Curso de etiqueta
Ora, a idade grande vem chegando, pensei, vou aceitar o convite.
Ora, a idade grande vem chegando, pensei, vou aceitar o convite.O curso prometia fazer de mim um homem sofisticado. O homem tosco que segurava a taça pelo bojo, cortava a folha de alface com a faca e mordia o pão ao invés de parti-lo com as mãos, limpava as mãos na toalha de mesa, ficaria definitivamente para trás.
Vim da roça e nunca tive noção de boas maneiras. A única coisa que aprendi é que mais de 50% das mensagens enviadas baseiam-se na linguagem corporal, 38% no tom de voz e apenas 7% no que dizemos.
Começou o curso intensivo. Finalmente iria aprender a arte de receber bem e evitar gafes. Iria aprender a andar, sentar e comer. A mestre em etiqueta logo disse:
– Cumprimente o seu colega. Aperte firme a mão dele e sorria.
Estendi minha mão de lesma.
– Aí, seu... – encheu a boca para soltar um palavrão, mas conteve-se e disse: – Seu troglodita, quer quebrar a minha mão? É isso que quer?
Bocado depois, a grande mestre pediu para que me levantasse. Preciso dizer que nunca soube o que fazer com as mãos diante de outras pessoas. Tratei de metê-las nos bolsos.
– Caubói? – repreendeu-me a mestre.
Imediatamnte escondi-as atrás das costas. Nova repreensão:
– Coisa mais deselegante.
Tentei deixá-las cair sobre minhas partes pudendas.
– Não acha que parece um jogador de futebol em uma cobrança de falta?
Riram todos, inclusive o gato que estava sob a mesa. A mestre ensinou:
– Deixe pender os braços para mostrar que está descrontaído e à vontade.
Em seguida, a mestre pôs-me à mesa com os utensílios básicos para o serviço das refeições. Havia travessas, pratos, infinidade de talheres, copos e taças. Além desses, tinha galheteiros para óleo e vinagre, mantegueira, saleiros, talheres especiais para moluscos, descansos para talheres, tigelinha de lavanda, etc... O aparelhamento todo era composto por 10 peças. Serviço à francesa.
– Sirva-se – ordenou a mestre.
Não tive a chance sequer de usar o pequeno garfo de três dentes para destrinchar a ostra que recebi o pito:
– Segure o garfo com a mão esquerda, mas não esqueça que deve voltar a mão direita para levar o alimento à boca. Argumentei que eu era canhoto. A mestre ensinou-me que devia ter esperado a comida ser servida para inverter os talheres.
No final da refeição, com o estômago ainda vazio, tomei o cuidado de dobrar cuidadosamente o guardanapo para colocá-lo dentro do prato. Nova reprimenda.
– Errado. Deixe-o de maneira descuidada ao lado do prato. Nunca dentro dele.
No final do curso, o homem a quem lhe faltavam bons modos, pertence ao passado. Agora sei andar na postura ereta como um cabo de vassoura. Não tiro mais meleca do nariz com o mindinho. Não arroto alto. Não limpo mais as mãos na toalha de mesa. Não solto mais um punzinho sequer. Nunca mais comportei-me mal à mesa e em sociedade. Claro que, em compensação, peguei a mania de mentir um pouco de vez em quando. Mas o que aprendi de verdade é que o bom mesmo é não se preocupar com regras. O fundamental é ser educado.