Floriano Molon

Floriano Molon

Lembranças

Floriano Molon é natural do distrito florense de Otávio Rocha, nascido em 11 de abril de 1949. Foi professor primário, funcionário público estadual e federal, hoje aposentado, bacharel em Direito e pesquisador da imigração italiana. Tem 12 livros publicados e participou em diversas outras publicações. Como promotor de eventos, foi presidente de algumas edições da Festa Nacional da Vindima (Fenavindima) e outras festas, bem como presidente de diversas Associações. Recebeu o título de ‘Cidadão de Mérito de Flores da Cunha’, além do Troféu Grazie, esta última do Jornal O Florense. 

Contatos

Portê ceste e catisu i grani de ua!

Iniciando os trabalhos da poda em agosto, seguem os períodos de sulfatagem, retirada de folhas, limpeza dos cachos... e a hora festiva da colheita – la vendema – entre meados de fevereiro

Para o italiano, em especial da colônia, a uva é um ser sagrado. Iniciando os trabalhos da poda em agosto, seguem os períodos de sulfatagem, retirada de folhas, limpeza dos cachos... e a hora festiva da colheita – la vendema – entre meados de fevereiro.  Tenho muito presente, “ndemo vendemar”. Era uma época festiva, sinal de um ano farto, de boas comidas e tranquilidade, do dever cumprido, com as bênçãos de Deus, se salvou de alguma chuva de pedra.
Vos conto esses passos, para recordar com saudade, de uma época em que a família inteira participava. Na poda, em carpir o terreno ou levar a mula para puxar o arado, ou puxar as mangueiras para dar sulfato. E na hora da vindima, com a presença sempre alegre dos vizinhos ou primos. Lá vinha o convite às crianças: “tragam as cestas e ajuntem os grãos de uva que caíram no chão”. Como escrevi, a uva era sagrada, e até os grãos que caiam no chão tinham que ser recolhidos. Era uma atividade não muito agradável, mas obedecíamos. 
Depois das uvas colhidas eram levadas em cestas, até a beirada do parreiral e lá, de slita ou carreta, eram conduzidas até em casa, na espera do caminhão com bigunchos para ser levada à Cooperativa. Embora lá em casa o bisnono tinha uma vinícola registrada, com o tempo optou-se em vendar para a Cooperativa. Mas todas as famílias faziam o seu vinho de consumo. Era a hora que vinha a nossa atividade de fazer a “pisa” das uvas. Como tudo era aproveitado, tinha também o costume de repetir uma ação que os meeiros de terra da Itália tinham autorização de fazer: o “vin piccolo”, tradução livre para “vinho pequeno”. Explico, depois de retirado o mosto, permitiam em colocar água, que passava por entre as cascas, e deixado mais alguns dias, e era retirado um vinho de menor valor, que tinha que ser consumido em tempo rápido. 
Uma coisa que não podia faltar era fazer o súgulo com mosto de uva e farinha de trigo. Poderia se dizer que é irmão do sagu.
Terminada a safra da uva, com bons papos, boa comida, e até cantos entre os vizinhos... era o dia da “festa da colheita”, ocasião em que além da família, eram convidados todos aqueles que ajudaram na colheita da uva.  Num final de sábado, leitão e frango assados no forno, boa massa, pão, polenta, saladas e vinho. Sagu, súgulo e biscoitos não faltavam. Para as crianças, vinho misturado com água e um pouco de açúcar.
Fevereiro ou março, me lembra também a Festa da Uva de Caxias. Na carroceria do caminhão, a preferência era para ir assistir os desfiles de carros alegóricos. Ali em São Pelegrino, víamos desfilar a história dos imigrantes e de Caxias, sempre com a presença de veículos dos municípios vizinhos. Não raro, íamos do bairro caxiense até a atual prefeitura para ver a exposição agroindustrial, não sem antes passar no Parque dos Macaquinhos. Na Festa da Vindima, fui da primeira à última. Na 1ª, a imprensa falou que tinha tanta gente que o centro poderia ter afundado.               
Vos conto tudo isto, para dizer que devo ter passado todo o período de gestação acompanhando a mãe, na atividade de poda, sulfatagem... e vindima. Nasci já em abril, época de provar o vinho novo. Tenho, pois, no meu DNA, o amor a uva e vinho. Embora não tenha ficado na colônia, não me faltou oportunidade de enaltecer produtos, uvas e vinhos, em participar em eventos como a Festa Colonial da Uva e, por três vezes, no evento maior de Flores da Cunha, a Festa Nacional da Vindima.