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Licitação dos táxis foi ‘esvaziada’

Abertura dos envelopes para a concessão do serviço em Flores da Cunha teve apenas um inscrito. Ministério Público acompanha o caso

O dia em que poderia ser resolvido o impasse das concessões de táxis em Flores da Cunha na verdade deixou o caso ainda mais longe de um desfecho. A prefeitura marcou para a manhã de ontem, dia 29, a abertura dos envelopes participantes na licitação para prestação do serviço no município, porém, apenas um interessado entregou a documentação. O ocorrido pode ser resultado do adendo incluído pela prefeitura à proposta original, que dá um prazo de carência de cinco anos aos atuais taxistas até que os vencedores assumam o serviço. Caso uma nova licitação não seja encaminhada até sábado, dia 31 – data conforme prazo assinado no Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) –, na próxima semana o Ministério Público (MP) deve ajuizar uma ação contra a prefeitura para averiguar a situação.

Em janeiro o MP e a prefeitura firmaram o TAC com o objetivo de regularizar as concessões de táxis no município. Desde setembro de 2013 o caso era investigado. Na época o MP condenou o fato de o serviço ter sido repassado a terceiros sem a realização de um trâmite licitatório, processo obrigatório quando se trata de serviços públicos. A medida de abrir um processo de licitação, porém, não agradou aos permissionários do município, que pediram pela suspensão da licitação. A prefeitura respeitou o TAC abrindo a licitação, mas incluiu um adendo que não estava previsto no termo, o de dar prazo de carência de cinco anos para que os vencedores da licitação pudessem assumir.

De acordo com o procurador da prefeitura, Paulo Roberto Mascarello Graff, deverá ser aberta uma nova licitação até que sejam preenchidas todas as vagas disponibilizadas. “O prefeito está em viagem e vamos nos reunir ainda esta semana para definirmos os próximos passos. Em tese se realiza uma nova licitação, nos mesmos moldes dessa, para ir preenchendo as vagas, assim como ocorre em outras licitações quando não aparecem pessoas interessadas. Se repete o processo licitatório até que ocorra esse preenchimento das vagas”, explica Graff.

Quanto ao adendo que dá carência de 60 meses, o jurídico da prefeitura ressalta que estava na licitação e por isso é válida. “O TAC não descrimina, nem tem competência para isso, as condições que vai ser feita a licitação. O termo previa a realização da licitação e ela foi feita, o período de cinco anos está na licitação, portanto a situação está regular”, afirma Graff.

Para o promotor de Justiça Stéfano Lobato Kaltbach, o resultado da licitação já era previsto. “Foi dado o prazo de maneira a esvaziar a licitação. Ninguém vai comprar um produto agora para recebê-lo somente daqui a 60 meses. Foi usado de um artifício para supostamente cumprir o TAC, mas esvaziar a licitação”, sustenta Kaltbach. De agora em diante, se não surgirem licitantes, o promotor deve entrar com a ação de execução do TAC, mas depois do sábado, dia 31. “Aguardo para ver se o prefeito vai revogar o prazo e vai esperar os 60 meses e aí se começa o embate judicial. Esse prazo de 60 meses é uma maneira de fraudar o termo de ajustamento. E se isso de fato aconteceu, vou tomar as medidas judiciais cabíveis”, acrescenta o promotor. “O adendo foi feito de modo a garantir e privilegiar quem está operando e frustrar o objetivo da licitação. Aliás, se teve apenas um inscrito, eu pergunto: por que os atuais não se inscreveram?”, questiona.

O que dizem os taxistas
O representante dos taxistas de Flores da Cunha, Fernando Bebber, que estava presente na abertura dos envelopes, é sucinto. “A licitação como o promotor queria saiu, se não houve mais concorrentes, daí já não é problema nosso. Como dizia o edital, só poderia haver uma concessão por taxista, nós já temos a nossa, não tínhamos como entrar no edital da licitação”, argumenta Bebber, embora seja claro que a concessão antiga é substituída pela nova em processos de licitação. “As pessoas não se interessaram. Havia a exigência do depósito de R$ 5 mil, o prazo da concessão é só por 10 anos e se assumiria somente daqui a cinco anos. Faltou interesse”, acredita o taxista.

