O fogo e seus poderes
Curiosamente, um gaúcho do Norte do Estado mantém um fogo de chão aceso há mais de 50 anos, sem deixar que se apague durante o dia e à noite.
Curiosamente, um gaúcho do Norte do Estado mantém um fogo de chão aceso há mais de 50 anos, sem deixar que se apague durante o dia e à noite. Danilo, como é chamado, está preocupado com o momento em que tiver que partir, por não saber quem irá continuar com sua ação inusitada. Segundo ele, no local já aconteceram muitas reuniões de amigos e grupos de índios, cerimônias oficiais, festas, casamentos, noivados, mateadas e churrasqueadas.
É fácil compreender a atitude de Danilo, pois o fogo é um dos elementos da natureza, fazendo parceria com terra, água, ar e energia, agentes primordiais da vida. Sendo assim, o gosto por ele está na essência e no arquétipo do ser humano. O elemento fogo foi relacionado por Yung, como sendo o núcleo dinâmico da energia da vida, aquela energia que flui espontaneamente e de maneira inspiradora. Então, por ser de qualidade primeva, está presente na alma humana.
Com particularidades, as suas chamas trazem coloridos irreverentes e convidativos, para que se aprecie instante após instante a sua combustão. O fogo em lareiras, fogões à lenha, churrasqueiras, clama pela presença de pessoas que, ao seu redor, contam causos, divagam, namoram, aquecem e degustam. Dinâmico e perigoso, ele é o próprio movimento sem formas definidas. É prazeroso ficar mirando e apreciando seu tremeluzir, tendo visões, percepções, lembranças e imaginações, aquelas que podem nos levar ao subjetivo e ao descanso mental. Extrovertido e executando uma dança harmônica, ele nos remete à consciência, à introversão, integrando-nos à natureza que somos nós mesmos.
Quando seus espectadores, nos compenetramos e nos curvamos a ele pela força que representa na natureza. Especialmente na região Sul, onde temos o privilegio da necessária presença desse fenômeno da vida que nos deixa intrinsecamente entrelaçados durante os meses de inverno.
O sempitermo também serviu de mensagem, dando sinal à Maria quando Isabel, a mãe de João, quis avisá-la do nascimento do seu filho, por isso, até hoje, a fogueira de São João é tradição entre os cristãos, fazendo parte das grandes comemorações. Com sua cor vermelha, rubro, encarnado, carmim, púrpura, evidencia misticismos e crenças, a exemplo de Fênix que, na mitologia grega, o pássaro entrava em autocombustão e renascia das próprias cinzas. O sol e as estrelas são naturalmente fogo, o dono da luz, o ativo, impulsivo, impetuoso e explosivo, simbolizando a força e energia da vida.
Sua força também combina com emoção e coração, por isso é comparado ao ardor das paixões que calam e deixam marcas. Que sabem ferir e machucar. Vibrar e alegrar. Não é à toa que se faz presente em famosos poemas, assim como este, de Luís de Camões, que versa: “Amor é fogo que arde sem se ver; É ferida que dói e não se sente; É um contentamento descontente; É dor que desatina sem doer..."