Floriano Molon

Floriano Molon

Lembranças

Floriano Molon é natural do distrito florense de Otávio Rocha, nascido em 11 de abril de 1949. Foi professor primário, funcionário público estadual e federal, hoje aposentado, bacharel em Direito e pesquisador da imigração italiana. Tem 12 livros publicados e participou em diversas outras publicações. Como promotor de eventos, foi presidente de algumas edições da Festa Nacional da Vindima (Fenavindima) e outras festas, bem como presidente de diversas Associações. Recebeu o título de ‘Cidadão de Mérito de Flores da Cunha’, além do Troféu Grazie, esta última do Jornal O Florense. 

Contatos

- Su de li “nêne”, te toca ndar a scola!

É tempo de recordar do nosso passado como estudantes, em especial naqueles tempos de vacas magras... 

O maledetto do Corona está segurando todos em casa, em especial, os estudantes. É tempo também para nós, adultos, recordar do nosso passado como estudantes, em especial naqueles tempos de vacas magras... 
De manhã levantar, quase sempre com um grito: “Levanta daí nêne, tu tem que ir à escola”. Comer em uma tigela (scudele) de café e pão ou biscoito cortado em pequenos pedaços. Depois, de apanhar a merenda, dependendo da época: pão com marmelada ou figada; pão com salame; pão com queijo; e, quando dava pouco trigo, batatas doces ou até pinhão.    
Depois, de caminhar em torno e três quilômetros até a escola. Com um saco de pano (bissaca) nas costas, alguns magros cadernos, um lápis e uma borracha, o caminho era trilhado com os pés nos chão, inverno ou verão. Com a geada se transformava num drama, pois os dedos enrijeciam. Até perguntei para uma minha irmã se era verdade que a gente ia de pés descalços na escola. Sim. A escola era municipal, com o nome de Dom José Barea (1º Bispo de Caxias), num cruzamento de duas estradas coloniais, onde desde 1951 havia um a pequena igreja dedicada a São Sebastião. Numa brincadeira mais recente, foi denominado de Nova Brasília, e o nome ficou. Uma maestra com trinta alunos e ensinando as quatro séries. Imagina ali fazendo o “a e i o u”, a outra ditado, a outra tabuada, geografia... O pior de tudo era não saber nada de português. Até os sete anos só se falava o dialeto de Vicenza. Nada praticamente ouvíamos do português, até as missas eram em latim, sobrava um longo sermão, que mostrava um outro linguajar, chamado “brasileiro”. Três dificuldades que perturbavam: português, ditado e a tabuada! Puxar as orelhas e os cabelos, tomar uma reguada nos dedos, ficar de castigo no recreio... Para fazer as necessidades, ou ir aos pés, como dizem os brasileiros, era no meio da capoeira, nos fundos da escola, autorizados um por vez. Em que pese todos estes problemas, quem queria aprendia. Para fazer a quarta série, fui, no ano de 1959, no Grupo Escolar Otávio Rocha. Lá era bem diferente. Cada série tinha uma sala e uma professora. Tinha também uma biblioteca, um laboratório, muitos mapas e diversas festas como as de São João e apresentações artísticas no pequeno Salão da Igreja. Na frente da escola havia um descampado, para brincar. Avanços, um banheiro (patente) feito de tábuas, atrás da escola, no meio do mato. O prédio, de diversos andares, escondia em baixo da sua cobertura, aquelas de quatro chuvas, um mistério. Contavam que teria falecido ali uma criança, em época que até professores moravam naquele prédio. Tive que fazer duas vezes o quarto ano e para o quinto, fui estudar nos Maristas, em Antônio Prado. E no caminho tinha uma balsa, atravessar o Rio das Antas, que medo! Imagine sair da colônia e ir morar no Bel Paese, vida de cidade.  
Ao lembrar do passado, é preciso entender e agradecer pela modernidade das instalações, com merenda escolar, o transporte escolar, computadores, internet, ginásio esportivo e os professores. Agora se pode apreender com mais facilidade, com todos estes qualificativos, mas com ou sem vontade, o tempo é que dirá.   
A minha homenagem aos devotados professores e professoras que, em que pese todas as dificuldades, se esforçavam para nos dar uma educação e ensinamentos que ainda valem para toda a vida.