Quatro ponto nove
Ontem completei quatro ponto nove.
Ontem completei quatro ponto nove. Pois é meu amigo de longa data, estamos ficando velhos. Temos os dois pés praticamente fincandos na casa dos cinquenta anos de idade.Estamos ficando velhos quando já não conseguimos deter o avanço do exército de cabelos brancos, seja com tônicos capilares, seja com loções milagrosas ou seja com promessas para o santo da cabeleira farta.
Estamos ficando velhos quando já não há mais ferro de passar capaz de desamassar a roupa do rosto.
Estamos ficando velhos quando as velas custam mais que o bolo.
Estamos ficando velhos quando a formiga da idade abre sulcos em nossa face e o espelho é nosso próprio disfarce.
Estamos ficando velhos quando nos tornamos dependentes de remédios para dormir.
Estamos ficando velhos quando começamos a nos atormentar com o joelho emperrado e a pança que dança.
Estamos ficando velhos quando damos a pingar suor nas dobrinhas do braço.
Estamos ficando velhos quando damos a nos preocupar com a taxa de leucócitos, índice de glicose e outras coisas mais.
Estamos ficando velhos quando o fator que levamos em conta é o previdenciário.
Estamos ficando velhos quando já não brincamos como o menino que se agita em nossas lembranças.
Estamos ficando velhos quando nossos filmes preferidos entram naquelas listas dos “Melhores do século” e a música da nossa juventude toca no elevador.
Estamos ficando velhos quando damos a repetir as mesmas velhas piadas e nos divertirmos com elas como se fosse a primeira vez.
Estamos ficando velhos quando começamos a acreditar em tudo, enquanto os jovens acham que sabem tudo.
Estamos ficando velhos quando recorremos ao velho chavão: “O trabalho dá prazer e o prazer dá trabalho”.
Estamos ficando velhos quando começamos a reconhecer o que perdemos: vigor físico, saúde e senso de humor. Os jovens, por sua vez, desconhecem o que lhes falta.
Estamos ficando velhos quando já não conseguimos mais dar maus exemplos e começamos a dar bons conselhos.
Estamos ficando velhos quando usamos o tradicional cumprimento de aperto de mão. Aperto de mão é coisa do passado. E como bem sabemos, o passado é coisa morta e, às vezes pode até cheirar mal.
Estamos ficando velhos quando nos pegamos dizendo baixarias atemporais: “Ah, essa eu pegava”.
Estamos ficando velhos quando começamos a maioria das falas com “No meu tempo...”. Na verdade, todo aquele que começa uma fala com “No meu tempo” já era.
Estamos ficando velhos quando usamos a palavra “gurizada” no lugar de “galera”. Falar “gurizada” é pisar na bola, dar bola fora.
Estamos ficando velhos quando, de repente, começamos a ficar doentes dos nervos: resmuguentos, impacientes e ranzinzas.
Estamos ficando velhos quando começamos a ganhar pantufas, meias de lã e caixinhas para guardar remédios de presente de aniversário.
Por fim, estamos ficando velhos quando começamos a pensar com “cabeça de velho”.