Apelidos que grudam
Acho que você bem sabe que há duas ou três coisas que quase ninguém escapa na infância. A primeira delas, e quando ainda somos bebês de cola, é de tias metidas a palhaças que insistem a fazer caretas para nos fazer rir.
Acho que você bem sabe que há duas ou três coisas que quase ninguém escapa na infância. A primeira delas, e quando ainda somos bebês de cola, é de tias metidas a palhaças que insistem a fazer caretas para nos fazer rir. A segunda é a de virarmos mochilas dos nossos pais que vivem nos carregando para tudo o que é lado.Bem, a terceira delas é a de recebermos uma designação informal ou um apelido.
É óbvio que você também sabe que tem apelido com origem em características físicas: Baixinho, Quatro-olhos, Tampinha, Cascão, Bolinha, Chaminé, Carijó, Cochicho, Bocão, Topete...
Tem apelido que vem do ofício: Leiteiro, Padeiro, Roceiro, Coveiro, Carteiro.
Tem apelido que diz algo sobre a personalidade: Bombinha, Pipoca, Chiclé, Tipo-Assim...
Tem apelido que é resultado da lei do menor esforço. Tatiana vira Tati; Luana vira Lu; Rodrigo vira Rô; Renata vira Rê; Patrícia vira Pati; Juvenal vira Ju; Eduardo vira Edu; Virginia vira Vi.
Por falar em apelidos, os argentinos são prolíficos em matéria de apelidos. Os políticos Carlos Menen era ‘El Turco’, Nestor Kirchner ‘El Pinguino’ e até mesmo o grande Juan Domingos Péron tinha o seu apelido – ‘El Pocho’. Diego Armando Maradona virou ‘Dieguito’ e ‘El Pibe de Oro’.
Como não poderia deixar de ser, tem apelidos curiosos, como o do meu amigo Mosca – que nada tem a ver com o inseto nojento de asas membranosas. Ninguém sabe por que juntaram as iniciais do nome Moacir com as iniciais do sobrenome Scalin e, assim, acabou virando Mosca. Assim, Moacir Scalin não conseguiu mais espantar o apelido do seu rosto.
– É uma pena, pois um apelido desses não ajuda nada – lamentava vovó, atrás dos óculos de armação pesada, na cor preta, engarupada no nariz aquilino.
Pois é, para variar não escapei de ganhar um apelido, antes mesmo de começar a balbuciar ‘papa’ e ‘mama’. Quando fui ver, não era mais o Flávio, como registrado na Certidão de Nascimento, mas o Nini. O apelido não aponta para lugar algum. Não diz nada sobre a minha personalidade. Não cabe em mim, mas pegou e colou para valer.
– Nini, vá dar comida aos cabritos – ordenava mamãe.
– Nini, quanto é 7 x 9? – perguntava a professora.
– Quebre a cara do Nini – gritava meu colega fortão, comedor de polenta e batata doce.
– Nini, caia fora daqui – dizia uma colega por quem eu estava caidinho.
No meu Paredes, todos me conheciam por Nini. Preciso confessar que eu mesmo já assinei documentos com a alcunha Nini. Poucos eram os que conheciam o meu nome de batismo. Quer dizer, meu nome oficial praticamente desapareceu.
É evidente que se tivesse recebido o apelido de ‘Pelé’, ‘Zico’, ‘Cazuza’, ‘Tremendão’, ‘Chacrinha’ ou ‘Eminen’ em vez de Nini, possivelmente minha sorte teria sido melhor.
Podia, porém, ter sido pior. Podia ter sido ‘Êpa’ ou um desses apelidos idiotas que não encontramos maneira de nos livrar pelo resto da vida, como Alicate, Pulga, Retardado, Pudim, Vai-Saber, Gafanhoto, Manteiga Derretida, Melado, Linguicinha ou um apelido de cachorro, como Boby.
Qualquer um desses apelidos teria me causado mais inconvenientes, por certo.