Onde mora uma flor
Como lição de vida, para o ano que se inicia, percebo que convém focar nas escolhas que, na medida do possível e sem aragens, possam melhor se aproximar aos propósitos, assim como sinto o ânimo do jardineiro elegendo o que realiza, fazendo a diferença.
Segunda-feira, 15 de janeiro de 2018. A manhã com promessa de sol remete à atenção ao silêncio dos que dormem e aos que lentamente despertam para mais um dia que soa a rotinas.
Com a promissão de que o trabalho enobrece e acalenta a alma, aqui está o jardineiro plantando e regando vida no imenso canteiro da rua central da cidade. Em alto e bom tom, o senhor franzino e de aspecto envelhecido pela exposição ao sol recita, a quem deseja escutar (embora ali alguns apenas sabem ouvir):
– Onde mora uma flor, tem um amor; onde tem um amor, mora uma flor!
Enquanto mexe e remexe terras arenosas, sentindo prazer em seu fazer, repete os versos, que levam ao encantamento. Atitude nobre de quem se preocupa em ornamentar a cidade com flores, um poeta anônimo provavelmente com pouca escolarização, mas de uma sabedoria ímpar. Confesso que sinto vontade de atravessar a rua para dar-lhe um abraço e agradecer pela lição de vida.
Provavelmente não é o valor que recebe como salário que o deixa radiante em realizar tal tarefa, mas o amor pela natureza, o dom de saber lidar com a essência da terra misturada às raízes que fazem eclodir a beleza preponderante da flor, sempre única aos olhos de quem sabe observar.
Como lição de vida, para o ano que se inicia, percebo que convém focar nas escolhas que, na medida do possível e sem aragens, possam melhor se aproximar aos propósitos, assim como sinto o ânimo do jardineiro elegendo o que realiza, fazendo a diferença. Paz interior, bem-estar, trabalho digno, saúde e boa convivência podem ser produtos de escolhas, posturas e pretensões. Fazer o que causa, o que faz bem, nem sempre é sinônimo de cifrão e conta bancária. Que sejamos leves, solidários, respeitosos para conosco, com o outro e com o universo. A vida corre num pé de vento e o que resta são os bons momentos, as boas recordações, relações afetivas e significativas vivências. O resto, apenas entulhos, provavelmente ocupando espaços em prejuízo da mãe natureza.
A exemplo do jardineiro, que tenhamos uma vida livre, leve e solta, lembrando que, onde mora uma flor, tem um amor; onde tem um amor, mora uma flor. O que vale mesmo é trilhar caminhos lado a lado, com o prazer e as belezas do mundo, enquanto os sonhos são maiores que os medos, e o viver, além dos entendimentos.