Maria de Lurdes Rech

Maria de Lurdes Rech

Cotidiano

Professora, pós-graduada em Métodos e Técnicas de Ensino pela Universidade de Caxias do Sul (UCS), Maria de Lurdes Rech é autora do livro de crônicas Prosa de Mulher e do CD de crônicas e poemas Amor Maior, vencedora de diversos concursos literários em nível nacional. Membro da Academia Caxiense de Letras. Foi produtora e apresentadora do programa cultural Sábado Livre da rádio Flores FM de 2004 a 2012. Colunista do jornal O Florense desde 2007. Atuou na Secretaria de Educação, Cultura e Desporto de Flores da Cunha, onde coordenou a implantação dos Centros Ocupacionais da cidade. Exerceu a função de diretora e vice-diretora de escolas. Atualmente, realiza o trabalho de pesquisadora no Museu e Arquivo Histórico Pedro Rossi com o projeto Vozes do Tempo.

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A fonte dos desejos

Os apreciadores fixam olhares enquanto observam detalhes e escutam o barulho das águas rolantes.

Humanos apreciam o místico e o que diz respeito ao passado, a volta às origens e quem sabe, o desejo inconsciente de reviver a própria estada nas águas maternas. Talvez, por isso o fascínio por fontes e rios de águas claras.  
Prova disso estão nas centenas de fontes pelo mundo; Fontanna di Trevi, La Fontanna dell'Áqua Felice, Fontanna dei Quatro Fiumi, Fontanna Delle Naiadi e tantas que são de significância para os povos.
Na cidade há uma fonte ornamental no jardim de uma casa. Ela ocupa cerca de doze metros quadrados, mas tem tamanho suficiente para abrigar sonhos, fantasias e despertar a curiosidade dos que passam por ali. Situada na avenida principal, tornou-se atração entre os que andam pela calçada, e não hesitam em parar, expressando admiração. 
Os apreciadores fixam olhares enquanto observam detalhes e escutam o barulho das águas rolantes. Diante do encanto passam a viajar sem a presença do tic-tac do tempo. Reportam-se aos espaços íntimos mais longínquos e reservados para a introspecção. Lugares preservados que garantem o direito aos deleites e pequenos prazeres. Refúgios necessários que nos distanciam do risco de ter a constante e dura realidade diante dos olhos.
Nela, entre as águas e os seixos de rochas, peixes fazem exibições de agilidade e destreza para brincar com crianças e adultos, fazendo as honras da casa com acolhida.
Diante das simulações com cascatas e quedas d'água, as plantas rasteiras apreciam as gotículas do chafariz, que recebe fachos de luzes evitando que o escuro das noites se transforme em momentos de solidão. 
Os filetes d'água surgem como fios de prata, capazes de ligar o real ao imaginário dos observadores, que ao paralisar a menina dos olhos permanecem em estado de graça, sem lembranças do passado recente e do que lhe reserva o futuro.
Através da simulação da mãe natureza são possíveis momentos de transitoriedade, onde é permitido se reportar ao infinito, ao místico, sem importar-se com o giro do mundo e da moeda vigente. 
Sob um velho jerivá, a fonte abriga uma gruta com a imagem de São Cristóvão, padroeiro dos viajantes, que sempre acompanhou o seu devoto e hoje, proprietário da fonte. Relicário, capaz de fazer com que outros homens tirem os chapéus surrados da cabeça, e acolham-se na oração. Nesses momentos, ruídos externos são ignorados pelos que têm na religiosidade, a direção para as curas da alma e pedidos de proteção.
Na pequena réplica desse habitat está o desejo da volta às origens e crença no invisível, capaz de fazer aflorar o caráter sagrado e o culto às divindades. Certamente, moradores sentem-se agraciados com a iniciativa que vem dar colorido à vida, neutralizando a cor cinza da rotina dos que andam apressados rumo ao desconhecido da própria existência.