 com o badalar dos sinos que até hoje alegram a cidade. Assim, seguem os fatos que não findam, mesmo com o cantar do galo e o raiar do dia seguinte.