Foto/Fabiano Provin


Promotor apresentou o caso na Câmara

Segundo o promotor Stéfano Lobato Kaltbach, o objetivo do Ministério Público (MP) é regularizar uma situação ilegal que teve repercussão “inimaginável”. “O Ministério Público não age de um dia para o outro. Essa ideia é falsa. Há pelo menos dois anos o assunto é tratado, segundo as notícias e segundo o inquérito civil instaurado”, argumentou ele da tribuna da Câmara de Vereadores, onde esteve na noite de terça, dia 27.

Em maio de 2012 o MP recebeu a denúncia de um cidadão sobre um táxi concedido que teria sido vendido no Travessão Alfredo Chaves. A partir daí se iniciou a investigação. “No mesmo mês o município foi informado. Em 20 de julho veio a resposta: uma concessão não pode ser vendida; que o Departamento de Trânsito tinha uma lista de espera de interessados; e que uma licitação deveria ser feita”, disse o promotor. A busca por informações prosseguiu e foram constatados problemas e irregularidades nas concessões. “O artigo 175 da Constituição é claro: toda concessão pública deve ser feita por licitação”, citou Kaltbach.

Sobre a concessão denunciada, o promotor frisou que o táxi é dirigido por uma terceira pessoa – o concedente teve problema de saúde e uma segunda pessoa seria a responsável, mas quem dirige é um terceiro. “Juntei ao inquérito decisões de vários tribunais do país com a mesma decisão. A partir daí o Ministério Público iniciou uma negociação para regularizar o serviço público. O que é ilegal não gera direito adquirido, por isso é preciso regularizar”, pontuou o promotor.

Por meio de email, telefonemas e reuniões as tratativas com a prefeitura chegaram a um consenso em 23 de dezembro de 2013. Sete dias depois um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) foi firmado entre MP e município, com prazo para a licitação e revogação das concessões ilegais. “Não sou contra nenhum taxista. Todos podem participar da licitação, desde que se enquadrem nos requisitos. O debate não é político, é jurídico. Em Flores da Cunha não há legislação que regulamente os táxis. A única lei existente é de 1974”, explicou Kaltbach.

O Ministério Público recebeu, por parte do Sindicato dos Taxistas, um pedido de reconsideração sobre o TAC, o qual foi negado. Já a ação judicial encaminhada pelo mesmo Sindicato foi indeferida sob o argumento de que não haveria motivo para a suspensão do Termo de Ajustamento. “Após isso sou surpreendido por uma jornalista que me questiona sobre um adendo feito à licitação. Vi no site da prefeitura que realmente uma emenda fora feita concedendo 60 meses, ou cinco anos, para que os vencedores da licitação assumam as vagas. O MP é contra isso”, explanou o promotor, alegando que se trataria de fraude.

Os vereadores Gilberto Malacarne e Luiz Antônio Pereira dos Santos (PDT); Moacir Ascari e Valdir Franceschet (PMDB); e Valdomiro Viasiminski (PRB) fizeram questionamentos a Kaltbach. Entre as respostas, o promotor ressaltou que é a favor do serviço, respeitada a legalidade; e que é preciso se adequar às novas normas. “O município de Flores da Cunha concordou com o prazo. Foi o município quem sugeriu o prazo da licitação. Vocês sabem quantas vezes a prefeitura procurou o Ministério Público para incluir o adendo? Nunca. O meu entendimento é que o município de Flores da Cunha tentou fraudar o processo”, esclareceu o promotor.


Abertura dos envelopes, às 9h de quinta-feira, registrou apenas um interessado, apesar da ‘plateia’ ao fundo. - Bianca Giotti/Prefeitura FC/Divulgação
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